No dia 05 de novembro, em Bocaíuva, será julgado o capanga da VM que assassinou geraizeiro em Guaraciama, no ano de 2007

CONFLITO SOCIO-AMBIENTAL PROMOVIDO PELA VM NA COMUNIDADE DE CANABRAVA – MUNICIPIO DE GUARACIAMA NORTE DE MINAS GERAIS – PROVOCA ASSASSINATO DE GERAIZEIRO – O CASO CONTINUA NA IMPUNIDADE – O QUE FAZER?

Em 2007 o comunitário Antonio Joaquim, morador da comunidade de Canabrava, município de Guaraciama, norte de Minas Gerais foi covardemente assassinado por guardas armados da VM. O motivo torpe: para impedir que ele coletasse lenha da imensa monocultura de eucalipto que fora plantado pela VM Florestal.  O caso teve repercussão nacional e internacional e desnudou a farsa dos processos de certificação pelo FSC no Brasil. Poucos meses após o selo foi cancelado. Entretanto, nunca veio a público o relatório realizado por uma equipe enviada pelo FSC, então coordenada pelo seu presidente. Pouco tempo depois um dos integrantes da equipe que veio até o Norte de Minas pediu desligamento por discordar com o tratamento que foi dado à questão.

Depois de tanto tempo, finalmente, amanhã, dia 05 de junho de 2014, no Fórum de Bocaiúva, o assassinato vai ser julgado, a partir das 08 horas da manhã. É importante o acompanhamento pela sociedade desde julgamento. A VM disponibilizou, durante todo este tempo, uma poderosa equipe de advogados para que o caso não ganhasse a repercussão devida. Afinal, assim como nas vastas plantações de eucalipto pela VM, da mesma maneira como em outras plantações da PLANTAR, da Gerdau, Vale do Rio Doce, Florestaminas, as violações dos direitos das comunidades tradicionais continuam. Na impunidade!

Para entende o conflito, veja o relato do caso ocorrido durante o monitoramento pela Rede Alerta contra do Deserto Verde em agosto de 2010.

Agosto de 2010

1)      Quem era Antonio Joaquim? Qual era a sua função na comunidade?

Antonio Joaquim era um agricultor familiar e extrativista, cujos pais e avós eram também nascidos na comunidade de Canabrava, hoje município de Guaraciama (anteriormente pertencente ao município de Bocaiúva). Possuía um pequena propriedade que margeava o córrego Canabrava em uma região de cerrados, onde, anteriormente ao plantio de grandes monoculturas de eucalipto, tinha muita água e tambem áreas úmidas. Segundo sua família, nesta época era um tempo de muita fartura, pois produziam de tudo: milho, feijão (três vezes ao ano) arroz, mandioca, cana, hortaliças diversas. Era uma produção que tinham dificuldade de vender. Segundo dona Judith, sua esposa, era comum trocar ou doar alimentos a uma ou outra família que não tinha conseguido produzir melhor. Além disso, ela comenta, tinha os cerrados onde os gados eram deixados livres para pastar, onde se buscava lenha para cozinhar ou para fazer farinha e rapadura. E onde também tinha muitas frutas nativas., principalmente o pequi e o panan.

Segundo D. Judith, que também é nascida na comunidade, tiveram quatro filhos, um homem e três mulheres. Eles participavam da comunidade, seja nas atividades religiosas ou na associação. Segundo D. Judith, Antonio Joaquim sempre participava das reuniões. Não era de muita conversa mas estava sempre presente nas atividades da comunidade. O seu filho mais velho era seu braço direito. Ia com ele na cidade, levar e vender seus produtos, fazer compras, como também o acompanhava nas atividades festivas da comunidade.

Segundo D. Judith, sua vida agora está muito difícil. Que ela procura dar apoio às filhas (duas já são casadas e que tem dois netos) e ao filho. Mas que ele mudou totalmente. Depois do acontecido elas tiveram a casa revirada, pois queriam acusar que eles usavam drogas. Não encontraram nada. Que hoje o filho mais velho está depressivo e bebendo muito (bebidas alcoólicas). Que ele está quase o tempo todo revoltado e que não trabalha mais em casa ou na comunidade. Que ele sempre procura trabalhar fora, em outros municípios. Que ele diz sempre que não preocupa com a vida dele. E que bebe muito, e que anda de moto sempre em alta velocidade. E que ela tem uma preocupação muito grande com ele, pois com a revolta ela não sabe o que pode acontecer se o seu filho encontrar de frente com os assassinos do marido que estão livres. Que ela não entende porque não aconteceu nada com os assassinos.

2)      Quem são as pessoas acusadas (João Pereira da Silva, João Cardoso da Silva,   Reginaldo Soares, Claudiney Pereira da Silva)?

Os quatro eram seguranças armados da VM. A informação que temos era que trabalhavam para uma empresa de segurança com sede em Belo Horizonte. João Pereira da Silva era também conhecido como João Cachoeira; João Cardoso da Silva era também conhecido como João de Carmina cujos familiares eram da comunidade de Canabrava; e Claudiney Pereira da Silva era mais chamado de Claudiney.  Destes, apenas o João Pereira da Silva tinha “Porte de Arma” (documento que autoriza um cidadão a andar armado). Segundo a família, eles andavam de moto e estavam sempre vigiando as pessoas que passavam pela estradas internas e cavaleiras. Paravam as pessoas, perguntavam o que estavam fazendo, para onde iam. Se as pessoas passavam com carroça ou carro de boi paravam e olhavam o que estavam carregando. Se tivesse alguma madeira originada de eucalipto era apreendida na hora.

