Caravana dos Defensores e Defensoras dos Direitos Humanos de Porto Alegre, no Cimi
Diante de recentes episódios envolvendo a criminalização das lutas sociais no Rio Grande do Sul, acompanhada de preocupantes violações aos direitos humanos, com o destaque indigenista para as prisões e agressões sofridas pelo povo Kaingang em pleno direito de reivindicação de seus territórios tradicionais usurpados, movimentos sociais e organizações circularam um manifesto, que segue na íntegra:
EM DEFESA DA GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS E PELO FIM DA CRIMINALIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS E LUTAS SOCIAIS DO RS
As organizações sociais, os movimentos populares, as lideranças e sujeitos de direitos ligados a diferentes populações, comunidades e segmentos de luta, reunidos na Caravana dos Defensores e Defensoras dos Direitos Humanos de Porto Alegre, realizada no dia 06 de setembro de 2014, na sede do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (SIMPA), vem a público manifestar a defesa incondicional dos direitos humanos das populações e segmentos sociais que vivem em situação de marginalização, violência e exclusão, bem como manifestar sua indignação com relação à criminalização que os movimentos e organizações sociais populares e suas lideranças vêm sofrendo nas diferentes frentes de luta no Estado do RS.
Ao tratar da realidade vivida pelas populações, comunidades e sujeitos de direitos; da atuação do Estado no que se refere aos instrumentos de defesa/proteção e das políticas de promoção dos direitos humanos; da capacidade de organização e mobilização das lutas e movimentos sociais, bem como do empoderamento das populações e comunidades específicas e suas lideranças, as manifestações apresentadas e colhidas ao longo deste encontro, mostram que direitos humanos e direitos cidadãos (constitucionais) básicos parecem inalcançáveis para uma parcela significativa da população.
Neste sentido, manifestamos e denunciamos:
– o interesse do capital imobiliário incidido sobre os territórios, promovendo a remoção e exclusão das populações e dos povos de direito dos seus territórios;
– a omissão e a conivência do Estado em relação à violação dos direitos das populações e dos povos nos territórios tradicionais;
-o genocídio dos de Baixo, do povo negro e a segregação racial, geracional e social das populações e povos em nível mundial (refletido também no âmbito local);
– a violência policial e estatal contra populações discriminadas, marginalizadas e criminalizadas;
– a ineficácia das políticas públicas efetivas na garantia dos direitos humanos básicos das populações, povos e segmentos marginalizados: comunidade LGBT, populações de rua, comunidades quilombolas e povos indígenas, etc.;
– a criminalização das lutas e de ativistas dos movimentos sociais, como forma de desmobilizar a sociedade, as populações e os povos em defesa de seus direitos;
– a responsabilização do governo do estado, na pessoa do secretário estadual de habitação, Marcel Frison e aliados, pela desarticulação de comunidades e territórios ocupados, além de atentados contra lideranças e indivíduos que resistem ao processo de higienização provocado pela especulação imobiliária;
– o conluio entre poderes públicos para garantir o interesse de empresas e a intensificação dos processos de remoção, sendo que só no último mês ocorreram duas remoções de comunidades (Avipal e Dois Irmãos), ambas comunidades atingidas e desconstruídas pelos mesmos atores políticos;
– a tentativa de cooptação de movimentos sociais pelo Estado, visando garantir os interesses econômicos de empreiteiras, imobiliárias e demais corporações industriais e comerciais;
– a parceria entre o governo do estado e universidades gaúchas com a Elbit (empresa Israelense que trabalha com sistemas de segurança e armamentos), que possui relação direta com o genocídio do povo palestino;
Ao mesmo tempo, defendemos e exigimos:
– a defesa dos direitos e o reconhecimento da identidade das populações, povos e comunidades nos seus territórios;
– o compromisso dos governos com a legalização, titulação e demarcação dos territórios dos povos indígenas, comunidades quilombolas e comunidades urbanas;
– a retomada dos territórios como direitos reconhecidos e conquistados pelos povos e comunidades tradicionais (indígenas e quilombolas), bem como das populações e comunidades urbanas;
– a mobilização e unificação das organizações sociais em torno de agendas comuns em defesa dos direitos dos povos, populações e segmentos marginalizados e criminalizados da sociedade;
– a manutenção da articulação da resistência e das iniciativas coletivas em defesa dos direitos humanos e contra toda forma de violência e criminalização;
– a elaboração de uma carta de moção ao governador do estado exigindo o afastamento imediato do secretário de habitação, Marcel Frison, e assumindo o compromisso de colocar no cargo pessoa íntegra e com compromisso aos direitos humanos das populações atingidas;
– o arquivamento imediato dos processos criminais com cunho político, dos inquéritos judiciais e das investigações ideológicas praticadas contra ativistas de movimentos sociais;
– o apoio à luta nacional que visa a desmilitarização das polícias;
– a formação de grupos de estudos temáticos para compreender o contexto da luta, resultando em oficinas, teatro e atividades diversificadas nas comunidades atingidas com o propósito de fortalecer a luta pelos territórios;
– a efetivação de um Estado laico de fato, onde os cidadãos tenham o direito à livre expressão, opção e credo, sem qualquer tipo de discriminação e perseguição, com espaços de participação efetivos a este debate;
– o investimento de recursos para o sistema habitacional e a urbanização dos territórios para garantir os direitos mínimos de dignidade das populações e povos atingidos;
– a extinção de iniciativas que visem retrocessos com relação aos direitos territoriais dos povos, comunidades e populações, como é o caso da PEC 215 e outras propostas inconstitucionais semelhantes;
– a ruptura imediata dos contratos entre o governo do estado do Rio Grande do Sul e as universidades gaúchas UFRGS, PUCRS, UFSM e UNISINOS com a empresa israelense Elbit, representada no país através da subsidiária AEL Sistemas;
Por fim, manifestamos que não abandonaremos a luta e não vamos recuar nenhum passo na defesa e garantia dos direitos humanos dos povos, comunidades e populações!
Subscrevem este manifesto,
Ação de Rua Arquipélago; Amencar; Bacupari; Bloco de Luta pelo Transporte 100% Público; Boca de Rua; Caminho das Águas/ Ilhéus Ecológicas; Cáritas/RS; Centro Franciscano Pedro Chaves Barcellos; CIMI Sul (Conselho Indigenista Missionário); Comitê Popular Contra o Estado de Exceção; Comitê Popular da Copa (ANCOP); Comunidade Indígena Morro do Osso (Kaingang); CRDH/ Avesol; Frente Quilombola/RS; Gapa-RS; Ilhéus Ecológicas; IDHESCA; Manifesto POA; Mov. LGBT; Movimento Autônomo Utopia e Luta; Movimento Nacional da População de Rua; Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH); Movimento Negro Unificado (MNU); MPG, Professores de Goiás; Ocupação Progresso; Ocupação Sete de Setembro; PPDDH – RS; Parrhesia Erga Omnes; Quilombo dos Machado; Rede Macumba de Comunicação; Resistência Urbana; SIMPA; Stop the Wall; Teatro In-Visíveis; Vila Dique.
CARAVANA DOS DEFENSORES E DEFENSORAS DE DIREITOS HUMANOS POA/RS.
Porto Alegre, 06 setembro de 2014.