por Aty Guasu, Domingo, 12 de Agosto de 2012
Informativo/carta da comunidade Guarani e Kaiowá do território Arroio Kora-Paranhos-MS que foram atacados no dia 10 de agosto de 2012 pelos pistoleiros das fazendas
Objetivo deste informativo é destacar táticas de cercar e atacar as nossas manifestações pacíficas Guarani e Kaiowá pelos pistoleiros das fazendas. No dia 10 de agosto de 2012, à 5h00 começamos a nossa manifestação pacífica, logo depois, por volta da 08h00min, quatros (4) caminhonetes trouxeram aproximadamente 50 homens mão armados e descarregaram 500 metros de nossa manifestação que estava ocorrendo nas margens de dois córregos onde estavam 120 crianças pequenas menos de 10 anos, 80 mulheres menos de 40 anos de idades, 30 idosas e 30 idosos com mais de 60 anos de idade, 150 homens mais de 40 anos de idade, além de 4 rezadores com 70 anos de idade e 3 rezadoras com idades de 80 anos que estavam coordenando o ritual religioso jeroky.
Ao longo da margem direita e esquerda dos dois córregos há restantes de mata ciliar. Esses homens mão armados se dividiram em três grupos e começaram nos cercar e se aproximar de nossa manifestação, mirando as armas de fogos em nossas direções, ficamos nas miras de 50 espingardas (calibre 12), eles vieram lentamente se aproximando se abaixando, de 200 metros, ao mesmo tempo, eles começaram atirar em nós, só ouvimos tiros, gritaria e fumaças em nossas direções e chuva de balas, diante disso, juntos aos tiros ouvimos choro das crianças e mulheres e corremos em direções da mata que tem ao longo dos dois córregos, antes da mata tem um brejo feio e lama em que ficávamos atolados no barro e caíamos e deitamos das balas. À medida que saímos da lama fomos arrastados até chegar à mata, enquanto isso, os tiros não paravam nem um minutos, da 08h00 até 10h00, aproximadamente duas horas consecutivas atiraram em nossas direções, nós já estávamos escondidos atrás das árvores e outros deitados nos córregos e na lamas.
Ouvimos os homens-pistoleiros riam, riam muito em nós e falavam gritando: “vocês índios merdas! já morreram todos aí”. “Hoje, nenhum você índio vai sair vivo daqui”. Um momento depois, bem perto dali, vimos carros chegando e várias caixas de balas descarregando das caminhonetes. Todos retornaram perto das caminhonetes para recarregar as armas deles. Logo depois, recomeçaram os tiros em nossas direções, enquanto e isso, as crianças já estavam com fome, não conseguiam mais chorar, nós mulheres e homens já pensávamos em morrer mesmos, falávamos um para outros (as), hoje vamos morrer todos juntos.
Quando recomeçaram os tiros, a partir da 14h00, já tínhamos quase certeza de que dali não sairia nenhum com a vida. Todas as vezes que acabavam as balas das espingardas retornavam aos carros para recarregar, assim consecutivamente. Única proteção que nos protegeu dos tiros é a restante da mata nativa, brejo e dois córregos. Por volta da 16h00min, os atiradores pararam os tiros e começaram se dispersarem em direções dos 4 caminhonetes, muito tempo depois, os restantes de nossos parentes que se encontravam distante da mata, gritaram que a viatura da polícia tem aproximado que estava chegando ao local. Frente a essa gritaria e aproximação da viatura da polícia ao local, a maioria dos pistoleiros se embarcaram em 4 caminhonetes e foram levados em direções da cidade Paranhos. Somente com a chegada da viatura polícia ao local, pararam de atirar em nossas direções. Se contássemos os números dos tiros lançados sobre nós, somariam mais de mil (1000) tiros.
Quando as viaturas da Polícia Federal, Força Nacional e Funai chegaram ao local, saímos todos da mata, do brejo e dos dois córregos, levamos os agentes federais diretos a sede de uma casa dos pistoleiros das fazendas, e encontramos ainda um homem que estava atirando sobre nós, reconhecemos, indicamos e apresentamos ao agentes da polícia, mas não o prendeu não. A polícia só falou que vai investigar ele. Contamos às polícias que um dos nossos parentes idoso (Juam) e deficiente foi morto e corpo levado pelos pistoleiros. Diante disso, alguns agentes da Força Nacional falaram para as mulheres assim: “vocês também estão invadindo as fazendas né? por isso, tudo isso de ruim aconteceram com vocês”, “vocês índios estão errados mesmo ao fazer isso”, ao ouvir isso, as mulheres começaram a discordar com esses agentes da Força Nacional, ocorreu bate-boca contra esses agentes em nossa língua indígena.
Já à noite, os agentes policiais federais e força nacional colheram centenas de cartuchos deflagrados contra nós e logo depois policiais e agentes da Funai retornaram à cidade. Antes de eles saírem do local, pedimos e imploramos a policia para que as nossas manifestações e rituais religiosos protegesse, à noite, falamos para os agentes da Funai, senhores policiais tem que ficar com nós aqui. Responderam-nos que eles precisam a retornarem a cidade para continuar a investigação, assim voltaram à cidade.
Por fim, hoje, 11 de agosto de 2012- sábado, continuamos a nossa manifestação e ritual religioso aqui em frente da casa dos pistoleiros e estamos cercados de pistoleiros sim, eles podem voltar nos atacar sim!, e podem matar-nos todos sim! Estamos pronto para morrer passivamente, nos não temos armas como eles, só temos mbaraka e takua para rezar pela justiça e paz. Assim, comunicamos a todos (as) através deste informativo que nos vamos morrer todos pacificamente pelo nosso território Arroio Korá, por isso, nós já resistimos e sobrevivemos aqui, ao mesmo tempo já decidimos a permanecer definitivamente nas margens desses dois córregos que salvaram a nossa vida hoje, adiantamos os nossos pedidos sagrados, quando os pistoleiros das fazendas matar-nos, queremos ser enterrados nas margens desses dois córregos Arroio Kora-município de Paranhos-MS.
Tekoha Guasu Guarani e Kaiowá-Paranhos-MS, 11 de agosto de 2012.
Atenciosamente,
Assinamos nós comunidade Guarani e Kaiowá de Arroio Kora, incluindo 100 mulheres, 150 homens, 60 idosos (as) 120 crianças, 100 jovens que estamos acamapado aqui em frente das casas dos pistoleiros.
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