Flavia Maia
A prática de parcelamento irregular e invasão de terras continua recorrente no Distrito Federal. Mesmo com a ação dos órgãos fiscalizadores, novos condomínios e loteamentos surgem descontroladamente em áreas com destinação rural, que não podem ser loteadas. Nos últimos 50 dias, seis locais foram alvo de operação policial, e o uso inadequado dos terrenos resultou na prisão de 78 pessoas. Outras oito regiões estão sendo investigadas pela Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente e à Ordem Urbanística (Dema).
A atuação dos criminosos não se restringe a uma área específica. De norte a sul da capital, existem focos de invasão e parcelamentos, com preços que variam de R$ 10 mil a R$ 150 mil. Segundo o delegado-chefe da Dema, Hailton Cunha, terras em São Sebastião; Ponte Alta, no Gama; e Café Sem Troco, no Paranoá são as mais problemáticas. “É uma febre de parcelamentos nesses locais”, comentou.
A grilagem — divisão ilegal de terras públicas — também é comum, como a tentativa frustrada de ocupar o terreno ao lado do Centro Olímpico de São Sebastião. Essa região administrativa, aliás, é uma das mais visadas pelos invasores, que vislumbram a grande oferta de terras e a proximidade de bairros como o Lago Sul. Para se ter uma ideia, das 78 pessoas detidas pela polícia recentemente, 59 atuavam em São Sebastião.
Condomínios
A região de Sobradinho próxima à BR-020 é uma das que estão sob investigação pela proliferação de propriedades irregulares. Um exemplo é o residencial Golden Village, que fica em uma área com destinação rural. As construções começaram há cerca de um mês e três casas estão sendo levantadas. As placas indicando a venda foram retiradas semana passada. A Administração Regional descobriu o loteamento enquanto roçava o mato alto no local e comunicou aos órgãos responsáveis.
Quem passa pela área mal percebe que ali é o início da formação de um condomínio. Não há placas, guaritas ou portão. As ruas estão divididas, mas o cascalho não foi colocado. Por telefone, o Correio entrou em contato com um rapaz que estaria juntando um grupo de pessoas para ganhar descontos na compra de terrenos no Golden Village. Segundo ele, que preferiu não se identificar, a imobiliária está cobrando R$ 40 mil por 850 m². Se 15 pessoas se juntassem, os lotes sairiam a R$ 37 mil, parcelados em 10 vezes.
O condomínio terá 260 lotes. Desses, apenas 80 não foram vendidos. O terreno é de 30 hectares, e, de acordo com o rapaz contatado por telefone, quatro são da Terracap. “Como o condomínio é indivisível, no futuro, os moradores terão de comprar a parte do governo”, explicou. A Terracap informou que precisará ir a campo averiguar a posse dos quatro hectares porque na região existem terras privadas, da União e do GDF.
Modelo atual
Os terrenos à venda em Sobradinho fazem parte de uma fazenda. O delegado-chefe da Dema explica que esse é o modelo atual de loteamento irregular. No passado, grandes proprietários monopolizavam o parcelamento. “Esse modelo ainda existe, mas o que a gente vê agora são chacareiros dividindo a sua propriedade”, explica.
A cabeleireira Euzelene da Silva Rocha, 33 anos, foi detida no último dia 23 por causa do parcelamento da chácara em que vive na região do Café Sem Troco. Para sair da prisão, pagou um salário mínimo. “Como a terra era nossa, meu ex-marido achou que podia fazer o que quisesse”, explicou Euzelene, que, quando ainda era casada, dividiu os dois hectares da propriedade em 14 lotes de 190 m² — cada um deles estava sendo vendido por R$ 10 mil.
Impunidade
Em 2011, os fiscais do GDF derrubaram 2,9 mil edificações de madeira e alvenaria e removeram 196 mil metros de cerca de arame, além de 2,8 mil metros lineares de tapume e 28 mil metros de muro. Mas as operações não são suficientes para inibir a ação dos criminosos. Hailton Cunha, da Dema, conta que muitos apostam na impunidade e ganham bastante dinheiro com ela.
A detenção para grilagem é de, no máximo, quatro anos, além de multa. Já a Lei Federal nº 9.099/95 determina que, nos crimes em que a pena mínima for igual ou inferior a um ano, o processo pode ser suspenso por período de dois a quatro anos. O parcelamento irregular do solo se enquadra nessa categoria. A suspensão pode ser proposta pelo Ministério Público, com a condição de que o réu não tenha condenações anteriores. “A pessoa não fica mais de um mês presa, e esse tempo vale a pena porque ela ganhou milhões vendendo lotes irregulares”, diz o delegado.
http://correiobraziliense.lugarcerto.com.br/app/noticia/ultimas/2012/01/30/interna_ultimas,45519/com-fiscalizacao-insuficiente-loteamentos-ilegais-se-alastram-no-df.shtml
Enviada por José Carlos.