O governo “sabe” conversar com movimentos que estão na esfera produtivista-consumista, na esfera do formal, subordinada ao modelo fordista desenvolvimentista. O governo dialoga com o movimento “branco”, “disciplinado” às regras do jogo por ele imposto, porém, não sabe dialogar com os movimentos “étnicos”, com os movimentos que estão fora da lógica formal ou que não aceitam e resistem subordinar-se à agenda fordista desenvolvimentista
Cesar Sanson*
Nesses dias temos acompanhando a tensão envolvendo o governo e o movimento indígena. Tensão que já vem de longe e se agravou no “abril indígena”. A dificuldade em conversar com o movimento indígena revela que o governo sabe dialogar e conversar com seus iguais no movimento social. Foi o que vimos no 1º de maio. Apesar das tensões, o governo conversou com as centrais e ajustou os ponteiros para uma mesa de negociação. O mesmo, porém, não acontece com o movimento indígena.
O governo “sabe” conversar com movimentos que estão na esfera produtivista-consumista, na esfera do formal, subordinada ao modelo fordista desenvolvimentista. O governo dialoga com o movimento “branco”, “disciplinado” às regras do jogo por ele imposto, porém, não sabe dialogar com os movimentos “étnicos”, com os movimentos que estão fora da lógica formal ou que não aceitam e resistem subordinar-se à agenda fordista desenvolvimentista.
A recusa de diálogo é porque o governo não tem nada a oferecer a não ser a subordinação ao seu projeto. A agenda do governo com os movimentos sociais circunscreve-se à sua agenda e ao seu modelo.
O modelo econômico brasileiro em curso é altamente dependente da exploração de matérias-primas, em especial de commodities agrícolas e minerais. Nessa perspectiva e para viabilizar o modelo, o Estado brasileiro investe pesado em obras de infraestrutura na área de transporte e geração de energia – rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos, usinas hidrelétricas, linhas de transmissão, dentre outras. Aqui, o modelo necessita do total controle do território e na medida em que está ocupado por indígenas ou outros povos tradicionais – quilombolas, pescadores artesanais, ribeirinhas – os mesmos tornam-se um empecilho.
Logo, o diálogo com os povos tradicionais se torna anacrônico, porque o dialogo proposto pelo governo é um monólogo, ou seja, exige a subordinação ao modelo.
*Professor de Sociologia na UFRN.
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Enviada por Ruben Siqueira para Combate Racismo Ambiental.