Os militares e a polícia

O que está em jogo na mobilização dos policiais é muito mais do que a reivindicação dos corpos policiais – que pode ser justa, ou não – mas a própria estrutura do Estado Nacional, republicano e, de acordo com seus primeiros constituintes, federativo.

Mauro Santayana

Uma das mais graves conseqüências do regime de 1964 foi a militarização do policiamento ostensivo e repressivo nos grandes centros urbanos do país. Admitia-se, no passado, que o policiamento em municípios do interior se fizesse com soldados da Polícia Militar, sempre subordinados às autoridades policiais civis – mas nas grandes cidades, outra era a situação. Nelas, e com eficiência que os mais velhos lembram, atuava a antiga Guarda Civil, que nada tinha a ver com as atuais guardas civis metropolitanas. Os guardas-civis andavam normalmente armados de cassetetes. Patrulhavam as ruas, a pé, eram sempre solícitos no atendimento das pessoas. A Polícia Militar, fora os oficiais e soldados destacados no interior, permanecia nos quartéis e só era acionada em momentos de grave perturbação da ordem pública, embora muitas vezes cometesse violência brutal contra manifestações de natureza política. No Rio de Janeiro, registre-se, havia a famosa Polícia Especial, notável pela sua brutalidade a serviço da “ordem pública”, quando sob as ordens de Felinto Muller.

O governo militar dissolveu os corpos civis de policiamento ostensivo, entre eles, a Guarda Civil, extinguiu as chamadas inspetorias de trânsito, formadas por servidores civis, especializados no assunto. Tratou-se de ruptura ditatorial do Pacto Federativo de 1891, que a Constituição de 1946, embora com perdas para os Estados, restaurara, depois da centralização do Estado Novo. Mas, até então – e durante todo o período republicano, incluído o período arbitrário de Vargas – a responsabilidade pelo policiamento era dos Estados, que o administravam conforme a sua autonomia federativa. (mais…)

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Um quilombo no fogo cruzado do Contestado

Participação de negros no conflito reascendeu o ódio e trouxe de volta a época escravocrata

Leonencio Nossa e Celso Júnior

A guerra alterou a vida de comunidades tradicionais do Contestado e tornou ainda mais difícil o dia-a-dia de homens e mulheres excluídos. Rossio era um vilarejo de negros descendentes de escravos que mantinha poucas ligações com o povoado mais próximo, São João dos Pobres, atual município de Matos Costa, em Santa Catarina. Os bailes no salão de madeira perto da igreja eram proibido para brancos e caboclos. Maria de Jesus Abel, 69 anos, nasceu no povoado. Neta do líder maior, João Pedro, ela lembra que o isolamento dos negros era uma resposta ao tratamento recebido dos homens de pele mais clara. “Era muito desprezo”, lembra a mulher, que hoje vive no centro de Matos Costa.

O grupo de negros só se “misturou” com os caboclos e brancos após a chegada de rebeldes. “Uns negros entraram no movimento dos fanáticos porque foram forçados. Outros resolveram ir por revolta”, diz um dos homens da comunidade. “Depois que os jagunços vieram de São João de Cima, os negros se misturaram com os caboclos. Aí era uma guerra só, misturou tudo.” (mais…)

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Por que é preciso criminalizar a homofobia

Em 24 de janeiro, Willian participou da abertura do Fórum Social Temático. No domingo, foi atacado por homofóbicos.

Entrevista com Willian do Santos, vítima de atentado que repercute intensamente nas redes sociais. Agredido em Porto Alegre no domingo, garoto perdeu quatro dentes, mas garante que não deixará caso passar em branco

Por Rachel Duarte, no Sul21 | Fotos: Daniela Bitencourt

“Tudo que aconteceu comigo é reversível. O que permanecerá em mim é a lembrança da tragédia. Esta eu levarei para o resto da vida”, disse ao Sul21 o jovem Willian dos Santos, vítima de agressão por homofobia no último domingo (5), em Porto Alegre. Com dificuldades na fala, em razão da perda de quatro dentes e deslocamento da mandíbula, por conta da violência sofrida ao sair do cinema no bairro Cidade Baixa, o estudante de 20 anos está disposto a não deixar o caso passar em branco. “O que aconteceu comigo, aconteceu com outras pessoas e pode acontecer de novo. Estou a disposição do estado para novos esclarecimentos”, disse.

