“A Amazônia é importante sim para todo o país e permitir sua destruição com o desmatamento radical é como, literalmente, ‘matar a galinha dos ovos de ouro’. A região tem sido nos últimos 50 anos o ‘almoxarifado’ do Brasil e do Mundo”, escreve Raimundo Nonato Brabo Alves, pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, em artigo publicado por EcoDebate. Eis o artigo
A floresta amazônica é o “radiador” do Brasil, amenizando o clima e mais eficientemente ainda “condensando” água para outros sistemas hidrológicos interligados.
A Amazônia volta a ser objeto de discussão – depois do esquecimento por alguns meses que antecederam as eleições e não foi lembrada por nenhum candidato – como bioma importante, além de fonte inesgotável de produtos, na regulagem do ciclo hidrológico no Brasil. Cientistas afirmam que a estiagem calamitosa no sudeste tem a ver com o desmatamento na Amazônia, o que vem provocando grande repercussão na sociedade.
O resultado das urnas gerou também uma infeliz polarização, chegando a ser proposto por alguns desinformados um separatismo entre o Norte/Nordeste e o Sul/Sudeste. Impossível para a nação e seria como – numa linguagem metafórica – separar o aparelho digestivo do aparelho respiratório no corpo humano.
A Amazônia é importante sim para todo o país e permitir sua destruição com o desmatamento radical é como, literalmente, “matar a galinha dos ovos de ouro”. A região tem sido nos últimos 50 anos o “almoxarifado” do Brasil e do Mundo. Além de fonte de inúmeros produtos/serviços essenciais como energia, madeiras, minerais e alimentos, é a primeira vez que é reconhecida a sua importância como alimentadora de água para outras regiões, com certeza seu maior volume de exportação – mesmo ainda não quantificado – um dos mais importantes serviços ambientais da região, que necessita urgentemente ser reconhecido pela sociedade.
Considerando que na biomassa da floresta 50% é água, o desmatamento de 1 hectare equivale em média à eliminação sumária de 300.000 litros de água do processo natural conhecido como evapotranspiração (água que vai do solo, absorvida pelas raízes e liberada pelas folhas até a atmosfera), pois as árvores funcionam com uma “bomba” permanente de elevação de água para a atmosfera e a floresta em interação com o solo, como uma “esponja” gigantesca de retenção de umidade. Já perceberam que não há formação de neblina onde não há vegetação no entorno. Pois a neblina nada mais é que o “vapor” de água da evapotranspiração das plantas.
Então quando se aventar que a Amazônia tem a maior fonte de água potável do planeta não se pode pensar somente na escala do Rio Amazonas e seus tributários, mais também na enorme quantidade de água represada em sua floresta em permanente troca com a atmosfera na forma de vapor, que é deslocada para outros biomas ou regiões ao sabor dos ventos, formando as chuvas tão necessárias para alimentar sistemas como o de Cantareira em São Paulo, já no distante trópico de Capricórnio.
Ainda é tempo de reverter esse quadro que já começa a dar pistas do tamanho da calamidade – veja-se o caos da região sudeste em desconforto e prejuízos – estabelecendo como política para a Amazônia o desmatamento zero e recompondo grande parte das áreas já desmatadas com reflorestamento, com prioridade para as matas ciliares e as nascentes.
É mais econômico deixar por conta da natureza manter essas “corredeiras” naturais de vapor d’água entre a Amazônia e demais regiões que construir no futuro gigantescas adutoras em áreas desertificadas. Evitando-se o desmatamento, permitimos que a floresta amazônica continue como o “radiador” do Brasil, amenizando o clima e mais eficientemente ainda “condensando” água para outros sistemas hidrológicos interligados.