Mayron Régis,
Machado de Assis e Guimarães Rosa são os maiores escritores brasileiros. Os dois, cada um a seu modo, foram provincianos e cosmopolitas. Quem discordaria da afirmação que Machado de Assis foi o maior analista de costumes da sociedade brasileira no final do século XIX? Os seus leitores talvez nem desconfiassem desse fato. Machado de Assis escreveu sobre o Rio de Janeiro à luz do romance inglês do século XIX.
O que era a Inglaterra no século XIX? O maior império financeiro, por certo, mas um império erigido sobre a escravidão, a pilhagem, a corrupção, as más-condições de trabalho, péssimos salários e a poluição desenfreada. O que era o Brasil nesse mesmo século? Exportador de cana de açúcar e cafe e importador de mão de obra escrava para suas fazendas no interior. Alguns assuntos nunca eram tratados de forma direta. A escravidão e a riqueza obtida através dela eram parte desses assuntos.
Quem discordaria da afirmação que Guimarães Rosa foi o maior naturalista da sociedade brasileira? Os seus leitores talvez nem desconfiassem desse fato. Guimarães Rosa escreveu sobre o sertão brasileiro à luz do romance de cavalaria espanhol dos seculos XV e XVI. O que era a Espanha nesses dois seculos? O centro do mundo por assim dizer. O maior império político, graças a alianças no continente europeu e conquistas de territórios na América. Alguns assuntos eram tratados da forma mais direta possível. A luta contra os infiéis e a luta para levar a religião ou a civilização aos povos indígenas das Américas.
O Vicente de Paula, agricultor do povoado de Carrancas, município de Buriti, Baixo Parnaíba maranhense, parece uma personagem de Dom Quixote, de Miguel de Cervantes. A geografia e a história externas quase que preenchem totalmente sua visão e sua imaginação. Só um pequeno exemplo. Ele acompanhou os senhores Mayron Régis e Edmilson Pinheiro, funcionários do Fórum Carajás, em seus moveres e pareceres pelas Chapadas dos povoados da Cacimba e do Araçá.
Ainda cabe descrever as Chapadas, tais como nas suas origens ou, quem sabe, nas suas originalidades? Mayron pediu ao marido de Dona Antonieta que lhe mostrasse os bacurizeiros de seu terreno. Eles circundaram o terreno e Vicente, a todo instante, elogiava o senhor pelos bacurizeiros que se mantinham lúcidos e frequentes sobre aquela terra.
Em outros tempos, a geografia externa das pequenas propriedades de Buriti dificilmente deixava a desejar. Ela deixou a desejar a partir do momento em que outras geografias passaram a ditar a visão e a imaginação das pessoas que viviam sobre as Chapadas de Buriti. A geografia interna ou a geografia dos interesses de cada um. Quais os interesses que movem o promotor de justiça e o delegado do município de Buriti para que proíbam o Vicente de Paula de roçar o terreno e plantar o seu arroz?
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Imagem: Bacuri na propriedade do Vicente, povoado Carrancas, município de Buriti. (Foto: territorioslivresdobaixoparnaiba.blogspot.com)
Enviada para Combate Racismo Ambiental por Mayron Borges.