MAB – Recentemente o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) foi indicado pela organização norte americana Grassroots International para receber o prêmio anual do Centro de Justiça e Direitos Humanos Robert Kennedy.
O prêmio é destinado à organizações e defensores de direitos humanos e visa apoiar as diversas lutas por direitos humanos. Além da visibilidade internacional, a iniciativa do Centro inclui o apoio jurídico e legal aos contemplados. Para o MAB este prêmio poderá reforçar a luta histórica que faz na defesa dos direitos humanos e seus defensores.
O MAB entrevistou o diretor executivo de Grassroots Internacional, Nikhil Aziz, que falou do contexto geral da energia no atual cenário do capitalismo, da importância da organização dos atingidos e do significado Prêmio do Centro de Justiça e Direitos Humanos Robert Kennedy.
MAB: A geração de energia tem uma importância muito grande no atual contexto mundial, principalmente a energia hidrelétrica, considerada uma energia limpa. No entanto os movimentos sociais e os ambientalistas fazem uma crítica bastante grande sobre este modelo, que destrói o meio ambiente e não trata das questões sociais. Na sua avaliação, existe um meio termo entre geração de energia e as questões socioambientais? Qual seria?
Nikhil Aziz: Enquanto que a produção de energia é vital para a economia global e para as pessoas em geral, a eletricidade gerada através de hidroelétricas não é a melhor solução. Grandes repressas tem sido vistas por governos como Brasil, Índia, China, e até mesmo pequenos países, como uma parte integral de suas estratégias de produção de energia. Porém nós sabemos que grandes represas beneficiam grandes corporações e não a maioria da população. Além disso, com elas perdemos grandes porções de terra incluindo florestas e terra para a produção de alimentos. Elas geram a interrupção dos rios e afetam as populações rio abaixo, geram a expulsão de milhões de pessoas em todo o mundo, especialmente povos indígenas e famílias camponesas. Apenas na Índia estima-se que desde 1947 mais de 50 milhões de pessoas foram expulsas de suas terras e casas. Elas também produzem metano no lago do reservatório, que é um gás que produz o efeito estufa como o carbono. No final, a vida das represas não é muito longa considerando o alto custo financeiro, humano e ambiental. Existem outras formas para produzir energia, incluindo hidrelétricas que são menos caras, menos centralizadas, e que causam menos danos ao meio ambiente e aos seres humanos. Nós precisamos mudar esta mentalidade que grandes projetos são melhores para uma visão que valorize pequenas ações que, quando multiplicadas, podem conseguir resultados similares ou até mesmo melhores.
MAB: Documentos oficiais do próprio governo brasileiro apontam que existe um padrão de violação dos direitos humanos na construção de barragens no Brasil. A Grassroots tem acompanhado casos de violação dos direitos humanos em outros países, em especial na construção de barragens?
NA: Sim, nós temos acompanhado movimentos sociais em outras regiões que estão lutando contra as violações de direitos, similares ao que os membros do MAB sofrem. Por exemplo, na Índia e Paquistão, em Honduras e Guatemala, e em partes da África nós temos apoiado os movimentos sociais e organizações de povos indígenas e camponeses que se opõem a grandes represas e mudanças do leito de rios e propondo soluções alternativas que causam menos impactos ambientais e humanos.
MAB: No seu ponto de vista, qual a contribuição que os movimentos sociais brasileiros podem dar para a organização de base internacional em um contexto de crise do capitalismo?
NA: Os movimentos sociais brasileiros como o MAB e o MST tem sido vozes importantes no mundo através das suas análises criticas do capitalismo, de propostas que são construídas em processos democráticos e que são baseadas nos direitos humanos e na proteção do meio ambiente. O MAB e o MST tem sido fontes de inspiração para outros movimentos sociais não apenas na América Latina mas também na África e Ásia, e até mesmo nos Estados Unidos. Se o MAB continua firme na luta no Brasil, mesmo diante da crescente criminalização da luta social, vocês do MAB continuarão a servir como exemplo para outras pessoas e organizações. Isto é uma contribuição vital que precisamos no cenário atual de crise do capitalismo neoliberal. Se os movimentos sociais no Brasil se enfraquecem, outros movimentos sociais no mundo também serão enfraquecidos.
MAB: Qual é a percepção que a Grassroots tem da organização dos atingidos por barragens no Brasil?
NA: A Grassroots Internacional saúda a coragem e a determinação dos atingidos por represas no Brasil, dos povos indígenas, quilombolas e camponeses, incluindo as mulheres. Nós sabemos os riscos e os desafios que vocês encontram e enfrentam e todos nós somos inspirados no fato que vocês continuem lutando por seus direitos e por uma forma alternativa de desenvolvimento que seja justa e sustentável.
MAB: Para a edição deste ano do prêmio da FRK, a Grassroots indicou o Movimento dos Atingidos por Barragens, do Brasil. Qual a importância da indicação de um movimento social latino americano para receber o prêmio?
NA: O prêmio de direitos humanos da Fundação Robert Kennedy e outros reconhecimentos são importantes por que mais do que qualquer prêmio financeiro, eles representam o reconhecimento e amplificam a luta e as soluções que os movimentos como o MAB promovem. Estes prêmios também de alguma maneira oferecem algum segurança a mais, já que os governos terão mais cautela na criminalização de membros e dos movimentos sociais que são reconhecidos internacionalmente e que tem aliados em outros países e quem poderão mobilizar outros apoios e solidaridade que os movimentos necessitam.
MAB: No seu ponto de vista, qual o simbolismo deste prêmio para a comunidade internacional dos defensores dos direitos humanos?
Como eu mencionei acima, isto é muito importante. Se os defensores de direitos humanos, como o MAB, não são conhecidos e as suas contribuições não são visíveis, a repressão se torna mais aguda. Se eles são conhecidos por um grupo maior de pessoas nos seus países como também fora das fronteiras nacionais, o poder da solidariedade e o apoio podem ter um impacto em proteger vidas e os direitos humanos.