Por Herbert Ekwe-Ekwe*, republicado em O Povo
Em texto primoroso de 2008, a bióloga e ativista ambiental queniana Wangari Maathai, primeira africana a receber o Prêmio Nobel da Paz, em 2004, reflete sobre o pouco conhecido papel dos africanos nas guerras mundiais: “Na minha família havia um membro ausente, cuja existência desconheci até atingir a idade adulta. Durante a Primeira Guerra, africanos das colônias foram recrutados para lutar e, no Quênia, os pais com filhos em idade para combater deviam apresentá-los às autoridades. Meus avós tinham um filho, Thumbi, de 20 anos, e não queriam que ele fosse para a guerra. Em desespero, minha avó o aconselhou a esconder-se na densa vegetação que margeia o rio Tucha. Mas Thumbi foi capturado pelos britânicos e tornou-se um dos mais de cem mil homens da etnia Kikuyus que morreram em combate, de fome ou de doença. Minha avó chorou a perda do filho pelo resto de sua vida”.
Somente nessa guerra, a África perdeu cerca de um milhão de soldados em frentes de batalha a leste e oeste do continente e na própria Europa, lutando tanto pela Inglaterra, França, Itália, Bélgica e seus aliados, como pelos seus oponentes Alemanha e Impérios Austro-Húngaro e Otomano. As duas guerras mundiais foram confrontos nos quais os africanos se viram compulsados a atuar sem que os interesses de qualquer dos lados lhes dissessem respeito. Os dois principais protagonistas, Grã-Bretanha e Alemanha, eram os grandes usurpadores do território africano desde 1885, responsáveis por saques de recursos naturais e massacres de grandes parcelas dos povos autóctones, o que produzia uma cruel contradição: soldados naturais dos territórios ocupados combatiam ao mesmo tempo a favor e contra opressores de sua própria gente. (mais…)