“O senhor pode chamar a Polícia Federal aqui? Estão atirando em nós.” Quase um ano e meio depois da histeria em torno da carta que anunciou a morte coletiva, a vida pouco mudou para as famílias indígenas do Pyelito Kue
Bruno Morais, Le Monde Diplomatique Brasil
Era a tarde do domingo de carnaval e do outro lado da linha estava Lide Solano Lopes, cacique do acampamento Pyelito Kue. No dia 12 de fevereiro, cerca de 250 indígenas Kaiowá e Guarani haviam retomado a Fazenda Cambará, propriedade de Osmar Bonamigo, e levantaram barracos ao redor da casa que servia sede. Ao fundo da ligação, se escutava o tiroteio.
Entre a cerca e a estrada
Para se chegar ao Pyelito Kue vindo do município de Amambai é preciso entrar a esquerda em um acesso de terra na rodovia MS-386, logo antes da cidade de Iguatemi. Vinte quilômetros adiante se avista um amontoado de barracos de lona e estacas de madeira, espremidos entre uma cerca e uma estrada vicinal – ao final do ano de 2012, Polícia Federal e Funai acompanharam os funcionários da fazenda que assentaram os postes e passaram os arames, cumprindo a ordem judicial que reservava um hectare de terra para permanência dos indígenas enquanto se concluía o processo de demarcação. Até a retomada da Fazenda Cambará, era esta a sina das famílias do Pyelito: sempre entre a cerca e a estrada. (mais…)