“Vimos por meio desta, prestar um esclarecimento que nos foi solicitado pelo povo Munduruku. Estendemos o alcance do esclarecimento à comunidade acadêmica da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA). O termo “ANARQ” é um acrônimo que sintetiza os termos Antropologia e Arqueologia. O ANARQ é uma iniciativa autônoma que congrega um coletivo formado por alguns docentes do Programa de Antropologia e Arqueologia (PAA) desta universidade. Ele se volta à promoção de diálogo entre essas subdisciplinas através de palestras e debates com professores, pesquisadores, conhecedores indígenas e tradicionais, e demais pessoas que em seus trabalhos e vidas articulem esses universos. A demanda que nos foi legitimamente apresentada pelo povo Munduruku refere-se a um evento promovido pelo ANARQ no dia 11 de maio de 2015. Trouxemos para debate o Sr. Daniel Belik, pesquisador e doutorando em Antropologia Social pela Universidade de St. Andrews. O pesquisador estava convidado a falar sobre sua pesquisa histórico-etnográfica junto ao povo Munduruku.
Após a palestra, representantes deste grupo étnico leram uma carta assinada pelas Associações representativas do grupo, no médio e alto Tapajós, expondo documentadamente que tal pesquisa ocorria sem sua autorização. As referidas associações solicitavam que o antropólogo interrompesse a mesma. Relataram, ainda, que o pesquisador havia sido expulso reiteradas vezes de suas aldeias e assembleias. Tal situação gerou, para o coletivo organizador do ANARQ, o entendimento de que deveria suspender a atividade, atendendo ao pedido do povo Munduruku, cujos representantes se retiraram do evento imediatamente após a leitura de sua carta.
Ressaltamos que, até a manifestação das Associações no âmbito do nosso evento, não tínhamos acesso a nenhuma informação oficialmente documentada que explicitasse os problemas nas relações do referido pesquisador com o grupo étnico. Desta forma, vimos a público reconhecer que oferecemos espaço de divulgação a uma pesquisa que ignorava o protocolo básico da consulta e anuência da comunidade pesquisada, conforme convenção 169 da OIT, subscrita pela ABA. Neste sentido, esclarecemos que já estão sendo tomadas medidas para corrigir a possibilidade de repetição de problemas semelhantes. Nossa intenção é garantir um aperfeiçoamento desta importante ferramenta para a troca de conhecimentos que é o ANARQ. Destacamos que o ANARQ não apoia, endossa ou concorda com qualquer pesquisa que ocorra sem a devida consulta e anuência dos povos envolvidos.
Por outro lado, declaramos que este coletivo apoia incondicionalmente a luta e resistência dos Munduruku contra os processos de destruição da bacia do rio Tapajós. Agradecemos ao povo Munduruku pela manifestação e por nos ter permitido verificar esse erro operacional para que possamos prevenir a repetição do problema em episódios futuros.
Atenciosamente,
Coletivo do ANARQ
Santarém, Pará, 01/06/2015″
Subscrevem por ordem alfabética:
- Anne Rapp
- Bruna Cigaran da Rocha
- Camila Jácome
- Cínthia Moreira
- Claide Moraes
- Helena Schiel
- Lucybeth Arruda
- Myrtle Shock
- Paride Bollettin
- Pedro Leal
- Raiana Ferrugem
- Raoni Valle
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* Enviado pelo Coletivo do ANARQ para Combate Racismo Ambiental.
Para entender melhor:
Quem são os muitos Daniel Bellik? [Carta dos Munduruku]
Carta ao Povo Munduruku – [direito de resposta concedido a Daniel Belik]
Destaque: Criança Munduruku. Foto: Funai