As entidades abaixo que assinam este documento, vêm requerer um posicionamento frente ao conflito, no mínimo ético, existente no grupo de trabalho Graves violações de Direitos Humanos no campo ou contra indígenas, conforme entrevista e artigo publicados no site Carta Capital em 29/03/2014 (Anexos 1 e 2) e demais pontos abaixo.
Diferente do exposto pela coordenadora do GT, entendemos que existe sim este conflito com a permanência do colaborador Inimá Simões na CNV, por ser parente direto (filho) de pessoa envolvida em denúncia a ser investigada pela Comissão Nacional da Verdade.
1. Seu pai, Itamar Zwicher Simões, foi acusado no Relatório Figueiredo, entre outras coisas, de praticar maus tratos e escravização de indígenas. Após o término das investigações foi solicitado seu afastamento do SPI a bem do serviço público e teve denúncia formalizada pelo estado brasileiro através do Processo nº 14857/68, que se encontrava em 28/05/1968 no Departamento de Polícia Federal, portanto dentro do prazo estipulado pela lei que criou
a CNV e passível de investigação pela comissão.
2. As pesquisas voluntárias em desenvolvimento pela sociedade civil, apontam também a necessidade de investigação da existência de cadeia clandestina no Posto Indígena do antigo Serviço de Proteção ao Índio no estado de São Paulo em Icatu. Nesta época Itamar Zwicher Simões, exercia aí, função de CHEFE DE POSTO.
A interpretação de que o colaborador, por não receber recurso diretamente da CNV, mantenha com esta um vínculo meramante voluntário, não se sustenta no caso em questão, pois este atua sem remuneração por estar cedido pela Câmara dos Deputados, onde trabalha efetivamente e recebe seus proventos.
1. Desde 31 de Julho de 2012, seu nome está associado aos trabalhos da CNV, conforme publicado no site da instituição, como colaborador direto de um importante e estratégico grupo de trabalho, o de PESQUISA, GERAÇÃO E SISTEMATIZAÇÃO DE INFORMAÇÕES. (Anexo 3)
2. Foi oficialmente vinculado ao grupo de trabalho destinado a apurar violações contra indígenas, através da Resolução nº 5 de 05 de novembro de 2012, publicada em Diário Oficial. (Anexo 4)
Nada há contra a pessoa de Inimá Ferreira Simões. Mas por uma questão ÉTICA e de coerência com os critérios adotados quando de sua instalação, onde foi definido que pessoas atingidas e/ou parentes de pessoas atingidas pela repressão, bem como de pessoas investigadas não poderiam ser indicadas como comissionadas ou mesmo compor o quadro de assessoria ou colaboração direta com os trabalhos dos GTs. Nada impede que sua colaboração, mesmo de forma voluntária, se dê a partir de qualquer iniciativa de forma pessoal, apresentando trabalho ou por comitês da sociedade civil, como acontece com ex-presos políticos e familiares.
Solicitamos o imediato desligamento deste colaborador dos trabalhos diretos em que está envolvido nos dois GTs, para que não paire dúvidas sobre o trabalho da Comissão Nacional da Verdade.
Devido ao volume enorme de violações a serem apuradas, tanto no que diz respeito aos camponeses atingidos pela ditadura como aos indígenas, foi definido pela coordenadora do GT, que até fevereiro passado foi dada enfase ao estudo e sistematização das violações contra camponeses e que a partir de março de 2014 a prioridade seria para os povos indígenas.
Considerando tais violações ocorreram de forma brutal e em quase todos os Estados do Brasil contra muitos povos, se faz necessário que:
1. A Comissão Nacional da Verdade estruture de forma urgente no grupo de trabalho Graves violações de Direitos Humanos no campo ou contra indígenas, uma equipe com assessores conhecedores e ligados à questão indígena, suficiente para atender as demandas de cada região do país, a fim de que o trabalho possa refletir no Relatório Final o que de fato aconteceu no país contra esta população durante o período investigado por lei e não só alguns casos emblemáticos, que por ventura puderem ser apurados no exíguo tempo que resta para a concretização dos trabalhos.
2. Uma vez que a CNV entrou em fase de produção dos relatórios parciais dos GTs e o estudo da questão indígena ainda está por ser estruturado e sistematizado, sendo pouquíssimos os casos apurados, solicitamos também a flexibilização dos prazos para a entrega de relatório parcial, pois até junho é impraticável realizar o trabalho que não foi feito de forma contínua em ano e meio.
3. A liberação de recursos para a imediata indexação de 350 mil páginas de documentos já localizadas em arquivos, que podem auxiliar e agilizar os estudos do grupo citado acima (sob coordenação da Drª Heloisa Sterling, conforme declaração da comissionaria Maria Rita Kehl), abrindo acesso à documentação digitalizada para a pesquisa, também à Comissão Nacional Indígena. Ao final dos trabalhos, em si, este acervo digital, já é uma ferramenta de reparação para uso pedagógico e educacional nas escolas e universidades, sob guarda do Arquivo Nacional como determina a lei.
Solicitamos por fim a viabilização de um processo de continuidade de apuração das graves violações contra os povos indígenas brasileiros, para além do Relatório Final de dezembro de 2014, onde a produção de um relatório complementar possa ser apresentado até final de 2015, para que tenhamos um trabalho amplo, que garanta uma efetiva ferramenta de reflexão à sociedade sobre as violências praticadas contra estes povos, muitos dos quais ainda hoje vivem invisíveis, sofrendo das mesmas agressões e praticas violentas que lhes negam seus direitos, possibilitando pela exposição da verdade sobre as violências sofridas por estes povos entre 1946-1988,
a criação de mecanismos de educação da sociedade envolvente, bem como e fundamentalmente de mecanismos de não repetição destas violências.
A CNV acertou ao acolher a demanda das instituições de direitos humanos, em maio de 2012, pela necessidade de inclusão nos seus trabalhos de investigação das violações contra os indígenas, buscando pautar de forma definitiva a temática no âmbito da justiça de transição e fundamentalmente apoiada também na busca de reparação da dívida que o Estado brasileiro e nossa sociedade têm para com estes brasileiros.
Entendemos porém, que a não exposição dos volumosos casos de violações de direitos praticados contra a pessoa do índio e seus direitos, não contribuí para a democratização do país e apequenará os resultados do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade tão necessários ao desenvolvimento do Nunca Mais em nossa sociedade.
Assinam:
Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – Sessão RJ
Grupo Tortura Nunca Mais da Bahia
Grupo Tortura Nunca Mais do Paraná
Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro
Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo
Movimento Tortura Nunca Mais de Pernambuco
Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul