IHU – “Estamos acompanhando a delegação indígena de Tocantins e Goiás, que estão com uma vasta agenda contra os decretos de morte e iniciativas de redução dos direitos indígenas, advindas dos três poderes”, escreve Egon Heck, CIMI-MS, ao enviar o artigo que publicamos a seguir.
“Então diga para ele vir aqui. Queremos olhar no olho dele e dizer pra ele rasgar essa portaria…’ bradou Maria das Flores Krahô inquirindo o vice de Luiz Inácio Adams, Rafael, apontando com o dedo e gesticulando com veemência: “Foi o senhor que assinou esse papel? Foi o senhor que escreveu isso? Não foi. Então nós queremos falar com ele que fez, o Adams”. Inquirições e pedidos de revogação (acabar, rasgar, terminar…) forram feitos por mais de uma dezena de indígenas dos povos Xerente, Kraho, Apinajé, Karajá de Sambioá, Avá Canoeiro, Tapuia, Kraho/Kanela, Krikati e Xavante que vieram ao prédio da Advocacia Geral da União-AGU com o único objetivo de dizer ao ministro Adams que revogue a portaria 303, por ele assinada e publicada dia 17 de julho deste ano. Ao deixarem o predio, às 19,30 horas estavam, em frente ao mesmo, três microônibus de militares e várias viaturas.
Portas trancadas
Ao chegar ao prédio da AGU a delegação de indígenas dos estados de Tocantins e Goiás, às 14,30 horas encontraram as portas fechadas. Em vão, tentaram com que elas fossem abertas para que eles pudessem se encontrar o ministro da AGU. Movidos pela decisão de falar com quem assinou a portaria, vieram preparados para passar aí a noite se preciso fosse.
Com o passar do tempo foi se aglomerando gente em frente à portaria. Não tardaram a chegar policiais. Os indígenas conseguiram impedir o fechamento total de uma das portas, o que começou a gerar temor nos funcionários do prédio que só acalmou quando chegaram negociadores da Funai e da Secretaria especial da presidência da República e o vice presidente da AGU. Todos se dirigiram ao refeitório, onde se iniciou uma reunião de mais de duas horas. A maioria dos indígenas ficaram em pé, indignados exigindo a presença do Ministro da AGU no local para ouvi-los e receber o documento.
Negociação e protesto
Nas falas duras, não faltaram as gesticulações, o dedo em riste, a batida forte das bordunas sobre a mesa, e o rasgar da portaria em frente aos representantes do governo. O Avá Canoeiro Davi, enquanto rasgava a portaria, pedia para que dissessem ao Adams que o seu povo está aguardando a demarcação de suas terras. Diego Avá Canoeiro complementou enviando um recado a Katia Abreu de que a portaria seria revogada.
As mulheres foram as que fizeram as falas mais veementes. “Chame o Adams. Vamos ficar aqui até que ele venha. Nem que precisa ficar a noite toda aqui. Trouxemos nossa boroca para dormir aqui. E vocês vão ficar aqui também”.
Quando os guerreiros ameaçaram fechar a porta, rapidamente seguranças se postaram ao lado das mesmas.
As lideranças pediram que ligasse ao ministro pedindo que ele viesse até ali, ao menos por uns cinco minutos para receber o documento e eles poderem olhar no olho dele e falar seus sentimentos contra a “portaria da morte dos povos indígenas”.
Após muitos desabafos e unanime pedido de revogação da portaria e diante da relutância do ministro da AGU de vir ao local, dizendo estar em reunião com a presidente Dilma, as lideranças concordaram em marcar um dia e horário para essa conversa. Ficando definido um encontro no Ministério da Justiça ou no Palácio do Planalto.
Logo apos a mobilização na AGU a delegação indígena se dirigiu para o Supremo Tribunal Federal, onde o ministro Ayres Brito estava assinando a revogação da ação de paralisação da hidrelétrica de Belo Monte. A ironia e cinismo da burocracia ficou manifestada em diversas afirmações, dentre elas a de que não haveria espaço para receber toda a delegação (55 pessoas). Ao que os índios responderam: “Não tem problema, nois fica de pé mesmo. Nosso costume na aldeia é reunir toda a comunidade”.
Apesar da palavra dos negociadores do governo, várias lideranças manifestaram sua desconfiança: “Será que Adams virá?”
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