A campanha pela inclusão de feminicídio no Código Penal brasileiro vem ganhando cada vez mais adeptos entre e instituições e organizações sociais. O Ministério Público do Ceará (MPCE), por exemplo, aderiu, recentemente, ao movimento, batizado de “Senado, inclua a lei do feminicídio no Código Penal”, com a finalidade e sensibilizar e chamar a atenção do Congresso Nacional para a necessidade de aprovação do projeto de lei. Este torna o crime de assassinato contra mulheres homicídio qualificado, tendo assim a pena aumentada.
As adesões à campanha levam em consideração os altos índices de violência contra as mulheres praticados em todo o país, portanto, havendo a necessidade de se tomar uma providência mais rigorosa para inibir estes atos, como dar visibilidade ao fenômeno e impedir que a Justiça também silencie, passando ao largo da gravidade desse tipo de violência.
Em entrevista à Adital, a procuradora do Ministério Público do Estado do Ceará, Elsuérdia Andrade, que é coordenadora do Núcleo de Gênero Pró-Mulher do MPCE, afirma que inserido no código penal o feminicídio passará a ser julgado de forma diferenciada, sendo considerado crime hediondo e resultando em uma pena mais severa.
A Lei Maria da Penha, aprovada em 2006, trouxe uma grande diminuição no número de casos, porém as estatísticas voltaram a apresentar números alarmantes, o que, para a procuradora, reflete a falta de políticas públicas mais eficazes. “A Lei Maria da Penha é maravilhosa, mas não tem os instrumentos necessários para sua eficácia” afirma e continua: “o caminho é a criação de políticas públicas para as mulheres, no intuito de que elas tenham assistência social, psicológica, jurídica, e que garantam a elas seus direitos e apoio no enfrentamento do caso”.
A campanha “Senado, inclua a lei do feminicídio no Código Penal” está centrada num abaixo assinado online, que será enviado ao presidente da Casa Legislativa, Renan Calheiros, pedindo a aprovação do projeto de Lei nº 292/2013. Caso seja aprovado, serão qualificados os homicídios de mulheres em função do gênero, como nos casos de violência doméstica e familiar, violência sexual, mutilação ou desfiguração, além de crimes com emprego de tortura e/ou meios cruéis. A pena para esses tipos de crime, então, deverá variar de 12 a 30 anos de prisão, maior que a de homicídio simples, de seis a 12 anos.
Sílvia Chakian de Toledo, promotora e criadora do grupo de enfrentamento à violência doméstica do Ministério Público de São Paulo, afirmou durante o lançamento da campanha, em agosto último, que não é mais aceitável ver sentenças carregadas de expressões morais, argumentos preconceituosos, que tentam colocar na vítima a culpa pelos crimes cometidos contra ela.
Ainda é frequente a tentativa de colocar nas mulheres vitimizadas a culpa por sua própria morte, por meio de argumentos de legítima defesa da honra, em decorrência do estado de forte emoção após provocação da vítima. Ela defende que o crime contra a mulher no ambiente doméstico tem que ser qualificado e, portanto, hediondo.
A campanha conta com o apoio de organizações sociais como o Instituto Patrícia Galvão, o Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, o Portal Compromisso e Atitude, a Defensoria Pública e órgãos do judiciário.
A promotora Eusuérdia Andrade assinala ainda que a violência contra a mulher ainda é atribuída a questões culturais, pois muitos homens tratam a mulher como um objeto e assim dispõem do direito de tratá-la da maneira que melhor lhe convir.
Ela lembra que um grande número dos casos de violência é praticado dentro do ambiente familiar e na presença dos filhos, tornando a situação bem mais delicada, pois essas crianças serão pelo resto da vida marcadas e, dificilmente, o acompanhamento psicológico irá apagar de sua memória, de maneira definitiva, a cena de violência, pois não se trata somente de um crime de assassinato, mas o assassinato da própria mãe por parte do pai.
Números
Levantamento realizado pelo Instituto Avante Brasil aponta que, em 2012, o Datasus (órgão do Ministério da Saúde), que registra as estatísticas vitais da população, registrou 4.719 mortes de mulheres decorrentes de agressão, ou seja, 4,8 mortes para cada 100 mil mulheres, em todo o Brasil. Em 2002, o número de mortes registradas foi de 3.867 mortes, o que significou uma variação de 22% no período.
Considerando apenas os índices de crescimento dessa barbárie, torna-se possível prever que, até 2050, caso nada se altere em termos de prevenção e punição, serão de 330 mil mortes entre a população feminina. A estimativa para a projeção de mortes, realizada pelo Instituto Avante Brasil, leva em consideração a média do número de mortes dos últimos anos. Entre 2002 e 2012 houve um crescimento anual médio de 1,93%, assim, se o número de óbitos continuar crescendo na mesma proporção, em 2050, serão registradas 9.765 mortes femininas, totalizando 336.274 mortes entre 1980 e 2050.