Por Luiz Felipe Albuquerque
Da Página do MST
Cerca de 50 famílias Sem Terra correm o risco de serem despejadas do pré-assentamento Egídio Brunetto, no município de Lagoinha, na região do Vale do Paraíba. A ordem de despejo está marcada para esta sexta-feira (7).
O curioso desse processo é que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já tinha conquistado a imissão de posse da Fazenda Bela Vista desde o dia 7 de abril deste ano, pelo fato da área de 1.650 hectares ter sido considerada improdutiva e ser decretada de interesse social para fins de Reforma Agrária, em dezembro de 2012.
Entretanto, a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) entrou na justiça para questionar a viabilidade do assentamento na região, por ser considerada uma zona de amortecimento (área entorno de uma unidade de conservação).
Porém, como lembra o superintendente substituto do Incra de São Paulo, Sinésio Luiz Paiva Sapucahy Filho, a Fundação Florestal já deu parecer quando inquirida a esse respeito pela Cetesb, afirmando que o local está fora da zona de amortecimento do Parque Estadual da Serra do Mar.
“Ocorre que consta no processo uma manifestação do General responsável pela base Aérea do Exército existente em Taubaté, dirigida ao Incra (mas aqui nunca recebida) e ao Secretário de Meio Ambiente do estado de São Paulo, manifestando que o local deveria ser de interesse público, visto que sobre o imóvel se concentrava o treinamento dos helicópteros do Exército e que sempre tiveram o apoio do proprietário do imóvel para esta atividade”, conta Sinésio.
Com base nesse documento, foi pedida nova manifestação da Fundação Florestal, que reiterou que o imóvel está fora da zona de amortecimento e que o treinamento militar é altamente impactante ao meio ambiente. “Mas estranhamente, com base nisso, recomenda a não concessão da licença ambiental ao Incra, o que é então acatado pela Cetesb, indeferindo o pedido de licença ambiental prévia”, explica o funcionário do órgão federal.
Valdir Martins, da direção regional do MST, também contesta o posicionamento do órgão federal. “Existe um milhão de pés de eucalipto de grandes fazendeiros plantados no topo da Serra do Mar, que destrói com a biodiversidade da região. Qual a legitimidade da Cetesb dizer que um assentamento iria causar impacto ambiental na região?”, questiona.
O Sem Terra ainda atenta para o fato de que a fazenda está completamente desmatada, e que o projeto de assentamento do Incra prevê todo o reflorestamento da área, recuperando as Áreas de Preservação Permanente (APPs) e de Reserva Legal (RL).
De acordo com Sinésio, o Incra está recorrendo na segunda instância da Justiça Federal (TRF3) contra a decisão. Em paralelo, também foi dado conhecimento ao Ministério Público Federal, que já solicitou manifestação da Cetesb sobre o assunto.
Disputa de território
Segundo os Sem Terra, a região do Vale do Paraíba é constituída por forças políticas que impedem o avanço da Reforma Agrária na região. Um dos motivos é a alta valorização das terras, por estarem entre o eixo Rio/São Paulo e contarem com grandes reservas d’água.
“Quando ocupamos uma fazenda nessa região, a briga menor é com o fazendeiro. O Vale é uma região muito conservadora, com força militar, grandes empresas e meios de comunicação com propriedades de terras”, observa Valdir.
A própria Fazenda Bela Vista, quando ocupada, estava arrendada para a Família Saad, donos do canal de televisão Bandeirantes.
Valdir comenta que muitas das terras da região remetem à época da política Café com Leite, tendo muitas propriedades sem registro, com dívidas trabalhistas e problemas ambientais.
Por causa disso, “as forças políticas da região ficam alegando que não é possível criar assentamentos, por ser uma região muito montanhosa. Isso é mentira, há muita terra boa com possibilidades de produzir alimento de qualidade para a população, criar agroindústrias e contribuir com o desenvolvimento das cidades no entorno”, comenta Valdir, ao lembrar que a cidade de São José dos Campos, com 650 mil habitantes, é obrigada a importar 90% do alimento que consome.
As próprias famílias do pré-assentamento Egídio Brunetto já vinham cultivando hortaliças na área.
Uma semana após a conquista da fazenda, em abril, os Sem Terra realizaram um processo de formação em que debateram o futuro do assentamento.
No centro do debate, foi destacado a possibilidade de desenvolver experiências agroecológicas no assentamento, ao mesclarem plantação de grãos num local, pecuária em outro, além de hortaliças e árvores frutíferas integrados aos Sistemas Agroflorestais (SAFs).
No entanto, Valdir afirma que “não vamos desistir da área. Já tivemos muito esforço para conquistá-la, e não vamos permitir que se dêem passos para trás na luta pela Reforma Agrária na região”.
O que posso fazer para ajudar?