Por Joceline Gomes
Teve início hoje pela manhã o seminário Racismo, Igualdade e Políticas Públicas, realizado em parceria entre a Universidade de Brasília (UnB) e o Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC). O anfiteatro 12 estava lotado e as discussões reverberavam entre os muitos estudantes cotistas, especialistas e militantes que se encontravam na plateia.
A conferência inaugural discutiu “Desafios para o combate ao racismo e construção de políticas promotoras da igualdade”. A palestrante, Sueli Carneiro, do Instituto da Mulher Negra Geledés, usou a polêmica em torno da obra “As caçadas de Pedrinho”, de Monteiro Lobato, como base para elencar os inúmeros desafios no combate ao racismo.
Carneiro listou casos recentes e públicos de racismo, como o fato de um deputado ter chamado o ministro do Superior Tribunal Federal de “moreno escuro” e as lamentáveis declarações de Bolsonaro. Entretanto, mesmo com tantas ocorrências negativas, a representante do Geledés afirmou que é possível reconhecer uma mentalidade mais reacionária a esses acontecimentos.
MÍDIA – Para Carneiro, a mídia é o palco para as maiores manifestações racistas que vemos, pois trata-se de um posicionamento velado. “A mídia trabalha com um suposto antirracismo que se afirma pela negação do racismo existente, mobilizando opiniões de especialistas e formadores de opinião que desqualificam as políticas públicas de promoção da igualdade racial”, disse.
Segundo ela, o combate às cotas é o modelo básico desse raciocínio, que expõe as políticas públicas inclusivas a fim de desqualificá-las. “O reconhecimento conquistado pela militância negra tem sido rebaixado pelos conceitos dos formadores de opinião e da mídia. Eles querem desqualificar, carnavalizar a militância, tirar o tema da arena política”, declara Carneiro.
COTAS – A militante afirma que as cotas são tão questionadas porque colocam em risco a monopolização do acesso ao ensino superior por parte dos brancos. Quando perguntada se o sistema de cotas não deveria incluir, também, a pós-graduação, Carneiro afirmou que o ideal seria que o sistema atingisse todos os níveis educacionais, a fim de não acontecer mais o “epistemicídio” – termo cunhado por ela própria a respeito da exclusão de negros dos espaços acadêmicos.
“Precisamos de um número maior de professores negros. É um desafio e é nosso objetivo chegar a uma universidade múltipla em todas as suas esferas”, disse.
Para Natália Maria Alves, integrante do “Nosso Coletivo Negro”, movimento em defesa do sistema de cotas da UnB, essa discussão é necessária e não deve parar. Ao ser questionada sobre a necessidade das cotas, tem a resposta pronta:
“Infelizmente essa é a única maneira de termos acesso a alguns lugares sociais. As portas estão fechadas para nós e se não formos incluídos pelas cotas só nos resta a marginalidade, que é genocida e leva à morte de milhões de jovens negros. Cotas é questão de acesso e não acesso, de vida e morte”, explica.
Alves continua, afirmando que “toda pessoa negra sabe que poucas coisas interferem tanto na nossa trajetória quanto o fenótipo, o cabelo, a cultura, a religião de matriz africana… cotas não é um tema secundário, é tema vital! Inteligência de sobrevivência nós já temos, fazer trabalhos acadêmicos, para nós, é fichinha.”
CRESCIMENTO – Sueli Carneiro argumenta que o crescimento econômico pelo qual o País passou nos últimos anos não foi acompanhado de uma equidade real porque aumentou a concentração de renda por parte dos mais abastados. Para ela, negros e indígenas são os que mais sofrem com essa desigualdade e questiona: “É possível pensar o crescimento econômico sem a equidade racial? É possível crescer sem considerar 50% da população? Isso é o que tem sido feito e claramente não está dando certo.”
Carneiro acrescenta que é preciso haver uma mobilização maior do movimento negro contra essa maneira atual de política, “desafiando os dispositivos existentes”. A palestrante defendeu também que é preciso unir forças e fechar sólidas parcerias. “Devemos criar um espaço de reflexão, unir corajosamente as forças antirracistas, reposicionar as estratégias de luta e convocar a sociedade civil. O futuro desta luta depende do confronto que faremos a essa ideologia racista”, declarou.
Trazendo dados revelados por pesquisas e estudos anteriores, Carneiro afirma: “Grande parte da violência cometida contra os direitos humanos no Brasil estão vinculadas à questão racial.” Discutindo a política nacional constata que não há um lado que realmente defenda a agenda negra: “Entre a esquerda e a direita, eu continuo negra. Se tem um ponto em que eles se encontram é a questão racial”.
SEMINÁRIO – Coordenada por Átila Roque, do colegiado de gestão do Inesc, a mesa emocionou o público, que contribuiu com muitos comentários, sugestões e perguntas e aplaudiu de pé as palavras de motivação de Sueli Carneiro ao fechar o seminário:
“Em alguns casos, não temos estratégias de reação e acredito que esse seminário é uma forma de a gente começar isso. Ao final deste seminário, estaremos revigorados para as próximas batalhas que virão.”
O quê: Seminário Igualdade, Racismo e Políticas Públicas
Data: 30 e 31 de março
Local: Anfiteatro 12 – Brasília-DF
Programação
Dia 31 de março
Manhã
9h30 – 10h Segunda mesa: Políticas Públicas de Promoção da Igualdade Racial
– Rosana Heringer (UFRJ)
– Ricardo Henriques (UFF)
– Valter Silvério (UFSCAR/SP)
Coordenador da mesa: Joaze Bernardino Costa
11h30 – 12h30 Debates
Tarde
14h – 16h Terceira mesa: Participação e Poder
– Ollie Johnson (Wayne State University)
– Eliana Magalhães Graça (Inesc)
– Paula Balduino de Melo (Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia do Departamento de Antropologia da UnB)
– Jurema Werneck (Criola)
Coordenador da mesa: Atila Roque (Inesc)
16h – 17h30 Debates
http://africas.com.br/site/index.php/archives/10460?utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed:+com/ZLVz+(AFRICAS.com.br)
sabe isso é muito verdade , eu sou estudante da UNB, sou bolseiro de um país de africa , quando cheguei na universidade fiquei estupefato , perguntei a mim mesmo , ONDE ESTÃO OS NEGROS ? a única coisa que eu sabia é que o Brasil não é Europa nem África , o Brasil é simplesmente brasil, portanto tem que ter representatividade , eu sempre disse as pessoas não precisam gostar de mim , só é preciso me respeitarem , eles não querem aceitar as cotas porque sabem que tem clara vantagem e querem que a situção continue