“Começaram a tirar as vacas e os pertences. Teve um acordo e vamos ficar na nossa retomada, na terra dos antepassados, o tekoha (lugar onde se é) Kurusu Ambá”, diz Tapé Rendi, assim identificado por razões de segurança, ao informar que os Guarani e Kaiowá garantiram nesta terça-feira, 23, a permanência na retomada localizada na sede da fazenda Madama. Como, da noite para o dia, uma retomada Guarani e Kaiowá, no cone sul do Mato Grosso do Sul, parte de mais um cenário de violência explícita contra os povos indígenas para, por enquanto, um lugar seguro aos seus verdadeiros donos, pode ser explicado por algo simples, mas raro: as autoridades agiram.
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Enquanto se espalhava a notícia de que capangas e pistoleiros cercavam o acampamento da retomada no tekoha Kurusu Ambá, atirando contra os barracos de lona, o procurador da República Ricardo Pael trabalhava de forma rápida para colocar em campo uma operação envolvendo a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Polícia Rodoviária Federal (PRF) com o intuito de por terra e ar chegar ao local da retomada e evitar que mais uma tragédia ocorresse contra os Guarani e Kaiowá. Em Brasília, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal e a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão da Procuradoria-Geral da República (PGR) garantiram apoio e respaldaram toda a articulação.
No final da tarde, início da noite, o helicóptero da operação desceu na sede da fazenda Madama. Capangas armados fugiram e o fazendeiro foi obrigado a recuar. Ele explicou que estava ali, com todos aqueles homens, para retirar seus pertences do local. “O que não é verdade. Estavam ali para nos expulsar. Estavam atirando na gente. Nunca que a gente quis nada dele. Pode levar tudo, até os tijolos da casa. Retomamos a nossa terra, só isso”, afirma Tapé Rendi. Conforme informações obtidas com servidores da Funai, dezenas de cápsulas – aparentemente de fuzil – foram recolhidas na área.
Na sequência, de acordo com relatos de indígenas ouvidos pela reportagem, o procurador Ricardo Pael passou a negociar uma saída para evitar ataques contra a comunidade indígena. “O fazendeiro foi embora e hoje (terça-feira, 23) todo mundo voltou para fechar o acordo. Vieram aqui e começaram a tirar tudo, vaca, tudo, tudo”, diz o Guarani e Kaiowá. O acordo, porém, está longe de garantir a posse definitiva do território aos indígenas de Kurusu Ambá. O proprietário pode entrar na Justiça pedindo reintegração de posse, por exemplo.
Integrante da Aty Guasu, organização do povo Guarani e Kaiowá, Otoniel Guarani e Kaiowá afirma que o próximo passo será o governo brasileiro “garantir o andamento da demarcação e que as lideranças dessa nova retomada de Kurusu Ambá entrem no Programa de Proteção (de Defensores de Direitos Humanos)”. Otoniel se diz surpreso com a rapidez das autoridades e que só assim uma situação de ameaça de morte iminente pôde se transformar numa saída pacífica. “Quando as autoridades agem rapidamente é possível evitar mortes, violências e sofrimento. Nada está totalmente resolvido. Sabemos que agora o governo precisa agir e concluir a demarcação”, explica o Guarani e Kaiowá ao analisar o caso.
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Infelizmente, o elogio teve pernas curtas:
URGENTE! Fazendeiros atacam a tiros acampamento Guarani e Kaiowá de Kurusu Ambá
Que bom o estado ter se posicionado de forma firme e eficaz, evitando mais mortes e postergação de providências. Parabéns aos Guarani e ao MPF.