Para Kika de Bessen

Mahal, entre Stéphanie e Kika

Exatamente agora de manhã, em Cidade Tiradentes, São Paulo,  numa praça no final da rua Cereja do Rio Grande, está havendo uma cerimônia em homenagem a um jovem negro chamado Mahal Farouq. É uma Cerimônia de Graça aos 21 Anos de Vida, como diz o convite postado por sua Mãe no facebook. À noite, às 19 horas, na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, no Largo do Paissandu, Centro de São Paulo, o ritual será outro: o do sétimo dia do “passamento” de Mahal, na mesma praça da cerimônia matutina.

Não conheci Mahal Farouk, mas conheço a pessoa que postou o convite para as duas cerimônias. A mesma pessoa que, na minha pesquisa no face depois de ter recebido de alguém o convite inicial, postou, no dia 15, uma mensagem interrompida…

Kika 1

Kika Silva, Donè Kika de Bessen, através de quem ouvi falar pela primeira vez de Cidade Tiradentes, nas discussões iniciais do GT Racismo Ambiental; lutadora do movimento de mulheres, que representava no comitê brasileiro do Fórum Social Mundial quando ele de fato fazia diferença; liderança do movimento negro e das religiões de matriz africana; brigona e guerreira sempre…

Não sei como Mahal foi assassinado; não há detalhes, e na verdade, eles seriam menos relevantes que a morte em si. Sei, no entanto, que ele ia ser pai. Sei disso porque exatamente no dia 10 de dezembro ele escreveu no facebook: “FILHO(A) PAPAI JÁ TE AMA MAIS QUE TUDO !”. E Kika respondeu: “Se for menina será a Princesa do Mahal e se for menino será o Príncipe SajaRam, tb do Mahal e da Vó Kika Silva”.

No dia 12, Mahal postou duas fotos beijando a mulher, Stephanie, encabeçadas por uma frase curta: “TUDO VAI DAR CERTO EU ACREDITO !”. E tanto ela quanto Kika responderam, reafirmando ambas seu amor por ele e a confiança de que, com ele, tudo daria certo. Neste momento, para ela, assim como para o filho ou filha de Mahal e para sua companheira, a certeza deve ser de que as coisas não deram certo afinal. E terminaram menos de 24h depois da mensagem ter sido escrita.

Não vou fazer um discurso sobre o genocídio da juventude negra; a violência do tráfico e/ou das milícias; ou a imperiosa desmilitarização da polícia. Como Amarildo, Mahal tinha uma família que o amava e que dele esperava ainda muitas vitórias e alegrias. Essas mortes têm que acabar, e não podem continuar a ser tratadas pelas chamadas autoridades como meros números nas estatísticas, nessa nossa ‘civilização’ que cada vez mais o capital desumaniza.

Faz tempo não encontro Kika, mas consigo entender sua dor, na qualidade de mãe. Meu carinho e minha solidariedade para ela e sua nova família.

Tania Pacheco.

Comments (2)

  1. Taninha estou aqui, chocada… e tbém registro, com tristeza, faz tempo q nao vejo Kika. Vou busca-la no face.

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