Entidades pretendem pressionar deputados e ocupar plenário da CCJ durante votação da Proposta de Emenda Constitucional 171/1993
por Rodrigo Gomes, da RBA
Com a previsão de que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados vai votar hoje (30) a admissibilidade da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171, de 1993, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos, o Conselho Federal de Psicologia (CFP), o Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes (Conanda), o Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e outras entidades foram ao Congresso manifestar-se contra a proposta e cobrar “responsabilidade” dos parlamentares.
“Temos a terceira maior população carcerária do mundo. Prender não resolveu nada para enfrentar a situação de violência em que sociedade se encontra hoje. Estamos tratando de quase metade da população brasileira. Essa Casa deve ter noção da responsabilidade com que está lidando”, afirmou a presidenta do Conjuve, Ângela Guimarães, em coletiva das entidades na manhã de hoje (30).
Para ela, os deputados deviam “centrar fogo” na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o assassinato de jovens, aprovada recentemente. “O Brasil é um país onde é muito perigoso ser criança ou jovem. Temos legislações avançadas, mas é preciso efetivá-las. O que está sendo proposto pela CCJ é um futuro de barbárie contra crianças e jovens”, disse Ângela, que considera parte da imprensa responsável pela visão “estereotipada” sobre crianças e adolescentes no Brasil.
Representantes das entidades vão procurar os parlamentares membros da CCJ para tentar convencê-los a votar contra a proposta, que consideram ilegal e ineficaz. “Aprovar a PEC não vai reduzir a violência, nem enfrentar as suas causas. Mas desviaria o foco do problema real que é garantir as políticas públicas preconizadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que nunca foram efetivadas”, defendeu a presidenta do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Mariza Monteiro Borges.
Mariza lembrou que ao longo da história do Brasil, crianças e adolescentes não eram tratados como sujeitos de direitos. Somente com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), há 25 anos, é que foi definida uma diretriz sobre a qual as políticas públicas voltadas a eles deviam ser desenvolvidas. “Devemos garantir direitos e não extirpá-los do convívio social”, concluiu.
Na última quarta-feira (25), o presidente da CCJ da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu que vai colocar a PEC 171 em pauta como item único em todas as sessões extraordinárias, até que a admissibilidade do projeto seja votada. A primeira sessão será hoje (30), às 14h. “Vai ter tempo para discutir o projeto na comissão especial da Câmara, depois nas duas votações na Câmara, mais a comissão especial no Senado, mais as duas votações”, disse Lira aos deputados e manifestantes que queriam mais tempo para debater a PEC.
A presidenta da União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes), Bárbara Melo, disse que a entidade vai se mobilizar em todo o país contra a PEC 171. “Essa medida é contra a sociedade. É um crime contra toda a juventude. Precisamos de uma pátria educadora de fato e não encarceradora. A maior parte dos crimes hediondos não são cometidos por jovens”, afirmou.
De acordo com dados do Censo do Sistema Único de Assistência Social, elaborado em 2014, o Brasil tinha 108.554 adolescentes cumprindo algum tipo de medida socioeducativa em 2012. O número corresponde a 0,18% dos 60 milhões de brasileiros com menos de 18 anos. Destes, 20.532 (19%) cumpriam medida de internação ou semiliberdade e 88.022 (81%) estavam em prestação de serviços à comunidade ou sob liberdade assistida.
No entanto, os atos contra a vida registrados eram 13,3% do total de atos infracionais, sendo homicídios, 9%, latrocínio, 2,1%, estupro, 1,4% e lesão corporal, 0,8%. A prática de roubo respondeu por 38,6% dos casos e o tráfico de drogas, por 27%.
Para a professora de psicologia Flávia Lemos, a redução da maioridade penal vai punir duplamente os adolescentes. “Essa lógica penal proposta pela PEC, além de ilegal, é um crime. Nós estamos falando de crianças e adolescentes que nunca foram prioridades na atenção dos governos, mesmo depois da aprovação do ECA. Já os punimos sem garantir os direitos. E agora vamos jogá-los na cadeia”, questionou.
Também participam da mobilização de hoje representantes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), do Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (MPF), da Associação dos Juízes pela Democracia (AJD), da Rede Evangélica Nacional de Ação Social (Renas), da Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (Anced), da Rede Nacional do Adolescente em Conflito com a Lei (Renade) e da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep).
Foto: Agência Câmara.