Resolução do Estado trouxe prejuízo à educação indígena

Em audiência pública realizada nesta segunda (14), Executivo se mostrou disposto a dialogar para resolver a situação

Assembleia de Minas – Segundo os participantes de audiência pública promovida em conjunto pelas Comissões de Educação, Ciência e Tecnologia e de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta segunda-feira (14/4/2014), a Resolução 2.442/13, da Secretaria de Estado de Educação (SEE), causou a drástica redução do quadro de funcionários e até mesmo a paralisação das atividades de algumas instituições voltadas à educação indígena. A boa notícia, no entanto, é o compromisso de manter o diálogo aberto na busca de atender às reinividicações das comunidades indígenas firmado pelo Governo Estadual durante a reunião.

A Resolução 2.442/13 estabelece normas para a organização do quadro de pessoal das escolas estaduais e a designação para o exercício de função pública na rede estadual de educação básica. Segundo a superintendente de Modalidades Temáticas Especiais de Ensino da SEE, Soraya Hissa de Siqueira, a norma tem como objetivo equilibrar o número de funcionários às necessidades das instituições de ensino no Estado, uma vez que atualmente algumas apresentam déficit e outras um excesso de profissionais para as suas atividades.

No entanto, ainda de acordo com a representante da SEE, como as escolas indígenas têm características específicas, acabaram por ser prejudicadas pelas normas gerais dispostas na resolução, o que causou a redução do número de funcionários dessas instituições.

O cacique da tribo xacriabá de São João das Missões, Domingos Nunes de Oliveira, apontou os impactos negativos da Resolução 2.442/13. “A escola xacriabá foi uma das mais afetadas. Perdemos quase 50 funcionários, o que levou à paralização das aulas”, disse.

Domingos de Oliveira também reclamou da falta de diálogo do Executivo com as comunidades antes da definição das normas que as afetam diretamente e defendeu a criação da categoria escola indígena, para assegurar a especificidade do modelo de educação desse estrato da população.

Na mesma linha, o coordenador-geral do Conselho dos Povos Indígenas de Minas Gerais (Copimg), Mezaque Silva de Jesus, ratificou a falta de consentimento dos índios em relação à resolução. “Estamos sendo desconsiderados enquanto sociedade organizada. Normalmente, as decisões vêm de cima para baixo, essas mudanças não têm o nosso aval”, afirmou.

“A referida resolução atropela a organização das nossas escolas. Por isso a importância da categoria escola indígena, que contenha uma legislação própria para a comunidade. O atual sistema foi criado para nós, e não por nós”, acrescentou o diretor da escola xacriabá, Jair Cavalcanti. Ele também citou os efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que considerou insconstitucional a Lei Complementar (LC) 100, de 2007, que efetivou sem concurso cerca de 98 mil servidores designados, a maior parte deles da área de educação.

O procurador regional dos Direitos do Cidadão, Edmundo Antônio Júnior, informou aos presentes algumas diretrizes presentes na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que devem ser seguidas por todos os países. Ele ressaltou os artigos que estabelecem a necessidade de alfabetização das crianças indígenas em suas línguas maternas, o direito dos índios de participar dos programas educacionais de ensino voltados para eles e a igualdade de oportunidades na educação em todos os níveis.

Secretaria de Educação garante adaptações à realidade indígena

A representante da SEE, Soraya Hissa de Siqueira, esclareceu que o objetivo da pasta é manter uma relação de diálogo com as lideranças indígenas e promover, na medida do possível, as alterações requisitadas para o funcionamento das escolas nas aldeias. De acordo com Soraya, a secretaria já promoveu reuniões com algumas tribos, como os xacribás e pataxós, e várias demandas já foram atendidas, como a exlusão do projeto incial de turmas multiseriadas.

“Estamos promovendo um estudo para elaborar uma resolução construída com a consulta direta aos indígenas”, afirmou. Em relação aos efeitos da decisão do STF sobre a LC 100, Soraya informou que o Estado deve apenas acatar a decisão da corte, mas que os funcionários afetados pela sentença devem continuar contratados como desigandos nas escolas indígenas, uma vez que os profissionais dessas instituições devem ser índios.

A secretária de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação (MEC), Macaé Maria dos Santos, defendeu a instalação de uma comissão de educação escolar indígena no Estado, nos moldes da comissão nacional, para a formulação de diretrizes próprias aos índios.

Macaé Maria dos Santos ainda ressaltou algumas realizações do Governo Federal, como a organização das escolas indígenas por território étnico-educacional e o programa de fortalecimento desses territórios; a sanção da Lei de Cotas (Lei 12.711, de 2012), que assegura vagas no ensino superior a índios, e da Lei 12.960, de 2014, que proíbe o fechamento das escolas indígenas sem consulta à comunidade local; a bolsa-permanência, de R$ 900, para estudantes índios que ainda vivem em suas aldeias; e o Programa Saberes Indígenas nas Escolas, que valoriza o ensino das línguas maternas das tribos.

Por fim, a representante do MEC sugeriu a oferta de concursos específicos para os profissionais indígenas na área de educação. Em relação à criação de concurso público voltado aos índios, o procurador Edmundo Antônio Júnior defendeu que o candidato deve ter o direito de escolha de atuação em determinada aldeia no momento da inscrição, concordando com a aplicação do concurso de maneira específica para cada comunidade.

Deputados defendem importância da reunião

Os parlamentares presentes destacaram a importância do debate proporcionado pela ALMG e o longo caminho a ser percorrido para a plena valorização dos índios. “Priorizamos aqui uma atividade de reflexão, amparada principalmente na construção e ampliação da rede física e no atual quadro de pessoal das escolas indígenas”, frisou o deputado Duarte Bechir (PSD).

“Esta audiência é fruto da solicitação das próprias etnias indígenas. Sempre no mês de abril, a Comissão de Participação Popular realiza atividades em prol desse contingente. Inclusive, no que depende da ALMG, as questões ligadas aos desafios enfrentados pelas comunidades indígenas têm avançado”, comentou o deputado e autor do requerimento da reunião, André Quintão (PT).

A deputada Maria Tereza Lara (PT) se disse esperançosa de que as discussões da audiência se desdobrarão em ações concretas, pela presença de representantes das três esferas de governo. O deputado Arlen Santiago (PTB) enumerou as principais reivindicações dos indígenas e ações do Executivo estadual que têm esse público como alvo.

Entre os assuntos abordados pelo parlamentar, estão a demarcação de terras, a estrutura da Fundação Nacional do Índio (Funai) no Estado, o pagamento dos profissionais das escolas indígenas e ações para desenvolver a telefonia celular e o transporte escolar nas aldeias.

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