Samuel Wanderley e Olinda Muniz Wanderley*, especial para Combate ao Racismo Ambiental
Os Pataxó Hã-hã-hãe estão ocupando parte de seu território tradicional que se encontrava em posse de fazendeiros na região de Itaju do Colônia e Pau Brasil. Os indígenas informam que desde o inicio das ocupações vêm sofrendo pressão com ameaças de arrastões para a retirada deles das terras, movimentação de grande contingente de homens fortemente armados, utilizando veículos para trafegar pelas estradas, chegar próximo aos locais onde estão os indígenas acampados e atirar contra as pessoas que estão nas áreas retomadas.
Já foram muitas incursões, algumas delas envolvendo grande contingente de homens na tentativa de furar as defesas dos indígenas e penetrar nas áreas ocupadas. A situação é muito perigosa para os indígenas pois a maior parte da área só possui acesso por estas estradas bloqueadas pelos pistoleiros, ninguém passa. A fim de levar alimentos para as pessoas nas retomadas, os Pataxó Hã-hã-hãe estão precisando enfrentar quilômetros de caminhada por serras, áreas de pasto e mata.
Em decorrência da dificuldade de acesso e deslocamento, o indígena José Muniz sofreu problemas cardíacos em um destes locais e não pode ser atendido, vindo a falecer durante a noite. Para que seu corpo fosse retirado da área, foi necessário o acompanhamento da Policia Federal, o que se deu muitas horas após a sua morte.
O indígena Welton foi baleado na perna enquanto trafegava próximo a uma área já ocupada a mais de dois anos, que porém estava próxima da área de conflito. Foi socorrido, e até agora a noticia que temos é de que não corre perigo.
A autoridades informam haver policiamento em Itaju do Colônia a fim de conter o conflito, mas os fatos que narram os indígenas é que os pistoleiros continuam rondando a área livremente, as estradas estão bloqueadas, e prosseguem as incursões armadas com pistoleiros atirando contra os indígenas.
Conversando por telefone com os indígenas, não é difícil perceber o clima de tensão e medo instaurado na comunidade. Temem a entrada de pistoleiros e morte de muitas pessoas. As notícias que chegam da região é de caminhões transportando pistoleiros passando pelas localidades de jacaracy e Palmira. Falam em arrastão para retirar os indígenas da terra. Uma situação de conflito desta magnitude, na qual os indígenas não têm como escapar rapidamente, pode chegar a provocar uma grande tragédia. Muitos indígenas podem morrer ou sair gravemente feridos, ainda mais indígenas do que já morreram na luta ao longo de mais de 30 anos de conflito.
A esperança dos Pataxó Hã-hã-hãe é de uma intervenção do Ministério Público Federal no sentido de recomendar ao Estado, por intermédio de seus organismos que tratam de segurança pública, que cumpra com sua responsabilidade para com a integridade da vida destas pessoas. Não é cabível que em pleno século XXI estejamos vivendo os tempos do inicio da colonização do Brasil. Os Povos Indígenas devem ser respeitados e ter garantido o direito à vida e suas formas próprias de organização social, assim como o direito à terra conforme estabelece a Constituição brasileira. Os indígenas estão reivindicando a posse de seu território, assim como garante a lei.
As terras alvo desta disputa estão em posse dos fazendeiros em razão da não continuidade do julgamento da ação que visa o reconhecimento de nulidade dos títulos de terras conferidos sobre a área indígena já reconhecida e demarcada. Qualquer povo reage quando sua situação de vida passa da linha do suportável. Foi isto que fizeram estes indígenas ao ocuparem pacificamente estas áreas. E o que querem é tão somente a garantia de que não serão mortos por pistoleiros e nem obrigados a desocupar terras que são legalmente de uso exclusivo deles.
Estamos no aguardo de ações urgentes do Estado Brasileiro, a fim de que seja garantida a segurança dos indígenas que estão nas áreas ocupadas e ameaçados por pistoleiros. Muitos alertas sobre o risco que estas pessoas estão correndo já foram emitidos e levados às autoridades. O Estado está ciente da situação, e esperamos que não seja necessário que seja chamado à responsabilidade pela morte anunciada de mais indígenas envolvidos nesta disputa.
*Correspondentes dos Pataxó Hã-hã-hãe em Salvador. Samuel Wanderley é antropólogo indigenista vinculado aos Pataxó Hã-hã-hãe e colaborador da ONG Anaí – Associação Nacional de Ação Indigenista.