Num mesmo dia, o Supremo Tribunal Federal toma decisões… curiosas. Numa, concede Habeas Corpus para o integrante de uma quadrilha que, entre outras acusações, rouba(va?) madeira de Terra Indígena em Juína, Mato Grosso. Noutra, mantém decisão do Tribunal de Justiça de Minas contra a Defensoria Pública, que pedia a extinção de um processo criminal contra um homem acusado de roubar (e devolver!) um galo e uma galinha de um vizinho, avaliados em R$ 40,00. Haja Brasil! Haja (in)Justiça!
Tania Pacheco – Combate Racismo Ambiental
Nas mensagens da madrugada, vejo, de cara, notícia do portal Cenário MT: “Acusado de integrar grupo que extraía madeira de terra indígena responderá a processo em liberdade”(1). Diz ela que os ministros da Segunda Turma do STF concluíram ontem, 8, o julgamento do Habeas Corpus 110011, “em favor de A.R.B., e permitiram que ele responda em liberdade a ação penal em curso na 5ª Vara da Justiça Federal de Mato Grosso”.
Segundo a notícia, A.R.B. [que suponho então deva ser menor de idade] é acusado de integrar uma organização criminosa que atua em Juína (MT), composta por madeireiros legais e ilegais, investigada por crimes contra o meio ambiente, posse irregular de arma de fogo, receptação e formação de quadrilha. Diz ainda o portal que: “em sessão realizada em maio do ano passado, o relator do HC, ministro Gilmar Mendes, apresentou voto no sentido de conceder o HC, por considerar que o juízo de primeiro grau não indicou elementos concretos aptos a justificar a prisão cautelar”.
Como continuo com o defeito da curiosidade associado ao da indignação, decido confirmar tudo no saite do próprio STF. E aí vejo que na verdade a decisão não é de “maio do ano passado”, mas de 25 de agosto de 2011, o que nos mostra há quanto tempo a questão vem sendo ‘enrolada’, só no Supremo! Também descubro que A.R.B. não só não é menor idade [o uso das iniciais deve ter sido uma gentileza, pois], como chama-se Anderson Ridier Banck. As informações complementares abaixo integram a decisão de Gilmar Mendes:
“Segundo os autos, trata-se de uma organização criminosa composta por madeireiros, proprietários de empresas madeireiras receptadoras e proprietários rurais titulares de planos de manejos florestais, os quais, mediante o aliciamento de indígenas, adentravam a Terra Indígena Serra Morena para realizar atividades ilegais de extração, transporte e comércio de produtos florestais, tudo acompanhado de fraudes nos sistemas da SEMA (SISFLORA), com o fim de obstaculizar o controle e fiscalização ambiental e, ao mesmo tempo, conferir aparência de legalidade às madeiras legalmente extraídas, estocadas e comercializadas pelas empresas envolvidas.
O ora paciente (Anderson Ridier Banck), na descrição do MPF, integra o 2º grupo, composto por proprietários de empresas madeireiras receptadoras das toras retiradas da TI Serra Morena, com função de adquirir, manter em estoque, beneficiar e vender os produtos florestais extraídos ilegalmente da mencionada terra indígena”.(2)
O fato de não ir direto a campo, mas fazer parte do que foi chamado de “2º grupo”, isto é [repito propositadamente], “proprietários de empresas madeireiras receptadoras das toras retiradas da TI Serra Morena, com função de adquirir, manter em estoque, beneficiar e vender os produtos florestais extraídos ilegalmente da mencionada terra indígena”, justificou a concessão do HC por Gilmar Mendes, em agosto de 2011.
E ontem, quase três anos depois, o Cenário MT nos informa que “o ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o relator (…), pois é o próprio MPF quem o aponta como ‘laranja’ de um dos principais líderes do grupo, cabendo a ele exercer papel secundário relativo à falsificação de notas e guias. Os demais ministros também acompanharam o voto do relator”. Liberdade, pois, para A.R.B.!
A segunda sentença:
Na busca de informações sobre Anderson Ridier Banck e suas aventuras no STF, encontro outra notícia do Supremo, divulgada pela Agência Brasil. Considero que esta prescinde de qualquer comentário adicional, e me limito a publicá-la na íntegra:
Ministro do STF nega liminar para acusado de roubar galinha
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), rejeitou um pedido de liminar para arquivar ação penal contra um homem acusado de roubar um galo e uma galinha, avaliados em R$ 40. Segundo o ministro, o caso deve ser resolvido no mérito do habeas corpus, após manifestação do Ministério Público.
O caso chegou ao STF após percorrer todas as instâncias do Judiciário. Segundo a denúncia, Afanásio [!] Maximiniano Guimarães tentou roubar uma galinha e um galo que estavam no galinheiro da vítima, Raimundo das Graças Miranda.
Depois o ocorrido, a Defensoria Pública pediu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que o processo fosse declarado extinto, uma vez que o acusado devolveu os animais. Apesar do pedido de aplicação do princípio da insignificância para encerrar o processo, a Justiça de Minas e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), última instância da Justiça Federal, rejeitaram pedido para trancar a ação penal.
Ao analisar o caso no STF, o ministro Luiz Fux decidiu aguardar o julgamento do mérito do pedido para decidir a questão definitivamente. “A causa de pedir da medida liminar se confunde com o mérito da impetração, porquanto ambos referem-se à aplicabilidade, ou não, do princípio da insignificância no caso sub examine. Destarte, é recomendável que seja, desde logo, colhida a manifestação do Ministério Público Federal”, decidiu Fux.
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(1) Ver AQUI.
(2) Ver ACOLÁ.