MG: Comunidades rurais sofrem sem estações de tratamento. Numa delas, água tem gosto de ferro

Alessandra Mello, Luiz Ribeiro e Juliana Cipriani

A água usada pela Escola Municipal Jairo Ferreira Guedes, em Jenipapo de Minas, a 620 quilômetros de Belo Horizonte, no Vale do Jequitinhonha, é tão turva que o arroz servido na merenda das crianças fica escuro. Para melhorar a aparência da comida, as cantineiras adicionam colorau (urucum em pó). A mesma água usada na cozinha da escola é bebida pela meninada, depois de passar pelo filtro e ficar cristalina. Mas o gosto, garantem funcionários da escola, continua ruim. O sabor se parece com o de ferro.

Na segunda parte da série de reportagens sobre a falta de água potável em 23 comunidades rurais do semiárido mineiro, o Estado de Minas mostra como a demora na entrada em funcionamento de estações de tratamento agrava o drama de moradores de localidades como a da Agrovila Monte Alegre – onde fica a Escola Jairo Ferreira Guedes –, criada para abrigar reassentados da Barragem Setúbal, inaugurada em janeiro do ano passado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A construção, de R$ 160 milhões, fez parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a inauguração da obra foi saudada como a redenção do pequeno município, com pouco mais de 7 mil habitantes, que sempre sofreu com o problema de falta de água. Só que, para a zona rural da cidade, a obra ainda não fez diferença porque a estação de tratamento construída na época da transferência da população não funciona.

Os equipamentos da estação foram recentemente pintados de branco, mas a tinta não esconde os sinais de abandono. Dentro da pequena edificação, sacos de produtos químicos estão rasgados e recipientes para tratamento estão com bombas enferrujadas, cheios de água suja e insetos. A água usada pela comunidade vem de um poço artesiano e é distribuída sem  nenhum tipo de tratamento para as residências das 55 famílias que moram ali. Quem toma conta da estação e do poço é o dono da venda da comunidade, Isaías Soares Ribeiro, 47 anos. Segundo ele, a pintura é resultado de uma ação do Ministério Público, que cobra “para ontem”, ele diz, a entrada em funcionamento da estação. “Mas mesmo esse ‘para ontem’ está muito demorado”, completa.

Seu Isaías recebe um salário da Fundação Rural Mineira (Ruralminas) para fazer o serviço. A Ruralminas foi a responsável pelo reassentamento das famílias transferidas da beira do Rio Setúbal para diversas localidades de Jenipapo. Procurado pela reportagem, o Ministério Público não quis se manifestar. A Ruralminas afirmou, por meio de sua assessoria, que o sistema de abastecimento de água para famílias reassentadas da Barragem de Setúbal está em fase final de construção. Será uma estrutura de captação, elevação, tratamento simplificado, reservatório e distribuição das residências da Agrovila, em Jenipapo de Minas.

Falta técnico – O abandono de obras que poderiam minimizar os efeitos da falta de água também é problema em Buriti do Meio, comunidade quilombola do município de São Francisco, a 558 quilômetros de Belo Horizonte. Ali, as 178 famílias consomem água retirada de um poço tubular sem nenhum tipo de tratamento. A localidade tem uma estação de tratamento, construída há seis anos, quando o poço foi cavado, mas ela não funciona. Claudionor Souza Silva, diretor da associação comunitária de Buriti do Meio, conta que o equipamento foi adquirido com recursos da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), mas não há técnico para operá-lo. “Sem uma pessoa capacitada, a gente não pode comprar nem os produtos usados para tratar a água”, afirma o líder comunitário. A comunidade já cobrou da prefeitura um técnico treinado, mas não foi atendida.“Se a gente tivesse água tratada, as condições de vida seriam melhores e haveria menos doenças”, lamenta Claudionor.

Em Araçuaí, a 678 quilômetros de Belo Horizonte, uma obra da Funasa de R$ 157 mil que poderia amenizar os efeitos da falta de água também nunca funcionou. A estação simplificada de tratamento e distribuição de água, em Gravatá de Cima, comunidade da zona rural de Araçuaí, foi paralisada em 2008. O mato toma conta da estação e da estrada que leva ao local. A reportagem do EM tentou contato com a Funasa em Araçuaí, que responde por toda a região, mas não obteve retorno. O engenheiro responsável da Funasa, Hélbio Fernandes, também não foi localizado.

http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2011/08/13/interna_gerais,244917/comunidades-rurais-sofrem-sem-estacoes-de-tratamento-numa-delas-agua-tem-gosto-de-ferro.shtml

 

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