Violência leva moradores de rua a migrar para áreas mais nobres de BH em busca de segurança e evidencia multiplicação de sem-teto. PBH admite que estrutura de acolhimento está “no limite”
EM – O ex-pedreiro Milton Natividade, de 40 anos, passou a maioria das noites dos últimos quatro anos na Região Hospitalar de Belo Horizonte. Em uma dessas madrugadas, no início de 2013, foi acordado com um chute na costela. “Arreda para lá, coroa”, ele diz ter ouvido de um desconhecido. O morador de rua conseguiu se afastar da calçada, mesmo sob efeito da cachaça que havia bebido antes de dormir. Em seguida, afirma ter visto o homem jogar álcool no corpo do colega que dormia ao lado dele no passeio. “O cara riscou um fósforo e meu amigo virou uma chama viva. Morreu”, conta. Milton deixou a região hospitalar depois do episódio. Desde então, passa a maior parte das noites com mais cinco sem-teto em frente a um loja na Avenida Cristóvão Colombo, na Savassi. A mudança dele não é caso isolado.
Perto dali, no jardim da Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa, sete moradores de rua encontraram espaço para dormir entre folhas de papelão e cobertores. Eles contam que só saem durante o dia para não atrapalhar o funcionamento da biblioteca. O grupo consegue dinheiro para comida, cigarros, álcool e crack lavando carros durante o dia. O mais velho deles, Rodrigo de Souza, de 32 anos, veio de Santa Luzia. Ele conta que, a exemplo do ex-pedreiro que se instalou na Savassi, resolveu mudar de lugar por causa de violência. Rodrigo afirma também ter testemunhado a morte de um morador de rua. “Foi terrível. Jogaram gasolina no cara e depois botaram fogo. Por isso vim para cá”, disse. Os relatos coincidem com estatísticas do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação de Rua e Catadores de Material Reciclável (CNDDH). Segundo relatório da instituição, 54 moradores de rua foram assassinados em Belo Horizonte entre fevereiro de 2011 e maio de 2012.
Insegurança
A migração de sem-teto para pontos mais movimentados da cidade cria sensação de insegurança e gera reação entre moradores e comerciantes dessas regiões. O comerciante Marcos Vasconcelos, de 45 anos, conta que um dupla de moradores de rua que se instalou nas proximidades da Rua Aimorés, em Lourdes, foi vista tentando arrombar sua loja. “Sei que é um problema social, mas não pode haver crimes”, reclama. Dono de um restaurante na região, Ricardo Rodrigues, de 55 anos, disse que o número de pedintes nas mesas aumentou. “A solução que encontrei foi oferecer comida aos mendigos. Não adianta bater de frente, como alguns fazem”, afirma. Moradora da Savassi, a advogada Joana Garcia, de 34, disse que passou a evitar sair à noite com o filho por causa de sete moradores de rua que se instalaram ao lado de seu prédio. “Já chamamos a PBH para levar essas pessoas para um albergue, mas ninguém veio”, afirmou.