Mudança de tática: Fibria diz reconhecer erros com quilombolas

Flavia Bernardes

A Fibria está mudando de tática com relação às comunidades quilombolas do Espírito Santo. Através de uma reunião entre seus representantes no Instituto Votarantim – que é parte societária da empresa – e das comunidades quilombolas, a empresa afirma reconhecer que errou no trato com as comunidades tradicionais no passado.

Para Luzia Serafin, quilombola da comunidade de São Domingos, no norte do Estado, a empresa está tentando demonstrar uma mudança de comportamento. “Há uma diferença, na minha opinião, até mesmo porque agora conhecemos a alta cúpula da empresa, já que eles estão participando desta iniciativa junto às comunidades. Antes não sabíamos nem quem era quem lá dentro”, afirmou. 

A medida, no entanto, gera desconfiança para muitos da comunidade. Já como Fibria, nome dado à ex-Aracruz Celulose após a fusão com a Votorantim Celulose e Papel, a empresa manteve no Estado a mesma postura anterior à mudança de nome.

Em 2009, uma ação do Batalhão de Choque da Polícia Militar de Vitória no município de Conceição da Barra, contou com forte aparato, em viaturas, a cavalo e também conduzindo cães, com o apoio dos milicianos da Garra – guarda particular da Fibria – para cumprir 28 mandados de prisão. Na ocasião, 30 pessoas foram presas, inclusive um rapaz menor de idade. Além disso, a filha de uma das mais imponentes liderenças da resistência da comunidade na região foi agredida fisicamente por um policial.

A acusação contra eles era de roubo de eucalipto da Fibria, denunciada pela própria empresa. A ação contou com a ajuda de milicianos da Garra, empresa contratada pela Fibria para proteger seus eucaliptais.

Trata-se da disputa de terras entre a ex-Aracruz Celulose, responsável pela ocupação de mais de 50 mil hectares de terras quilombolas, e a luta dos negros para terem de volta suas terras, cultura e dignidade. Desde a ocupação de suas terras pela empresa e por posseiros na região, este povo vive ilhado e sem condições de subsistência, assistindo pouco a pouco a degradação de suas terras, mas agora parece que a empresa quer mudar esta realidade. 

A mudança de hábito da empresa reflete, em parte, a luta quilombola no Estado. Antes restritos a lutar por respeito diante da violência sofrida através da segurança armada da empresa, com o apoio da Polícia Militar, agora os quilombolas ganham força nacional na luta pelo reconhecimento de suas terras, aqui, ocupadas também pelo empresa de celulose.

No início deste mês grupos remanescentes de quilombos de vários lugares do País se reuniram e prometeram marcar os próximos meses com atos de protestos em todos os estados em defesa do reconhecimento do território do seu povo.

E, apesar de acenar para um acordo de paz, os quilombolas não irão abrir mão de suas terras, se esta for a moeda de troca.

A série de manifestos que ainda não tem cronograma divulgado foi uma das definições do 4º Encontro Nacional das Comunidades Quilombolas, que reuniu quase 500 representantes do movimento no início deste mês no Rio de Janeiro.

Ainda que resistentes, há também o grupo de quilombolas envolvidos pelas promessas de desenvolvimento para região feita pela empresa, o que pode gerar um racha na região.

A tentativa de diálogo e as promessas de desenvolvimento para a região feitas pela empresa envolvem uns e afastam outros. Os quilombolas lembram que continuam ilhados, com seus rios poluídos por agrotóxico, e contando, apenas, com a luta do seu próprio povo para se levantar.

Já Luzinete Serafim tem esperanças, e agradece as cisternas construídas na comunidade de São Domingos, em Conceição da Barra, norte do Estado.

Segundo o  Estudo e Relatório de Impacto sobre Direitos Humanos em Grandes Projetos (EIDH/RIDH), que  estudou, em especial, o caso do monocultivo de eucalipto em larga escala no norte do Estado – projeto agroindustrial da Fibria (ex-Aracruz Celulose) e as comunidades quilombolas do Sapê do Norte, as prisões dos quilombolas fazem parte de um processo de intimidação, pois os negros já anunciaram que vão lutar para retomar.

O que se vê agora, entretanto, é a tentativa de uma mudança de hábito com os quilombolas, embora a empresa continue fazendo uso da segurança armada da Garra para proteger os restos de eucaliptos, utilizados para fabricar carvão, que são abandonados na terra após o corte do eucalipto.

Ao todo, 38 comunidades quilombolas vivem na região do Sapê do Norte, entre os municípios de Conceição da Barra e São Mateus. Destas, apenas oito têm processos em andamento para que suas terras sejam reconhecidas e tituladas como terras tradicionais. O quadro na região é de miséria e desrespeito, com os rios do entorno poluídos por agrotóxicos e à mercê das secas devido à degradação ambiental gerada pela monocultura na região.

Já a Fibria diz, em seu site, que mantém um diálogo com a comunidades de forma estruturada com o objetivo de  discutir e listar ações a serem tomadas em caso de impactos positivos ou negativos advindos das operações da empresa na região.

 

http://www.seculodiario.com.br/exibir_not.asp?id=16452

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