Por Elaíze Farias, em seu blog
Além da demora no atendimento, situação que pode agravar a condição de saúde, pacientes indígenas (e seus acompanhantes) vindos da Terra Indígena Vale do Javari também sofrem com a discriminação nos hospitais de Manaus (AM). A denúncia é de Clóvis Rufino, liderança da etnia marubo, em depoimento divulgado nesta quinta-feira (25) por email.
Segundo Rufino, os profissionais que atendem nas unidades de saúde da capital amazonense não respeitam os costumes e a diferença dos povos indígenas, nem levam em consideração as suas dietas alimentares. Ele conta que esta situação acontece “há séculos” e isto é fruto da “falta de capacitação dos profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS) para lidar com as diferenças de atenção nos hospitais”.
Conforme o indígena, a Casa de Apoio ao Indígena (Casai) de Manaus deixou de ser apenas uma casa de recuperação de pacientes para ser transformada em um “mini-hospital”, diante da incapacidade do Sistema Único de Saúde (SUS) de realizar o atendimento.
Este quadro foi apresentado em audiência da qual Clóvis Rufino participou na sede do Ministério Público Federal do Amazonas neste mês, representando uma população de cinco mil pessoas da Terra Indígena Vale do Javari, localizada no oeste do Estado do Amazonas, fronteira com Peru – mayoruna, matis, maruno, kulina e kanamari. Além destes povos, a TI Vale do Javari concentra pelo menos sete povos indígenas que vivem de forma isolada.
As precariedade no atendimento não se restringem a Manaus. Segundo Clóvis, nos hospitais do Alto Solimões (Tabatinga, Benjamin Constant e Atalaia do Norte) os indígenas possuem muitas dificuldades para receber atenção de saúde em média e alta complexidade. E o SUS “joga a responsabilidade” para as Casai (Casa de Apoio ao Indígena), que têm tido dificuldade para atuar pois, segundo Rufino, não vêm recebendo recursos do Ministério da Saúde.
Falta de estrutura
“Nos hospitais de nossa referência não têm médicos suficientes e faltam médicos especialistas. A população depende muitas das vezes do hospital e clínicas particulares de Letícia (Colômbia), mas somente aqueles que têm condições financeiras. Os índios são destinados ao hospital de Benjamim Constant, Tabatinga ou Manaus. Finda ficando na Casai de Manaus, à mercê da própria sorte. Com a demora de atendimento, agrava seu quadro de saúde e muitas vezes indo a óbito”, disse.
Clóvis Marubo disse que a população do Vale do Javari pediu ao MPF que este exigisse do SUS a estruturação dos hospitais de referências e mais investimento em recursos humanos de diversas especialidades.
Ele citou a Lei n. 9.836/1999, cujo artigo 19-G 3 e parágrafo II diz que “O SUS servirá de retaguarda e referência ao Subsistema de Atenção a Saúde Indígena, devendo, para isso, ocorrer adaptações na estrutura e organização do SUS nas regiões onde residem as populações indígenas, para propiciar essa integração e o atendimento necessário em todos os níveis, sem discriminação, qualificando seus profissionais sobre atendimento diferenciado as populações indígenas, de forma humanizada, com equidade respeitando as culturas das populações indígenas”.
Rufino disse que o MPF deve também exigir a efetivação do termo de compromisso firmado por meio de Contrato Organizativo de Ação Pública da Saúde (COAP), que estabelece compromissos dos mesmos para cumprimento das aplicações dos recursos na saúde indígena.
“Exigimos uma assistência humanizada, de excelência e de qualidade no serviço prestado e agilidade nos processos administrativos para minimizar as questões epidemiológicas. Pedimos que o MPF exija a criação do Sistema de Regulação Indígena (SISREGI) para atendimento aos pacientes indígenas em média e alta complexidade, objetivando a redução de tempo”, disse.
A população indígena também quer a desburocratização de aquisição de insumos para atendimento às populações. A desburocratização agilizaria a construção dos postos de saúde, aquisição de medicamento, aquisição de transporte pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).