Prezada Presidenta Dilma, com muita revolta e indignação, acompanhamos as discussões em torno da Medida Provisória 665 e dos decretos 8424 e 8425 que visam extinguir direitos trabalhistas e previdenciários das comunidades tradicionais pesqueiras, especialmente das trabalhadoras da pesca artesanal.
Lamentamos profundamente a sua falta de sensibilidade em relação aos impactos que essas leis podem causar na vida de milhares de mulheres pescadoras em todo Brasil. Estamos espantadas com a profunda falta de conhecimento do governo em relação ao nosso modo de vida, especialmente no que se refere à postura antidemocrática e machista com a qual estão conduzindo este processo.
Vossa senhoria já imaginou o impacto negativo que estes dispositivos legais podem causar em nossas vidas? Se esses decretos forem publicados como estão, nossa identidade pesqueira será fortemente desrespeitada; ficaremos impedidas de acessar o seguro defeso e perderemos as condições financeiras mínimas para garantir a sobrevivência das nossas famílias.
Prezada presidenta, nos últimos anos o acesso ao seguro defeso favoreceu o aumento da autonomia financeira das pescadoras no período de reprodução das espécies de peixes e crustáceos. Além disto, assegura a nós mulheres pescadoras o poder de decidirmos sobre nossas vidas e prioridades, reforçando nossa autoestima e também abrindo possibilidade para que milhares de mulheres pescadoras rompam com espaços e ciclos de subordinação e dependência no plano político, econômico e social.
Definir as pescadoras, que tradicionalmente trabalham em regime de economia familiar, como trabalhadoras de apoio a pesca, conforme prevê o decreto 8425, é um equívoco grave, fere o princípio que homens e mulheres são iguais perante a lei ao propor uma categorização e acesso a direitos diferenciados para as atividades que em grande medida são exercidas por mulheres. Esta categoria hierarquiza e desvaloriza o trabalho das mulheres pescadoras, além disto coloca em sério risco nossa autonomia em vários campos das nossas vidas, agravando a vulnerabilidade social e econômica de milhares de mulheres pescadoras e nos expondo ainda mais às situações de violência que ocorrem das mais variadas formas dentro e fora de casa.
O decreto coloca em risco direitos conquistados e é um grave retrocesso quando ameaça o direito da pescadora enquanto segurada especial da previdência social. Corre o sério risco de transformar trabalhadoras dignas com direitos trabalhistas e previdenciários em público beneficiário de políticas assistenciais.
Por uma questão de princípio fundamental e histórico na luta das mulheres trabalhadoras de todas as categorias profissionais e tradicionais, a Senhora não pode ser proponente desse absurdo! Não podemos retroceder… Precisamos consolidar nossa luta pela afirmação de direitos… Consolidar nossa autonomia e liberdade…
Sabemos que o poder de decisão está sobre a sua governança e desde já lhe responsabilizamos pelas consequências. Solicitamos que vossa senhoria reveja essa posição que fere profundamente nossa dignidade enquanto pescadoras.
Nenhum passo atrás… Seguiremos firmes na luta em honra a todas trabalhadoras do Brasil!
Junho/2015