Constituição agora pune o trabalho escravo

Uma das oficinas da cadeia produtiva da Zara flagrada com trabalho escravo em 2011. Foto: Bianca Pyl
Uma das oficinas da cadeia produtiva da Zara flagrada com trabalho escravo em 2011. Foto: Bianca Pyl

Senado promulgou ontem emenda constitucional que determina expropriação de terras onde a prática for constatada, para uso em reforma agrária ou moradia popular

Jornal do Senado

Imóvel urbano ou rural onde houver trabalho sem pagamento de salário ou análogo à escravidão poderá ser retirado do proprietário, sem indenização. Esse mandamento constitucional passa a valer com a Emenda Constitucional 81, promulgada ontem pelo Congresso. A emenda acrescenta trabalho escravo no artigo 243, que determinava a expropriação apenas onde houvesse culturas ilegais de plantas psicotrópicas.

Na área rural, as terras expropriadas deverão ser usadas para reforma agrária. No meio urbano, os imóveis devem ser utilizados em programas de moradia popular. A proposta foi apresentada em 1999 pelo então senador Ademir Andrade, que participou da sessão solene de promulgação ontem.

A definição de trabalho escravo ainda depende de regulamentação porque foi aprovada subemenda que incluiu a expressão “na forma da lei”. Uma proposta de regulamentação (PLS 432/2013), que tem Romero Jucá (PMDB-RR) como relator, aguarda votação.

De acordo com o Código Civil, condição análoga à escravidão inclui submissão a trabalho forçado, jornadas exaustivas ou em condições degradantes, ou quando ocorre restrição à liberdade de locomoção em razão de dívida contraída, a chamada servidão por dívida.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, lamentou que, mais de um século depois do fim da escravidão, ainda não seja possível dizer que o Brasil está livre desse mal. Segundo ele, foi por isso que o Legislativo decidiu adotar medidas mais drásticas, inclusive impondo a desapropriação.

Renan afirmou que o termo escravidão lembra pessoas trazidas à força, na colonização, para trabalhar nos canaviais, cafezais, fazendas de gado e nas cozinhas das casas-grandes. Observou que essas cenas saíram do cotidiano do país, mas outras formas abusivas e servis de exploração do trabalho permanecem.

— A escravidão que atualmente combatemos não é mais aquela institucionalizada, mas nem por isso menos cruel e execrável. Não se veem mais grilhões, correntes e pelourinhos, pois persiste insidiosa, encoberta, disfarçada — disse.

O presidente do Senado observou que o trabalho análogo à escravidão ultrapassa fronteiras. Citou que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima 30 milhões de pessoas submetidas a trabalho forçado em todo o mundo. Uma parcela importante seria de latino-americanos e 90% dos casos acontecem na economia privada.

— Esses dados muito mais nos envergonham sabendo que o trabalho forçado afeta a camada da população mais carente, mais vulnerável e que mais deveria estar sob a proteção do Estado. Entre esses, os mais atingidos são as mulheres, os migrantes menos qualificados, as crianças e os indígenas — declarou.

Renan registrou que em 1957 o Brasil aderiu à Convenção 29, da OIT, que pediu a eliminação do trabalho forçado. Diante da persistência da prática, foi lançado em 2003 um plano nacional para a erradicação. Mais adiante, o Congresso aprovou alteração no Código Civil para caracterizar de forma mais efetiva a condição análoga à de escravo.

Mesmo com todos os avanços, conforme avaliou Renan, a legislação praticamente não vem sendo aplicada, deixando uma “sensação de impunidade”. Diante disso, justificou, o Congresso partiu para medidas mais rigorosas no texto da PEC do Trabalho Escravo, como as desapropriações.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Carlos Rosalba.

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