Fernanda Ezabella
Los Angeles – Nem mocinhos nem bandidos. E, sim, ativistas políticos. É como os integrantes do grupo Anonymous são retratados no documentário inédito americano “We Are Legion – The Story of the Hacktivists” (nós somos legião – a história dos hackers ativistas).
São homens e mulheres que, desde 2008, têm tirado do ar sites de grandes empresas e de órgãos de governo. Fizeram fama na internet por isso e são alvo de processos judiciais pelo mesmo motivo.
Segundo Brian Knappenberger, diretor do filme, alguns pontos unem esses ativistas: são descentralizados, bagunçados e, principalmente, querem levar a desobediência civil para a era digital.
“É um dos fenômenos culturais mais interessantes da história recente”, diz Knappenberger sobre a bandeira do ciberativismo erguida por membros do Anonymous.
O filme acaba de sair do forno: foi exibido pela primeira vez em janeiro, no festival Slamdance, em Park City (EUA), e ainda não tem estreia prevista no Brasil.
Eles contam histórias de como o grupo foi formado por frequentadores do 4chan, site para livre troca de imagens, e de como muitos membros investiam em ataques em jogos sociais por pura diversão.
A mudança de atitude veio em 2008, quando perceberam o poder que tinham juntos, ao marcarem protestos em frente aos templos da cientologia em várias cidades do mundo. Cerca de 9.000 pessoas apareceram, para espanto dos organizadores.
O documentário martela a ideia da desobediência civil on-line ao citar precursores do ativismo digital, como o Cult of the Dead Cow, grupo dos EUA formado nos anos 1980.
E, em especial, por meio das conversas com integrantes do Anonymous presos em julho de 2011 e à espera de julgamento por causa dos ataques contra PayPal, Visa e MasterCard em 2010, em represália ao corte de serviços ao site Wikileaks.
Eles podem ser multados em até US$ 250 mil e pegar penas de até 15 anos de prisão. “É um referendo sobre nosso direito de protestar on-line”, disse o diretor à Folha. “Não que não seja ilegal. Mas a punição deve ser adequada ao crime.”
PACIÊNCIA
Foi com muita paciência que o diretor Brian Knappenberger frequentou salas de bate-papo usadas pelos integrantes do Anonymous, durante um ano, tentando ganhar a confiança de alguns para filmar seu documentário “We Are Legion”.
“Quando você fala com gente que esconde a identidade, é um desafio saber o que está por trás. É preciso calma. Um deles disse que me conhecia, e até hoje não tenho ideia de quem era”, contou o também jornalista de 41 anos, que lidera a produtora Luminant, em Los Angeles, colaboradora dos canais Discovery Channel e Bloomberg Television.
Entre os que tiram a máscara para falar do grupo está Peter Fein, associado ao Anonymous e ao grupo Telecomix nas operações contra governos da Tunísia e do Egito no ano passado, no auge da Primavera Árabe.
“Já nos chamaram de simpatizantes de terroristas, crianças, cyberbullies, hooligans. Às vezes esses termos não são totalmente errados, mas este é, sim, um movimento político sério”, afirma Fein durante o longa.
Mercedes Haefer é a única mulher do Anonymous a dar as caras no filme. Ela conta como, em 2010, foi tirada de casa às 6h, ainda de pijama, por agentes do FBI com coletes à prova de bala. O motivo? O ataque ao site do PayPal.
Agora em liberdade, ela tem participado de audiências para o julgamento, que deve durar até um ano, segundo seu advogado, Stanley Cohen. “O caso dela não envolve roubo de identidade, invasão de e-mails, fechamento de empresas. (…) É um caso puro de manifestação pacífica”, afirma.
Outro desmascarado é Brian Mettenbrink, que em 2010 pegou um ano de prisão e multa de US$ 200 mil pelos ataques on-line da operação contra a cientologia. “Não me arrependo, foi uma causa nobre”, diz Mettenbrink no filme, ao lado da mãe. “Estava fazendo a diferença. E nem precisava sair de casa!”
CANHÃO DIGITAL
Ele usou a ferramenta mais comum do Anonymous, o programa Low Orbit Ion Cannon, que opera coletivamente e de forma bastante simples, sobrecarregando o site-alvo para tirá-lo do ar.
“É uma arma poderosa, mas existem outras mais sofisticadas. A vasta maioria dos membros do Anonymous não tem grandes habilidades de hacking, é uma coisa difícil de aprender”, explicou o diretor Knappenberger.
Entre as polêmicas do grupo, está a criação recente de uma versão desse programa que inicia o ataque sem o usuário saber. Outra prática comum questionada é a divulgação de informações de internautas, como números de cartões de crédito, para provar a fragilidade de sistemas.
“Eles fazem isso de forma barulhenta, pública, é uma provocação. É diferente dos hackers que invadem para roubar e fazem isso silenciosamente”, defende Brian.
Alguns ataques chegaram a reunir 10 mil pessoas, mas só de 200 a 300 costumam frequentar salas de bate-papo em períodos calmos.
“Sem dúvida, o movimento não está enfraquecendo”, disse. “Há uma discussão forte entre eles, brigam muito sobre o que fazer, que tipo de ataques são apropriados. O Anonymous nunca é unânime.”
Enviada por José Carlos.