Minas Gerais registra alto índice de mortes de jovens sob custódia

Impotente diante da perda brutal do filho de 16 anos, Alessandra Silva espera justiça

Dezenove adolescentes infratores perderam a vida enquanto estavam sob a tutela do Estado, cumprindo medidas socioeducativas

Renato Fonseca

O armário da sala guarda peças de artesanato de papel picado feitas nos últimos meses pelo filho de 16 anos. Ao segurar uma delas, com a palavra mãe escrita em rosa, a diarista Alessandra Silvia da Silva, de 41 anos, sorri, toda prosa, diante do talento do jovem. Em seguida, ela vai até o quarto e pega uma fotografia do adolescente. Segura firme com as duas mãos, olha com atenção, morde o lábio e se cala. Sem conseguir conter as lágrimas, o silêncio é interrompido pelo choro ao lembrar a curta trajetória de vida do menino.

Alessandra Silva é mais uma mãe impotente diante da perda brutal do filho, supostamente assassinado enquanto estava sob a custódia do Estado. Vitor Luiz Silva Barbosa é um dos 19 adolescentes infratores que perderam a vida enquanto estavam cumprindo uma medida socioeducativa nos últimos quatro anos. Destes, pelo menos nove foram mortos enquanto estavam encarcerados ilegalmente em cadeias ou presídios de Minas Gerais.

Símbolo da dor que devasta psicologicamente outras mulheres mineiras, Alessandra é, como ela mesma define, uma órfã às avessas. Vitor estava acautelado desde novembro passado, por roubo à mão armada, no Centro Socioeducativo de Sete Lagoas, na região Central do Estado. Ele foi encontrado morto, na madrugada do último dia 23, amarrado a uma “tereza” (corda feita com lençol) e deitado em sua cama.

Um agente do centro de internação, que pediu anonimato, disse que o perito que examinou o rapaz descartou, por completo, a hipótese de suicídio. “Meu filho entrou vivo e saiu morto daquele lugar”, lamenta Alessandra Silva. Ela conta que iria se encontrar com Vitor no dia seguinte, durante a visita semanal. “Já tinha separado um dinheiro para comprar um sabonete e um desodorante para ele”, recorda. Como se não bastasse a tristeza pela morte do adolescente, ela ainda sofreu, e muito, até a liberação do corpo.

“Disseram que iam levá-lo até o IML (Instituto Médico Legal), mas, na verdade, o corpo dele ficou a noite inteira dentro do rabecão, na porta de uma delegacia. E o pior é que até hoje ninguém do Centro Socioeducativo me procurou para dar explicações sobre o que aconteceu. Tenho certeza de que ele foi assassinado”, desabafa.

Segundo a promotora Andréa Carelli, responsável pelo Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça da Infância e da Juventude de Minas Gerais (CAO/IJ), farta documentação comprova as mortes, entre 2008 e 2011. O Ministério Público investiga todas elas. Porém, apenas uma ação contra o Estado está em julgamento. O homicídio de um menor de 16 anos, ocorrido em Unaí, no Noroeste de Minas. O adolescente foi asfixiado por colegas de alojamento.

Outras nove tentativas de homicídio ocorreram desde 2008. Conforme a promotora, nenhuma morte foi explicada pelo Estado ao Ministério Público até o momento, nem mesmo as que aconteceram nas penitenciárias. Foram três na cadeia pública de Arcos (região Centro-Oeste) e duas em Boa Esperança (Sul de Minas). Nos presídios de Unaí (Noroeste), Pedra Azul (Jequitinhonha) e Campo Belo (Centro-Oeste) ocorreu uma morte em cada. “Gostaria, e muito, de receber informações precisas sobre cada uma destas ocorrências. É uma obrigação do Estado se pronunciar”, afirma Andréa Carelli.

http://www.hojeemdia.com.br/minas/minas-gerais-registra-alto-indice-de-mortes-de-jovens-sob-custodia-1.401077

Enviada por José Carlos.

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