A Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia – AATR vem a público manifestar seu estranhamento e repúdio à sentença que absolveu sumariamente os agentes da Polícia Militar denunciados por envolvimento no assassinato de 12 jovens negros no último dia 6 de fevereiro na Vila Moisés, no Bairro do Cabula, em Salvador.
Na última sexta feira (24/07), a Juíza da 2ª Vara do Júri de Salvador-BA proferiu sentença acatando a tese de que os PM’s agiram em legítima defesa, de acordo com o inquérito da Polícia Civil. Foi rejeitada a acusação de execução sumária denunciada pormenorizadamente pelo Ministério Público do Estado da Bahia em maio deste ano. A magistrada sequer realizou instrução de provas para apurar a denúncia apresentada pelo MPE/BA. O órgão ministerial já se pronunciou afirmando que irá recorrer da decisão ainda nesta semana.
Diante do precipitado desfecho judicial apresentado para a “operação” policial que ficou conhecida como Chacina do Cabula, reiteramos a crítica à postura do Poder Judiciário baiano, reafirmando o seu histórico de negação e violação dos Direitos Humanos, conforme constatado pelo dossiê resultante do Tribunal Popular do Judiciário, construído por movimentos sociais do campo e da cidade na Bahia. Em âmbito nacional, a impunidade nos casos de violência no campo também é preocupante. Dados do Caderno de Conflitos no Campo, publicado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), registram 1.723 assassinatos em 1.307 conflitos, ao longo de 30 anos, sendo o Nordeste a 1ª. região do país em assassinatos que permanecem impunes.
Repudiamos também a violência praticada contra a juventude negra e compreendemos que as ações de extermínio identificadas em episódios trágicos como este são expressões do racismo estrutural e institucional em nossa sociedade, considerando que o Brasil historicamente nega à população negra o acesso a direitos e serviços básicos. Consideramos que a disparidade dos índices de mortalidade entre negros e brancos em nosso país nos coloca diante de um cenário de genocídio do povo negro.
Do mesmo modo, manifestamo-nos contra as diretrizes da atual política de segurança pública no Estado da Bahia e repudiamos veementemente a postura assumida pelo governador do estado, Rui Costa, que horas após a repercussão da Chacina do Cabula, durante a apresentação do esquema de segurança do Carnaval 2015, exaltou a “operação” no Cabula ao comparar os policiais militares com artilheiros prestes a marcar um gol e de lá pra cá tem reiterado a posição de que a PM agiu dentro da legalidade e em legítima defesa. Por essa razão, questionamos a posição do MPE/Ba em denunciar somente os agentes de segurança pública, deixando de acionar o Estado da Bahia como réu pelas mortes na Vila Moisés.
Dados do Governo Federal constatam que desde o ano de 2006 houve redução do número de homicídios no país, entretanto, verificou-se o aumento exponencial dos assassinatos envolvendo jovens negros entre 15 e 29 anos. É de conhecimento público que parte considerável desses assassinatos é resultado de operações policiais em circunstâncias oficialmente registradas como “autos de resistência”.
Neste sentido, A AATR registra o seu posicionamento pela desmilitarização das polícias e extinção dos “autos de resistência”, tal como propõe o Projeto de Lei 4471/2012, uma vez que essa medida administrativa de repressão política instituída no período da Ditadura Empresarial-Militar tem sido até hoje instrumento para encobrir a violência praticada por agentes de segurança pública. Por fim, a AATR se manifesta a favor de novo julgamento e, em não havendo juízo de retratação pela magistrada, que o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia receba e dê provimento ao recurso contra a sentença proferida.
—
Foto: Rafael Bonifácio /Ponte Jornalismo
Enviada para Combate Racismo Ambiental por Lorena Aguiar.