A vida do pescador artesanal no RS é um painel de sofrimentos e dificuldades cotidianas. Mesmo organizados em associações, colônias ou sindicatos, os pescadores são a parte mais frágil do processo de captura de peixes e são, por consequência, os explorados. Um pescador de camarão é obrigado a vender sua produção por apenas R$ 2 o quilo, assim como lhe pagam humilhantes 60 centavos pelo quilo da tainha. Com os pescadores de Tapes, aqui no RS, não é diferente. São 104 famílias que vivem da pesca dos 17 barcos que formam a colônia local. Hoje, a luta destes pescadores, liderados por Paulo Afonso Rodrigues Castro, o Paulinho como é conhecido, é o funcionamento pleno de uma Unidade de Beneficiamento para que eles mesmos possam armazenar e filetar (fazer filés) sua produção. A Prefeitura de Tapes tem colaborado nessa tarefa, mas nem mesmo uma máquina de produzir gelo funciona adequadamente.
Os pescadores necessitam de uma produção de 2,6 mil quilos de gelo por dia para que possam sair pela Lagoa dos Patos na busca de peixes e armazená-los de acordo com as exigências sanitárias. Mas a máquina apresenta falhas, pois, a partir da fabricação de 1,5 mil quilos, o compressor começa a falhar e é melhor desligá-la. Com gelo insuficiente, os pescadores ficam limitados no armazenamento, sem poder conservá-los no período em que estão nas águas da Lagoa. De Tapes ao ponto de lançar suas redes, na costa de Mostardas, há uma viagem de seis a sete horas. Quanto mais longa a viagem, mais necessitam de gelo. A viagem de ida e volta consome 20 dias porque, com pouco gelo estocado e com peixe armazenado, os pescadores vendem sua produção em Palmares do Sul, São Lourenço, Mostardas, às vezes por qualquer preço, ou mesmo para seus fornecedores de gelo. Se a Unidade de Beneficiamento de Tapes estivesse funcionando, as viagens de ida e volta poderiam ser semanais e o peixe beneficiado no município, agregando um valor ao produto e aumentando a renda dos pescadores. Com a palavra, o Ministério da Pesca.
Um projeto
A Unidade de Beneficiamento precisa de licenciamento das autoridades e os pescadores e o prefeito de Tapes, Sylvio Tejada Xavier, buscam um alvará de funcionamento junto ao SIF (Serviço de Inspeção Federal) para que possam vender sua produção in natura e filetada para todo o Brasil (Santa Catarina, principalmente) além de colocá-la nas escolas municipais como parte da merenda escolar e em bancas de mercados públicos.
O camarão (1)
O camarão da Lagoa dos Patos é conhecido em todo o Brasil pelo sabor e pelo tamanho, mas o pescador é o que menos usufrui em ganhos, apesar de ser o responsável pelo crustáceo na mesa do consumidor. Turistas gaúchos costumam elogiar o camarão catarinense preparado com muito talento pelos cozinheiros (chefes de cozinha?) de restaurantes famosos da Ilha da Magia. Boa parte desse camarão degustado vem da Lagoa dos Patos.
O camarão (2)
Pescadores da lagoa estão deixando de capturar camarão pela presença do atravessador na hora do desembarque. Buscar o produto exige um custo maior de combustível e tempo no recolhimento das redes. Na hora de vender, o preço oferecido anda em torno de R$ 2 o quilo, mas o consumidor paga dez vezes mais pelo camarão. “Somos obrigados a vender pelo que nos oferecem. Sem poder armazenar o camarão por falta de gelo, ou vendemos ou jogamos fora”, lamenta o líder dos pescadores de Tapes, Paulo Afonso Rodrigues Castro.
Uma história de pescador
João Antonio Gabriel Centeno Santos tem 12 anos. No mês passado, ele remou 500 metros para salvar o pai que teve uma isquemia cerebral. A fotógrafa Luciane Godinho da Silva, que está fazendo um belíssimo trabalho de imagens dos pescadores da Lagoa dos Patos, conheceu a história do garoto José Antonio, um herói na Colônia de Tapes. Depois do salvamento do pai, o menino e sua mãe foram encontrados por Luciane, no Centro de Tapes, mendigando remédios para o pai. Nesta semana, José Antonio estava, outra vez, trabalhando. Desta vez, ajudando a desencalhar barcos pesqueiros na Sanga das Charqueadas.
A sanga
Na Sanga das Charqueadas ancoram os barcos pesqueiros até que as autoridades construam os tão aguardados molhes de Tapes. Os molhes, além de servirem de contenção das águas da Lagoa dos Patos, acabariam com os constantes encalhes dos pesqueiros. Quando a lagoa aumenta seu volume de água, as casas dos pescadores ficam inundadas. Alguém aí conhece vida mais difícil?
http://www.ecodebate.com.br/2011/02/03/os-pescadores-de-tapes-artigo-de-rogerio-mendelski/