Paula Sarapu, Estado de Minas
Quatro professores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) entraram com recurso pedindo nulidade da sindicância feita pela Faculdade de Direito que determinou a instauração de processo administrativo disciplinar contra 198 alunos por participação nos trotes do dia 15 de março deste ano. Uma das autoras do recurso, Regina Helena Alves da Silva, professora da Faculdade de História da UFMG, avalia que a Faculdade de Direito não teve “pulso forte” e que deveria ter indiciado parte dos alunos por racismo e apologia ao nazismo.
Na época do trote, duas fotos postadas em uma rede social revoltaram a comunidade acadêmica e internautas. Numa delas, uma caloura com o corpo tingido de preto aparece com as mãos atadas e carrega uma placa com os dizeres “caloura Chica da Silva”, em referência à escrava, que viveu em Diamantina no período colonial. Em outra imagem, um novato aparece amarrado a uma pilastra e três colegas – um deles com um bigode parecido com o do ditador Adolf Hitler – erguem o braço direito em gesto semelhante à saudação nazista.
De acordo com a decisão da Faculdade de Direito, publicada na Portaria 059/2013, no dia 3 de julho, 68 estudantes do 2º período do curso vão responder a processo por terem aplicado o trote nos calouros. Trinta e dois membros da Diretoria do Centro Acadêmico Afonso Pena são acusados de distribuir gratuitamente e vender bebidas alcoólicas na unidade de ensino e outros 98 alunos acabaram indiciados por terem contribuído financeiramente e participado do trote. O processo administrativo é consequência de uma sindicância realizada por três professores da faculdade.
Na avaliação da professora Regina Helena Alves da Silva, porém, não está claro se atitudes que ela considera racistas ou nazistas serão analisadas no processo administrativo. Segundo ela, muitos professores da UFMG cobram posição mais dura. “Ficamos estarrecidos com o resultado da sindicância porque a direção excluiu dois crimes que deveriam ser investigados. Para completar, ainda consideram que foi só uma brincadeira de mau gosto”, afirma. “Se a aluna pintada pensa desse jeito, é um problema dela, mas a imagem que isso passa e tudo o que significa é inadmissível. Se a faculdade assume que são práticas incompatíveis, tem que investigar que práticas são essas e puni-las”, defende.
De acordo com Regina Helena, mais de 50 professores estão mobilizados em torno do tema. Eles prometem enviar documentos à Secretaria Nacional de Direitos Humanos e à Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e querem debater o assunto com os alunos da UFMG. De acordo com a professora da Faculdade de História, outro pedido diz respeito à formação da comissão. “Queremos que ela seja formada por pessoas de fora da Faculdade de Direito”, diz. O recurso foi assinado também pela professora do Departamento de Ciência Política Marlise Matos, pelo professor da Escola de Belas-Artes Leonardo Castriota e pela professora da Faculdade de Psicologia Cláudia Mayorga.
Comportamento A assessoria de imprensa da UFMG reafirmou que a sindicância concluiu que houve transgressão às normas internas e que houve comportamento incompatível com a dignidade acadêmica. O evento, batizado de “recepção de calouros”, foi autorizado pela direção da Faculdade de Direito, mas a diretora da unidade, professora Amanda Flávio de Oliveira, considerou que os estudantes descumpriram determinações.
Ainda de acordo com a assessoria da UFMG, o racismo é crime cuja apuração é de competência da Polícia Civil e do Ministério Público e não consta no regimento interno da instituição. No entanto, segundo a universidade, posturas racistas não serão desprezadas no momento em que o comportamento de cada aluno for avaliado nos processos disciplinares. Todos os estudantes processados ainda serão ouvidos e a comissão tem 60 dias para concluir a apuração. A punição varia entre advertência, suspensão e punição.
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.