Estudo aponta que Vale é conivente com a degradação ambiental e trabalho escravo na cadeia produtiva do aço

Pesquisa do Observatório Social que será lançada no dia 22 de junho em São Paulo revela fraudes e trabalho escravo numa das mais importantes cadeias produtivas no Brasil, a produção do aço no pólo de Carajás, atingindo os estados do Pará e Maranhão.

Nas cidades no entorno de Marabá (PA) e Imperatriz (MA), onde se concentram as empresas de siderurgia na produção do ferro gusa, uma série de irregularidades foi apontada pelo estudo coordenado pelo jornalista Marques Casara, membro do Observatório Social.

Em Nova Ipixuna (PA), onde no dia 24 de maio foram assassinados José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo, que denunciavam a devastação da floresta para produzir carvão e madeira, trabalhadores foram flagrados em carvoaria clandestina sem carteira assinada e sem equipamento de proteção, onde 100% da produção é direcionada ao pólo de Carajás, denuncia o estudo.

“O Pará é estado com o maior número de trabalhadores escravos. Nós não fizemos a conta, não somamos, pois é impossível fazer isso. São milhares”, afirma Casara.

Sobre a degradação ambiental envolvida no processo de produção, o estudo aponta que as áreas mais prejudicadas são as reservas indígenas, e Áreas de Preservação Permanente (APP). “O carvão é retirado ilegalmente de terras indígenas e de áreas de preservação sendo esquentado (tornado legal) com o uso de documentos forjados e mediante a conivência de servidores do governo do Pará. O carvão é usado para fabricar ferro gusa, posteriormente vendido para grandes siderúrgicas do mundo”, revela o jornalista.

Esquemas

O estudo aponta que há diversas formas de esquemas na operação dos grandes complexos carboníferos usados para lavar carvão ilegal para as siderurgicas. Umas das mais emblemáticas reveladas é o caso da Indústria de Carvão Vegetal Boa Esperança situada em Jacundá (PA), de onde controla 96 fornos. “Em março deste ano a empresa declarava ter no pátio 325 MDC* de carvão. A contagem forno a forno, realizada por fiscais do IBAMA, mostrou que a empresa só tinha de fato 113 MDC de carvão. A diferença (212) vinha de carvoarias clandestinas”, ou seja, “o carvão produzido em outro local usa o crédito da carvoaria legalizada para esquentar o produto e dar a ele uma aparência legal. Somente na Boa Esperança, 66% do carvão declarado pela empresa não está, de fato, no pátio. Com isso, a empresa pode vender 66% dos seus créditos de carvão”, afirma a pesquisa.

Segundo Casara menciona no relatório, a “Boa Esperança faz parte de uma rede de ilegalidade na região de Jacundá e seu proprietário utiliza-se de 15 CNPJs (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica)”.

Outra forma também desvendada pela pesquisa de Casara é o uso de créditos de madeira concedidos aos assentamentos rurais e à agricultura familiar. “Novamente, os créditos de madeira são vendidos para as carvoarias. Um dos esquemas está em operação em Tucuruí (PA). A madeira nunca sai do assentamento, mas por uma triangulação envolvendo madeireiras, empresas agropecuárias e carvoarias, os créditos também são usados para esquentar carvão para o setor siderúrgico”, diz trecho do estudo.

Até as quebradeiras de coco de babaçu são usadas no esquema da região, pois como a casca dessa espécie de coco não precisa de guia florestal para ser transportada até as carvoarias, as siderúrgicas supervalorizam a quantidade de carvão produzida a partir dessa matéria prima.

A mesma situação ocorre com o eucalipto: “também não precisa de guia florestal, de modo que as siderúrgicas maquiam boa parte da ilegalidade usando como fachada a produção de eucalipto”.

Algo que despertou nos agentes do IBAMA do Pará e Maranhão a suspeita sobre a verdadeira quantidade de eucalipto que dizem ter as siderúrgicas. “Estamos justamente neste momento em fase de término de um estudo que nos elucide sobre a verdadeira área plantada de eucalipto na região para podermos fiscalizar a proveniência desse carvão” diz Orlando de Assunção Filho, gerente executivo do IBAMA de Imperatriz.

 

Coniventes

O estudo aponta que não só as empresas se beneficiam desse processo, como têm conhecimento das irregularidades que fomentam o Grande Projeto Carajás de mineração.

“A Vale conhece o processo e não cumpre acordo assinado em 2008 com o Ministério do Meio Ambiente, de que não venderia mais minério de ferro para siderúrgicas envolvidas em processos predatórios”, esclarece Casara.

Dentre as empresas envolvidas Casara cita: “a Vale S/A, Cosipar, Sidepar, Nucor Corporation, National Material Trading, Ford, GM, Toyota e Nissan”.

Pois, “a Vale fornece o minério de ferro, a Cosipar e Sidepar fazem o ferro gusa e as demais são compradoras do produto. É o que chamamos de cadeia produtiva do desmatamento e do trabalho escravo”, conclui o coordenador da pesquisa.

 

Por Márcio Zonta, Justiça nos Trilhos – www.justicanostrilhos.org

 

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