Com voz e jeito de rapaz muito humilde, William conta que embarca no próximo domingo (12) para Natal (RN) onde dará continuidade na faculdade de Relações Internacionais que cursava no Rio Grande do Sul. “Eu não estou indo embora por causa da agressão, já tinha esta oportunidade. Vou sentido em deixar os amigos, ainda mais nesta hora que todos estão me apoiando pelo que me aconteceu”, fala. O jovem chegou a aparecer no Sul21 dias antes da agressão, por conta de sua participação na marcha de abertura do Fórum Social Temático. (mais…)

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A história já o absolveu: Baltasar Garzón

Baltasar Garzón foi condenado por herdeiros da Santa Inquisição. Este homem digno, que poderosos odeiam, é um cidadão do mundo

Por Mario Wainfeld, do Página12, em Buenos Aires

O condenado é espanhol – andaluz, para maior precisão. Percebe-se por sua fala, seu modo de pronunciar certas consoantes ou quando fala de “libertáz” ou de “dignitáz”. Gosta de futebol (foi goleiro na juventude e às vezes reincide) e também dos touros. É uma referência da justiça mundial, um exemplo de consciência em muitos países – por exemplo, nestas pampas.

A reivindicação dos direitos humanos na Argentina teria chegado ao ponto atual sem a intervenção fidalga de Baltasar Garzón? Este cronista supõe que não, mas trata-se de hipótese. O indiscutível é que Garzón é parte da busca de justiça diante do terrorismo de Estado; que merece um capítulo, ou algo mais. Que é um modelo para as militâncias mais nobres da nossa história. Em termos jurídicos, um criador notável de jurisprudência, que influenciou muita gente por aqui.

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A década de 1990 não foi obscura apenas pela entrega do patrimônio nacional e pelo desmantelamento do estado de bem-estar social. Também assistiu a um retrocesso fenomenal na odisseia em favor da memória, verdade e justiça. A aparição do magistrado que reabriu as causas encerradas aqui por estultice, obediência devida e indultos, dinamizou os movimentos por direitos humanos. Deu nova voz às vítimas, acostumou-as a um peregrinar por tribunais de várias paragens do globo. Foi o pioneiro, o mais decidido. Que cada um decida se foi o melhor. Está entre eles. (mais…)

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BA – Universitário diz que vizinhas o impediram de entrar em elevador de prédio por racismo

As imagens do circuito de segurança do edifício também serão utilizadas no inquérito

Um estudante do último semestre de medicina veterinária diz ter sido vítima de racismo no prédio onde mora, na rua Emílio Odebrecht, no bairro da Pituba, na manhã deste sábado (11). Segundo informações de Edmário Maia, advogado da vítima, as supostas autoras do crime são vizinhas do universitário no edifício São Marcos.

Segundo a vítima, tudo começou quando Marcos Davi Silva e Silva chegou da academia e seguiu em direção ao seu apartamento. Ao tentar entrar no elevador de serviço do edifício, ele foi barrado pelas vizinhas, mãe e filha, que o proibíram de entrar no ascensor. “Você não vai entrar aqui não, sua coisa”, teria dito a mãe, segundo o advogado.

Assustada, a vítima perguntou o motivo do impedimento, quando uma das vizinhas respondeu que “não andava com pessoas como ele”. Após uma discussão com o uso de muitos palavrões, ainda segundo o jovem de 26 anos, as mulheres, de identidades não divulgadas, saíram da área de acesso ao elevador e foram à portaria prestar queixa no livro do condomínio. (mais…)

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