A D. Judith disse que era ela quem sempre transportava um carroção de bois, pois ela buscava lenha em uma propriedade vizinha, de seus parentes.

No dia que culminou com o assassinato de Antonio Joaquim, ele tinha ido buscar uma madeira no carroção. Que ela estava em casa com o seu filho mais velho e as duas filhas mais novas. Quando receberam a noticia, já no final da tarde, que os seguranças tinham prendido o seu marido. Então ela foi com as filhas e com o filho atrás dele. Quando o encontraram ele estava com as mãos e braços amarrados, preso na carroça. Que o filho mais velho o desamarrou enquanto ela conversa com os guardas. Que em seguida o filho e o marido foram descendo pela estrada e que ela ficou negociando com os guardas para que nada acontecesse. Que em seguida ela desceu pela estrada seguida de suas filhas. Quando estavam em um descampado em uma encruzilhada, de repente os guardas armados chegaram todos juntos, de moto, rodeando ela e as duas filhas e atirando para cima. Que eles tentavam se aproximar de suas filhas e que ela entrava na frente as protegendo. Quando eles desceram da moto, atirando para cima e pegaram a filha mais nova – Eudiléia – pelo pescoço, com a arma em direção à sua boca ameaçando atirar. Que ao ouvir os tiros, o marido e o filho mais velho voltaram de imediato. Que Antonio Joaquim ao chegar viu sua filha ser empurrada ao chão. Então ele  protegeu a filha a segurando pelos braços. Ele estava agachado com sua filha quando ela ouviu o barulho do disparo da arma de Claudiney, quase que a “queima roupa”. Que ele caiu na hora já agonizando. Quando os guardas viram o Antonio Joaquim agonizando eles fugiram de imediato. Que na fuga um dos guardas a atropelou com a moto, momento em que ela caiu no chão e que a moto também. E que ele saiu correndo a pé em direção aos outros guardas que estavam fugindo.

Segundo D. Judith, o autor do crime foi o Claudiney. Mas que os advogados da VM agora estão tentando provar que a arma que matou Antonio Joaquim estava na posse de João Cachoeira, que era o único que tinha o documento Porte de Arma.

3)   Quais foram as negociações com a  V&M do Brasil sobre o caso de Antonio Joaquim ou sobre os direitos da terra pelas comunidades?

Antes do assassinato, a comunidade de Canabrava estava se posicionando de forma firme na resistência contra as monoculturas da VM em função da degradação ambiental, por não terem mais empregos, e por estarem sempre impedidos de coletar lenha. Lideranças já tinham participado em diversas reuniões, inclusive em uma audiência na Assembléia Legislativa de Minas Gerais onde apresentaram publicamente suas denuncias pelo encurralamento.

Depois do assassinato, a Rede Alerta contra do Deserto Verde realizou um encontro na comunidade, em novembro de 2007. (veja o Relatório Canabrava Encontro Atingidos Monocultura Nov 2007). Neste documento saíram diversas propostas, uma delas a de que a VM deveria deixar 1 km ao redor das propriedades dos agricultores familiares sem plantação de eucalipto, para o cerrado regenerar. Estas propostas foram encaminhadas ao poder publico e aos auditores da FSC.

4)      Como está o processo criminal e de indenização?

Tivemos a informação que o advogado da família está acompanhando o processo criminal, mas não é parte do processo. Não tiramos a dúvida ainda porque não conseguimos falar com o advogado na conversa que tivemos ontem. Mas vamos conversar com ele por telefone. Em seguida te enviamos esta informação.

 A informação que a família nos passou é que ele está encaminhando um processo de indenização, mas que ele diz que é muito demorado.

Como está a família de Antonio Joaquim? O que eles pensam sobre o assunto?

Na reunião que fizemos ontem com a família, estavam presentes D. Judith e suas três filhas: Eudislene, a filha mais velha e casada; Eudileusa, a filha do meio e também casada, e Eudileia, a filha mais nova e solteira.

A família está muito incomodada com o fato de até hoje os assassinos estarem soltos na cidade.  Elas gostariam que a justiça agisse com mais rapidez. Elas falaram que quando são intimadas pela justiça para dar algum depoimento, elas vão e que são quatro os advogados da VM ou da firma de segurança (elas não sabem precisar quem são estes advogados da defesa), alguns deles que vem de Belo Horizonte especificamente para isso.

Como está o processo de criminalização da comunidade? O que a VM está acionando para se proteger?

Na nossa opinião, nos parece que a empresa atualizou sua estratégia com relação à comunidade:

– tem realizado um intenso trabalho social e político: construiu uma igreja na comunidade, substituindo uma antiga igreja que estava no alto de um morro e que era local de peregrinação. Infelizmente houve aquiescência de um padre que atende a comunidade. Vem sempre oferecendo projetos para a comunidade, distribuição de mudas de eucalipto, construção de pequenas barraginhas para conter a água da chuva;

– a empresa continua mantendo a comunidade sob pressão para que não peguem lenha. Mas a estratégia atual é de utilizar a Policia Ambiental / Policia Florestal. Não são mais os guardas que fazem este trabalho sujo.  Assim, com muita freqüência a PM circula pela comunidade e destrói os pequenos fornos que são construídos para produção de carvão utilizando os restos de madeira das áreas de plantação;

– Pela informação que tivemos, a empresa contratou outros guardas porem eles não andam, aparentemente, armados. Eles andam apenas de cassetetes.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Carlos Alberto Dayrell.

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