Para procurador, terreiros são considerados locais de culto para fins legais, devendo receber, portanto, a mesma isenção que igrejas já recebem
Por Juan Mattheus, MPF/AM
O Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) recomendou ao município de Manaus que reconheça o direito à imunidade do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) aos imóveis utilizados como locais de celebração e culto religiosos pelas comunidades de religião de matriz africana, deixando de cobrar qualquer valor referente ao tributo municipal dessas propriedades.
O documento requer a realização, por parte da Prefeitura de Manaus, de cadastramento participativo baseado no autorreconhecimento dos povos de terreiro para identificação dos imóveis a serem beneficiados pela medida no prazo de 120 dias. Conforme o MPF, qualquer definição prévia por parte do município a respeito dessa identidade deve ser vedada. A prefeitura deverá divulgar amplamente o teor da recomendação a seus órgãos.
Para o MPF/AM, as “comunidades de terreiro”, ou “povo de santo”, são reconhecidas como comunidades tradicionais e, inclusive, possuem representação na composição da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, do Ministério do Desenvolvimento Social. “Os terreiros são os espaços sagrados onde são realizados os cultos e cerimônias das religiões de matriz africana, tais como candomblé, umbanda, batuque, quimbanda, xambá, dentre outras”, ressalta trecho da recomendação.
De acordo com o procurador da República Julio José Araujo Junior, autor da medida, os terreiros são considerados locais de culto para fins legais, estando as pessoas físicas ou jurídicas que os mantém sujeitas à imunidade de impostos relacionados à sua atividade-fim, dentre os quais o IPTU. “A imunidade de pagamento de IPTU aos templos de qualquer culto constitui direito constitucional há muito garantido às igrejas, e que já vem sendo efetivado aos terreiros em diversas cidades do Brasil”, completou o procurador.
Isenção prevista em lei
O MPF/AM cita na recomendação que o artigo 150 da Constituição Federal e o artigo 9º do Código Tributário Nacional proíbem a cobrança, pelo poder público, de impostos sobre templos de qualquer culto. Em pelo menos duas situações distintas, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que a imunidade prevista na Constituição deve considerar como cultos distintas expressões de crença espiritual.
O procurador da República que assina a recomendação acrescentou ainda que é urgente a necessidade de o Estado reconhecer a identidade do “povo de santo”, por meio da efetivação de direitos constitucionalmente assegurados a essas comunidades. “Tal benefício contempla os valores de uma sociedade plural e sem preconceitos, valores esses que direcionam os fundamentos da própria Constituição Federal, e assentam a concepção de um Estado brasileiro laico”, disse Julio Araujo.