*Emanuelle Goes – População Negra e Saúde
Em meio a muitas leituras sobre nós, e principalmente olhando o nosso dia-a-dia, o cotidiano avassalador com os seus elementos que não nos faz esquecer a dor de existir em uma sociedade que nos nega todo tempo e que as nossas dores não são vistas e muitas vezes não são nem considerada como dor. Dizem que vitimizamos tudo e que em tudo vemos racismo, mas é porque ele esta em tudo, essa é a verdade, muito dolorosa. Por outro lado, acham que somos capazes de suportar tudo, somos resistentes, guerreiras, então pode colocar o fado mais pesado que aguentamos, e nós mulheres negras também acreditamos nisso, nesta força sobre-humana ou sub-humana? Não sei ao certo.
Na leitura do artigo “Aceitar a dor, quando banhar-se em lágrimas cura as feridas mais profundas“, me fez refletir como a sociedade ocidental racista e sexista nos tornam duras, resistentes aos sentimentos que nos compõe, segundo a autora “Pode haver tanta tristeza que crescemos insensíveis às emoções ignoradas e soterradas que carregamos em nossos corpos. A dor e a mágoa não expressada doem em nossas almas, e está diretamente ligada ao nosso sentido geral de seca espiritual e tumulto emocional, para não mencionar as muitas doenças que experimentamos em nossas vidas. Muitos sofrem de condições médicas que são [estão] relacionadas com a dor”.
Essa resistência, dureza e força que se manifestam em doenças, tumores, corações cansados que param, e a saúde mental, um dos pontos mais impactados por tudo isso e que nos fizeram acreditar que cuidar da saúde mental é luxo ou frescura, pois somos fortes e acreditamos nisso. E quando decidimos nos cuidar, cuidar da saúde mental, encontramos outra barreira, na verdade é mesma barreira do cotidiano, sim ele mesmo o racismo, e os profissionais não reconhecem as nossas dores causadas por ele, e não podem entender esse dor, principalmente se o profissional for branco, e por outro lado como um profissional da saúde mental pode identificar os nossos sofrimentos se as demandas do racismo na saúde não forem visibilizadas, e se o ensino na Universidade, permanecem fincadas as praticas do ensinamento racista, por meio das ideias de Nina Rodrigues e seus seguidores.
O texto de Jarid Arraes “Meu psicólogo disse que racismo não existe” me fez refletir também, sobre o que conversamos muito entre nós, mulheres negras, que de alguma forma estamos sequeladas pelo racismo. E o texto aponta sobre as praticas racistas no atendimento a população negra, em seu artigo apresentam depoimentos de pacientes revelam que muitos psicólogos não sabem lidar com questões raciais no consultório. A maior carência é uma formação que aborde o problema do racismo no Brasil.
Ainda inquieta e por ser uma pessoa da epidemiologia, fui a busca de dados sobre o assunto, considerando que recentemente a Pesquisa Nacional de Saúde/IBGE disponibilizou dados sobre Percepção do Estado de Saúde e sobre saúde mental, alem de outras informações, resolvi fazer um pequena analise e observar como essas informações dialogam com os artigos acima citados e com a minha reflexão como sujeito.
Apresentarei dados sobre percepção do estado de saúde sobre depressão e o diagnostico do profissional sobre a doença.
Na figura 1 os dados apresentador revelam que as mulheres pretas como as que mais apresentam problemas percebidos com a depressão quase todos os dias.
Na figura 2 e apresentado informações sobre diagnostico de depressão dado pelo medico ou pelo profissional da psicologia, e pode ser observado que as mulheres brancas tem um maior percentual quando comparado com as mulheres pretas e pardas.
Na figura 3, os dados apresentam sobre a idade do primeiro diagnostico, e o que pode ser observado é que as mulheres no geral tem o diagnostico em maior percentual na fase adulta, no entanto as mulheres brancas e pardas apresentam diagnostico ainda na fase da adolescência e jovem, ou seja, as mulheres pretas de acordo com os dados tem o diagnostico mais tardio que as outras mulheres.
Na figura 4 sobre o tratamento da depressão as mulheres pretas tem o maior percentual em que nunca vai ao tratamento, já as mulheres brancas e pardas tem uma maior proporção quando comparado entre elas sobre as que não procuram o tratamento, só quando tem algum problema.
Então é isso, os dados parecem confirmar, o que a minha reflexão e os artigos trouxeram em relação ao nosso adoecimento mental e as dificuldades no acesso aos diagnostico, ao tratamento e ao cuidado da nossa saúde.
Então quem enxuga nossas lagrimas?, quem acalanta e nos abraça?, espero que possamos disseminar amor pelo menos entre nós, então façamos, empatia e ubunto, para aliviar a nossa dor e humaniza-lá.
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* Blogueira, Enfermeira, Militante do Movimento de Mulheres Negras, Pesquisadora em Saúde das Mulheres Negras
Além do preconceito com os transtornos mentais a dificuldade de interpretar os sintomas faz com que a mulher demore a procurar ajuda. Os sinais podem ser confundidos com sentimentos naturais, como tristeza, indiferença e desânimo. Concordo com o desprepraro de profissionais para acolherem com uma anamnésia dígna e técnica, permitindo, principalmente, a co transferência e um verdadeiro aprofundamento da dor da criança, da jovem, da mulher, da idosa. Sim, depressão é uma doença que afeta todas as idades.