Michèlle Canes – Repórter da Agência Brasil
A Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara, que atua em Pernambuco, apresentou ontem (9) a retificação do atestado de óbito de mais uma vítima da ditadura militar. A causa da morte de Anatália Melo Alves foi corrigida de suicídio para asfixia por estrangulamento.
Anatália foi morta em janeiro de 1973, na Delegacia de Segurança Social em Recife. Ela era casada com um militante do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), e segundo depoimentos de seu marido, atuava como base de apoio às atividades do partido. Eles foram presos no mesmo dia e, segundo os registros da época, Anatália teria se enforcado com a alça de sua bolsa após ter ateado fogo em sua própria roupa.
“Para mim esse desfecho com a responsabilização do Estado pela morte dela é um passo importante porque encerra uma etapa dessa história” disse Luiz Alves Neto, viúvo de Anatália. A retificação foi entregue durante um evento de comemoração pelo Dia Internacional da Mulher no Palácio do Campo das Princesas, sede do governo pernambucano.
O secretário-geral da comissão, Henrique Mariano, disse que as investigações do grupo permitiram que o laudo e as fotos do corpo fossem encontrados. O material foi enviado a um especialista e um novo laudo sobre a causa da morte de Anatália foi feito. “Essa nova perícia indicou que, pelas características das lesões do pescoço, ela não foi morta for enforcamento mas por estrangulamento”. A alteração da causa da morte foi autorizada pela Justiça.
A Comissão da Verdade de Pernambuco também conseguiu localizar os restos mortais de Anatália. Para o secretário-geral da comissão, a revisão do documento é uma questão de justiça. “O documento original é um documento falacioso. Como a comissão tem como principal objetivo esclarecer as causas e circunstâncias das mortes, nada mais justo que retificá-lo”.
Para o viúvo, além do reconhecimento da responsabilidade do Estado, é importante também que os autores dos crimes sejam identificados. “A gente sabe que poucos deles [responsáveis] estão vivos. O importante não é só responsabilizar o Estado individualmente pelos crimes cometidos. Para mim, essa responsabilização [dos autores] faz parte da história, fica o registro”.
A comissão pernambucana levantou até agora 51 nomes de vítimas da ditadura militar no estado. Segundo a assessoria da comissão, Pernambuco foi o primeiro estado a ter uma comissão da verdade criada por lei pelo Executivo. Anatália foi a segunda vítima a ter a certidão de óbito retificada.
Criada em 1º de junho de 2012, a comissão pernambucana tem até 1º de junho de 2016 para concluir as investigações. O material será entregue ao Ministério Público Federal. No ano passado, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) entregou um relatório final com os nomes de 434 mortos e desaparecidos vítimas da ditadura militar instalada no país. Os dados foram levantados durante dois anos de trabalho.