“Guerreiros da Paz: povos indígenas do MS tiveram mais uma semana intensa de mobilizações na luta por seus direitos”, por Egon Heck

Os povos indígenas do Mato Grosso do Sul tiveram mais uma semana intensa de mobilizações na luta por seus direitos, especialmente seus territórios, condição básica para a verdadeira paz no Mato Grosso do Sul. Os fazendeiros alardearam na imprensa regional a declaração de guerra contra os Kaiowá Guarani, que estão retornando às suas terras tradicionais. Descrentes de qualquer avanço na garantia de suas terras, por parte do Governo Federal, resta-lhes a fidelidade a seus lideres religiosos (Nhanderu) que decidem o que fazer.

Participaram do 2º Congresso Camponês “Encontro Nacional Unitário dos trabalhadores e Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas”.

Diferentemente do que ocorreu há 51 anos, quando se realizou o primeiro Congresso Camponês, em Belo Horizonte, agora os povos indígenas estavam ali presentes, articulados, dando seu recado e sua efetiva contribuição para construir uma unidade das populações que vivem no campo. Naquela ocasião a população indígena era estimada em menos de 100 mil pessoas, destinadas ao desaparecimento. Conforme os últimos dados do IBGE, hoje são quase um milhão, falando 270 línguas e constituídos em 305 povos. Mas não apenas tiveram um grande aumento demográfico, como se constituíram em importantes atores políticos e sociais, protagonistas de importantes lutas no campo.

Em Brasília, além de participar dos debates e mobilizações de milhares de camponeses, quilombolas e populações tradicionais, estiveram com dezenas de representantes de organismos do Estado brasileiro. A ministra da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, ouviu a denúncia das violências e ameaças que pesam sobre inúmeras comunidades e lideranças indígenas na região. A declaração pública de guerra contra essas populações chamou a atenção da ministra, que se comprometeu empenhar-se na investigação dos crimes praticados, bem como buscar segurança para as comunidades e lideranças ameaçadas, particularmente no sul do cone sul, na fronteira com o Paraguai. Além disso, prometeu seu empenho para agilizar a demarcação e garantia das terras indígenas no estado, razão de tanta violência e conflito. E sinalizou com a sua ida à região para melhor sentir essa realidade que desafia e envergonha o país. Enquanto estavam com a ministra, informações da área denunciavam mais um ataque à comunidade, na qual havia sido destruídos barracos dos indígenas da retomada de Arroio Korá.

Protocolaram documentos no Supremo Tribunal Federal, solicitando urgência no julgamento dos vários processos envolvendo as terras indígenas, como Nhanderu Marangatu, Arroio Korá, que já forram homologadas pelo presidente Lula e que estão liminarmente suspensos.

 

Na AGU: racismo explícito

A delegação indígena do Mato Grosso do Sul também foi registrar seu protesto contra a portaria 303. Quiseram entregar ao presidente do órgão, Luis Inácio Adam, documento pedindo a imediata revogação da portaria, unindo-se ao clamor dos demais povos indígenas do país, que unissonamente vem reiterando esse pedido. Foram informados de que ele não se encontrava no trabalho e não tinha previsão de retornar ao prédio (verdade ou blefe?).  Lindomar Terena entregou o documento ao assessor deixando claro que assim como já passaram ali inúmeras delegações com o mesmo pedido, isso continuaria até que fosse assinada a revogação dessa portaria.

Enquanto os indígenas aguardavam no saguão do prédio, uma senhora, bem vestida, ao sair da porta e se deparar com os indígenas, mostrou o quanto esse país ainda é racista, ao declarar: “Aqui tem mais índio do que gente”. Alguns indígenas imediatamente disseram que ela tivesse cuidado com o que fala. Ela apenas apressou o passo em direção à rua. Esse fato foi relatado ao representante da AGU.

 

No Palácio do Planalto “pacificar”

No quarto andar do Palácio do Planalto mais de uma dezena de representantes de órgãos e instituições ligados fundamentalmente aos direitos humanos e segurança, haviam sido convocados pela Secretaria Especial da Presidência da República, para discutir as medidas cabíveis diante das últimas violências no Mato Grosso do Sul, com o desaparecimento do indígena Kaiowá Guarani, Eduardo Lopes e a morte de uma criança, em conseqüência do ataque à retomada no Arroio Korá, no município de Paranhos.

Durante quase duas horas foram feitos os relatos dos acontecimentos pelas lideranças indígenas e solicitadas providências urgentes, especialmente por parte dos órgãos de segurança, mormente, a Polícia Federal e a Guarda Nacional.

Mesmo diante da urgência de medidas de proteção às comunidades e lideranças, os representantes dos órgãos de segurança, assim como a presidente da Funai, alegaram que não seria possível fazer determinadas ações de segurança devido ao corte de verbas para as diárias e passagens. Porém, foi anunciada a solicitação de condições para a presença de efetivo da Guarda Nacional em Paranhos e Iguatemi.

Como a palavra de ordem era “pacificar o Mato Grosso do Sul”, foi anunciada pela secretaria Especial da Presidência da República a ida de uma delegação do Governo Federal àquele estado com o intuito de dialogar com o governo e órgãos locais, na perspectiva de apaziguar a situação.

Os guerreiros da paz tiveram mais uma missão de exigir justiça, diante da guerra que lhes foi declarada. Aguardam ativamente as providências prometidas.

Cimi 40 anos, 25 de agosto de 2012.

Egon Heck

Povo Guarani Grande Povo

http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&conteudo_id=6476&action=read

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