Marcelo Brandão, Repórter da Agência Brasil
Brasília – A Comissão da Verdade e Memória da Universidade de Brasília (UnB) abriu suas portas para o ex-reitor da instituição, Antonio Ibañez Ruiz, e para o jornalista e ex-aluno Romário Schettino. Na primeira audiência pública da comissão, ambos tiveram a oportunidade de contar suas experiências durante o período da ditadura militar.
Ruiz, em seu período como professor da Unb, nos anos 60 a 80, dividiu com estudantes e membros da comissão alguns dos momentos de repressão ao corpo docente. “As perseguições eram veladas, de tal forma que criavam condições para que você não pudesse sair, não pudesse produzir, dar aulas”. Sua participação marcou também o lançamento do livro Em Tempos de Pensamento Inquieto, com relatos de sua vida na universidade.
Schettino, que estudou na Unb entre os anos de 1972 e 1979, disse que foi torturado: “Fiquei preso mais de 25 dias sob tortura. Fui recebido com um tapa no ouvido que me deixou zonzo por uns segundos, e interrogado por pessoas que eu nunca soube quem eram, porque eles não tiraram o meu capuz”. Após ser liberado pelos militares, Schettino não conseguiu retomar imediatamente sua rotina acadêmica e profissional, exilando-se na Europa por dois anos, antes de voltar para o Brasil. “Abandonei a universidade, abandonei meu emprego. Sofri uma interrupção brutal na minha vida por conta de uma arbitrariedade, de uma decisão unilateral do Exército brasileiro”.
Para o jornalista, é importante manter viva a memória do período da ditadura militar no Brasil. “Quando a gente se dispõe a contar essa história, e revivê-la, é porque ela não pode ser esquecida. Temos de fazer com que as pessoas conheçam esses depoimentos e reflitam sobre ele, sobre o que nós estamos fazendo aqui hoje e o que nós queremos para o Brasil amanhã”.
Ruiz também demonstrou seu apoio ao trabalho da comissão e considera importante a participação das testemunhas dos anos de repressão. “Tenho o maior respeito por esse trabalho. Acho que tem que ser apoiado por todos nós, principalmente por todos aqueles que participaram de alguma forma e sofreram com a repressão, para ajudar a montar a nossa história”.
Cristiano Paixão, professor da instituição e coordenador de relações institucionais da Comissão, reforçou a importância da parceria com a Comissão Nacional da Verdade, do Congresso Nacional. Para ele, a troca de informações ajuda na investigação de crimes envolvendo estudantes e até mesmo o fundador da UnB, Anísio Teixeira, que teria morrido após cair no fosso do elevador, de acordo com a versão oficial.
“O quadro é de uma grande colaboração entre a Comissão da UnB e a Comissão Nacional da Verdade. Na nossa sessão de instalação, tivemos a denúncia de que o fundador da UnB, Anísio Teixeira, teria sido uma vítima da ditadura. Isso faz parte do grupo de mortos e desaparecidos da Comissão Nacional. Estamos trabalhando em sintonia para investigar o caso Anísio e também o desaparecimento de três estudantes [Honestino Guimarães, Ieda Santos Delgado e Paulo de Tarso Celestino, desaparecidos no período da ditadura militar].”.
A Comissão da Verdade e Memória da UnB continuará ouvindo depoimentos e deve receber, até junho, o ex-reitor e atual senador Cristovam Buarque, dentre outras testemunhas.
Edição: José Romildo
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Enviada por José Carlos para Combate Racismo Ambiental.