Adneison Severiano, no G1 AM
A defesa dos índios presos acusados de triplo homicídio no Sul do Amazonas aponta supostas fragilidades da investigação desempenhada pela Superintendência da Polícia Federal em Rondônia. Os crimes ocorreram em dezembro do ano passado, dentro de uma reserva Tenharim, em Humaitá, município distante 591 km de Manaus. Atualmente, cinco dos seis réus estão presos e afirmam que são inocentes.
Dez meses após as mortes, a defesa dos tenharim revelou ao G1 supostas fragilidades da investigação desempenhada pela Superintendência da Polícia Federal em Rondônia. Segundo o advogado Adelar Cupsinski, do Conselho Indigenista Missionário (CIM), que integra equipe de defesa dos indígenas, há falhas na investigação.
“Uma das vítimas tinha juras de morte. Isso foi relatado pelo próprio irmão de uma das vítimas, mas não foi considerado no inquérito. No momento certo vamos colocar essas questões. Há muitas falhas no inquérito e a posição dos índios precisa ser considerada. Os índios confiam na justiça e dizem que são inocentes, nós estamos acompanhando o caso de perto. Todas as aldeias negam a imputação feita aos presos”, disse o advogado de defesa sem se aprofundar nas outras supostas falhas.
Procurada pelo G1, a Polícia Federal disse que se manifestará somente nos autos do processo, durante o curso normal da ação criminal e que as investigações já estão encerradas. O juiz Jeferson Galvão de Melo, titular da 1ª Vara, que responde pela 2ª Vara da Comarca de Humaitá, onde a ação criminal tramita, explicou que se houve ou não falha na investigação será analisado no julgamento.
Vingança
A suspeita é de que os crimes tenham sido resposta à morte do cacique Ivan Tenharim, cujo corpo foi encontrado em um trecho da rodovia Transamazônica no dia 2 de dezembro do ano passado. Dois filhos do líder indígena estão presos por suposta participação nos assassinatos dos três homens.
“Durante a pajelança, um pajé chamado de Satan disse que o cacique Ivan Tenharim tinha sido atropelado por um carro preto e o líder da comunidade era para ser feita providências imediatamente. Para o azar dos três cidadãos, que passam naquele dia pelo local, foram executados. Nada mais que vingança contra inocentes”, contou o advogado Carlos Terrinha.
Entenda o caso
O vendedor Luciano Freire, o professor Stef Pinheiro de Souza e o funcionário da Eletrobras Amazonas Energia Aldeney Salvador desapareceram no dia 16 de dezembro de 2013. As investigações apontam que as três vítimas foram assassinadas a tiros no dia 16 de dezembro de 2013, ainda dentro do veículo no qual seguiam em viagem pela Rodovia Transamazônica (BR-230) com destino ao município de Apuí. Conforme a denúncia, os corpos foram ocultados e encontrados durante uma operação de buscas pela área da Transamazônica somente no dia 3 de fevereiro de 2014.
De acordo com a defesa das vítimas, dois dos homens mortos conheciam os índios suspeitos e até participavam de atividades sociais juntas. “Duas das três vítimas conhecia os índios presos e tinha uma relação amistosa com eles. O Aldeney jogava bola com eles na aldeia e o Luciano vendia produtos para os índios. O Stef era o único que não tinha nenhuma relação com esse grupo de indígenas”, afirmou o advogado.
Ótimos os seus questionamentos, Gilles, e um prazer vê-lo aqui. Eu só acrescentaria a eles o fato de, apesar de os Tenharim levantarem isso diversas vezes ao longo das ‘investigações’, a violência da Rodovia do Estanho não ter sido sequer aventada como hipótese a ser examinada. Tudo indica que a Polícia Federal – com seu super ‘caveirão’ reluzente – desde o início partiu do pressuposto de que os culpados eram os Tenharim e, preferencialmente, lideranças cuja prisão de alguma forma pudesse ajudar a desarticular todo o povo.
Já a morte da menina de 13 anos (da qual não tivemos sequer notícia aqui no ‘sul maravilha’) é uma comprovação lamentável de como eles estão sendo tratados, partir dessa criminalização e da campanha de ódio alimentada na região desde dezembro.
Aproveitando: seria um prazer ainda maior ter um artigo seu no blog, quer sobre este assunto, quer sobre a saúde indígena e talvez – caso você prefira – a questão da contaminação dos rios por mercúrio, em particular. Poderia ser?
Tania.
De fato, tudo indica que houve falhas e que se trata de um esquema bem montado por um grupo poderoso que teve interesse em denegrir os indígenas e a FUNAI. E isso foi claro desde o início.
Durante semanas buscou-se os corpos dos desaparecidos e os eventuais restos do carro “preto”. Em nenhum momento, a polícia informou a identificação do veículo (placa, dono,…), e essa “não-informação” não foi questionada pela imprensa.
A imprensa relatou nos primeiros dias o depoimento de uma testemunha que disse ter visto “04 pessoas” num carro “preto” na entrada da terra indígena; depois, a mídia não fez mais referência a essa quarta pessoa. Já que nenhuma das vítimas é dono do carro, a pista da quarta pessoa devia ser considerada…
Quanto à história do pajé Satan (a imprensa falava de um pajé do povo Torá de Manicoré), que descobre que o carro assassino do cacique Ivan é de cor preta, é uma história para fazer boi dormir. Esse pajé não existe.
Policiais testemunham que viram os Tenharim empurrar um carro “preto”…entretanto, os equipamentos modernos e sofisticados que acham uma agulha perdida na mata não acharam uma só jante (nem que seja na boca de um jacaré do rio Marmelo!). E se o carro não está na terra indígena é que alguém o levou para fora! Além disso é estranho que os policiais que cruzaram o rio Madeira na mesma balsa que o carro preto (que foi a primeira do dia), ao ver o carro sendo empurrado, não parassem para saber o que estava acontecendo.
Queremos acreditar na Justiça brasileira. Os cinco indígenas presos afirmam que são inocentes e que sairão da cadeia de cabeça erguida.
Na segunda quinzena de setembro, uma moça Tenharim de 13 anos da aldeia Mafuí faleceu de tuberculose pulmonar; o atraso diagnóstico devido à falta de assistência é algo absurdo e revoltante que dificilmente teria acontecido antes.
Após a morte matada do cacique Ivan e dos três não-indígenas, essa moça tornou-se mais uma vítima da agressão aos povos Indígenas de Huamaitá e do Brasil.