Informamos que na manhã de hoje cerca de 180 indígenas das etnias:Tapeba de Caucaia, Pitaguary dos municípios de Pacatuba e Maracanaú, Anacé de Caucaia, Tapuya-Kariri do município de São Benedito e Tabajara de Poranga estão ocupando a sede do Distrito Sanitário Especial Indígena do Ceará. A ocupação foi motivada por conta do atual cenário de calamidade pelo que vive a saúde indígena no estado.
Aproveitando a oportunidade um grupo de lideranças indígenas foram na Assembleia Legislativa e confirmaram a realização de uma audiência pública no dia 24 de abril aonde será discutida a questão das terras indígenas no Ceará.
Leia abaixo o documento na íntegra aprovado pelos indígenas que estão acampados na sede do DSEI/CE em Fortaleza.
A SAÚDE INDÍGENA DO CEARÁ ESTÁ DOENTE
Nos últimos meses temos visto um cenário desolador se instalando em nossas comunidades indígenas, no que tange a política de atenção a saúde indígena no Brasil e no Ceará não é diferente. Estamos presenciando uma total paralisia em serviços essenciais juntos as nossas comunidades motivada por uma clara falta de expertise na área da gestão por parte da Secretaria Especial de Saúde Indígena – SESAI por meio do DSEI/CE.
Estamos vivenciando a quase totalidade de um processo de terceirização da saúde indígena, lembrando que há poucos anos atrás o discurso do movimento indígena sempre foi contrária a municipalização da saúde indígena e hoje o atendimento encontra-se nas mãos das terceirizadas, sendo que a discussão do concurso público perdeu força no âmbito da estrutura do governo e há uma clara omissão do próprio movimento indígena nessa discussão.
Em nosso estado, não conseguimos visualizar a perfeita implantação das equipes de saúde indígena junto as comunidades que ainda não haviam sido contempladas com essa assistência e as ações ligadas ao saneamento básico, especialmente aquelas que tem como objetivo o acesso a água potável para o consumo humano, estão longe de serem implementadas.
Anos vão se passando e diversas ações previstas nos planos distritais teimam em não ser implementadas e são reescritas a cada ciclo. Nossa insatisfação se fez maior, ocasionada essencialmente pelo atual cenário de abandono que tomou conta das nossas aldeias referente a saúde indígena.
Nossos postos estão sendo desprovidos de medicamentos da farmácia básica que não dispõe sequer de esparadrapos para feituras de um simples curativo. Os serviços de transporte de urgência e emergência foram paralisados e não há previsão de restabelecimento do referido serviço.
Para piorar essa situação, fomos informado que o Ministério da Saúde teria anunciado recentemente um corte significativo na saúde indígena de 23,5%, que terá impacto nos orçamentos de todos os Distritos Sanitários Especiais Indígenas do Brasil, estimando que para o DSEI/CE deverá sofrer com o corte de 1 Milhão Reais.
Para complicar ainda mais a situação temos em nossas aldeias, diversos indígenas tendo seus direitos individuais violados, motivados por uma decisão da FUNAI e da própria SESAI em não garantir o atendimento de saúde aos indígenas que ainda não foram incluídos no cadastro populacional integrante do Sistema de Atenção a Saúde Indígena – SIASI, o que tem impedido que nossos parentes acessem as ações de atendimento nos postos de saúde e polo-base, bem como não são acompanhados pelos Agentes Indígenas de Saúde e de Saneamento Básico.
Mesmo com a reivindicação de diversas comunidades, em nosso estado não há contrato para os serviços funerais, o que acaba gerando desconforto para as nossas famílias até na hora que perdemos um ente querido. Não há contrato para o implante de próteses dentárias e diversas equipes não dispõe em sua integridade de todos os profissionais especializados de que nossas comunidades teriam direitos.
Contribuímos com o processo de criação da SESAI tendo a clareza das limitações e omissões da Fundação Nacional de Saúde – FUNASA o que estava contribuindo para a violação dos direitos à uma saúde digna e diferenciada. Passados 03 (três) anos de criação da SESAI, diversos problemas persistem e/ou foram agravados.
Estamos avançando na segunda metade do quadriênio (2012-2015) do Plano Distrital de Saúde Indígena aprovado pelo CONDISI em 2012 e boa parte das suas ações sequer foram iniciadas. Corremos o risco mais uma vez de ações não serem implementadas, como é o caso das ações de infraestrutura que tem como foco a construção dos postos de saúde e pólo base.
Queremos que nossos Conselhos Locais e o CONDISI, sejam mais atuantes livres das possíveis amarras ou de discussões tendenciosas vindas da gestão da saúde indígena, para isso se faz necessário que funções como a própria Secretaria Executiva do CONDISI seja ocupada por um indígena para viabilizar os trâmites necessário para efetivar o encaminhamento das reuniões ordinárias e extraordinárias dessa instância;
Diante desse contexto, viemos por meio da presente carta, manifestar nosso descontentamento com a gestão da saúde indígena junto as nossas comunidades, repudiando o Governo Federal pelo possível corte no orçamento para a saúde indígena, solicitando que esse corte não ocorra e reivindicar a imediata resolução por meio da SESAI, atendendo as seguintes solicitações:
I- Implementação urgente de um Contrato Emergencial para a fim de reestabelecer os serviços de transporte de urgência e emergência até que uma nova licitação ocorra, nesse sentido, solicitamos que os termos do contrato emergencial, bem como o contrato objeto da futura licitação ocorra nos mesmos moldes como vinha ocorrendo anteriormente, já que os serviços eram avaliados de forma satisfatória por nossas comunidades e as possíveis alterações já anunciadas trarão profundos impactos aos serviços ofertados;
II- Prover os postos de saúde com os medicamentos da farmácia básica;
III- Definir um prazo para regularização dos cadastros simples dos indígenas aldeados que comprovem vínculos de parentescos com os indígenas já inclusos no cadastro do SIASI;
IV- Viabilizar o imediato pagamento dos nossos agentes de saúde e agentes indígenas de saneamento em atraso por meio da empresa terceirizada IMIP;
V – Viabilizar a contratação dos serviços funerários e de implantes de próteses dentárias;
VI- Viabilizar com maior agilidade a implantação dos sistemas de abastecimento de água junto as comunidades indígenas que estão sofrendo com a estiagem, especialmente a conclusão das obras que estão paralisadas e iniciar as obras dos projetos que ainda não foram iniciados;
VII- Apresentar os motivos reais que provocou até o momento a não implementação das ações previstas para a área do saneamento básico e esgotamento sanitário objeto de convênio celebrado entre a FUNASA e a Prefeitura Municipal de Caucaia para atender as Comunidades Tapeba.
VIII – Formação continuada afim de capacitar os Agentes de Saúde Indígena (AIS) e Agentes de Agente de Saneamento com o objetivo de formar esses profissionais para que eles possam oferecer serviço de qualidade para as populações.
IX – Fornecimento de Equipamento de Proteção Individual (EPI) para que os profissionais possam exercer com dignidade a sua função.
X- Convênio com óticas para aquisição de óculos para os indígenas, bem como com farmácias para aquisição de medicamentos especiais.
XI – Aquisição de uma sede própria para a SESAI, tendo em vista o alto valor pago de aluguel que viabilizaria uma grande economia, podendo destinar melhor o recurso.
XII- Limpeza de poços profundos.
XIII- Funcionamento estendido nas sextas-feiras dos postos de saúde de acordo com os horários normais da semana.
Saúde indígena é essencial para garantirmos a nossa dignidade!
Fortaleza-CE, 10 de Abril de 2014