Na noite de sexta-feira (15), organizações voltadas à defesa dos direitos humanos realizaram o encontro ‘Mães do Brasil e da Argentina na Luta por Memória e Justiça’, que aconteceu na sede da Organização dos Advogados do Brasil (OAB) sede Rio de Janeiro. A atividade aconteceu dentro da programação da Cúpula dos Povos que ocorre até o dia 23 na capital carioca.
A atividade teve a participação de Nora Cortiñas, cofundadora da Asociación Madres de Plaza de Mayo, da Argentina, de Victória Grabois, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais – RJ e de Deise Silva, da Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência, para falar sobre as violações aos direitos humanos que aconteceram no passado, no período de ditaduras, e sobre as que acontecem ainda hoje.
A abertura foi feita pela presidente do Grupo Tortura Nunca Mais, que teve o irmão, o pai e o primeiro marido desaparecidos durante a ditadura militar brasileira. Victória conversou com os\as participantes, entre outros temas, a respeito da Comissão da Verdade, sobre a qual fez críticas.
“A Comissão da Verdade começou tardiamente. Em outros países da América Latina não demorou tanto tempo a se constituir uma Comissão para investigar os crimes da ditadura. Além disso, a Comissão abrange um período muito longo e outro problema é que a Comissão da Verdade brasileira não tem metodologia e não sabe como vai trabalhar”, criticou.
Na sequência, Deise contou um pouco sobre a realidade das comunidades cariocas e sobre o assassinato de seu filho, em janeiro de 2008, em uma casa de custódia para menores. À época, Deise foi informada que seu filho havia tentado fugir e teria caído, situação que provocou traumatismo craniano, causa da morte.
“Eu lutei como pude pela exumação do corpo do meu filho para mostrar que ele não tentou fugir e um dos fatos que se constatou foi a marca de uma barra de ferro ou de algo semelhante da cabeça dele. Ao saber disso eu me senti traída pela justiça. É com muita decepção que eu vejo o corporativismo e o acobertamento na polícia e na justiça. A lei tem que valer para todos”, apelou.
Deise também desmistificou a realidade das populações que vivem nos morros pacificados pelas UPPs, as Unidades de Polícia Pacificadora, e esclareceu que tudo é bem diferente do que vem sendo mostrado constantemente pela mídia.
“A violência e a truculência com os pobres continua mesmo nas comunidades pacificadas. Hoje, em épocas de Rio+20, estão fazendo uma maquiagem ainda maior, mas a realidade é que a população continua sofrendo com a violência policial, que instiga a comunidade a se voltar contra eles. Um exemplo é a resolução 013, que nos impede de festejar um aniversário, fazer um forró, um funk, ou um pagode, porque o som que sai das comunidades incomoda os ricos, então estamos impedidos de festejar depois das 22h”, revela.
Já Nora Cortiñas também contou um pouco sobre o drama vivido por ela e outras madres argentinas que até hoje lutam por “toda verdade, toda justiça e toda memória”. A cofundadora da Asociación Madres de Plaza de Mayo sofre há 35 anos com o desaparecimento de seu filho Gustavo, que foi sequestrado em uma estação de trem enquanto ia para o trabalho. Gustavo era militante político e fazia trabalhos em bairros pobres de Buenos Aires.
“Todos os dias sinto saudades, pois não é possível esquecer um filho. Dia após dia eu lembro cada vez mais e é por isso que busco a verdade e a justiça sobre o que passou. Eu e todas as madres queremos saber quem, como, quando, onde. Não nos conformamos, queremos que o Estado diga o que se passou”, reivindica.
Aos que dizem que as madres estão vivendo no passado, Nora deixa uma mensagem. “Não estamos no passado, estamos lutando por toda a verdade, toda a justiça e toda a memória e não há perdão, não há esquecimento”, diz acrescentando que sem luta e sem ir para as ruas nada vai mudar.
A atividade foi organizada pelo Grupo Tortura Nunca Mais (RJ), Justiça Global, Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência, Pacs – Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul, Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), Central dos Movimentos Populares, Plataforma Dhesca Brasil, Plenária dos Movimentos Sociais – RJ e Fundação Dinarco Reis.
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