AC – Sesai se defende tentando criminalizar lideranças indígenas e acusá-las de quererem cargos e privilégios

Criança Madjá do Alto Purus - desnutrição aguda. Foto: Blog do Padilha
Criança Madjá do Alto Purus – desnutrição aguda. Foto: Blog do Padilha

Tania Pacheco* – Combate Racismo Ambiental

A forma como a SESAI continua a tratar os crescentes protestos das lideranças indígenas Brasil afora (mas predominante na região Norte) começa a aproximar o ‘simples’ descaso com algo parecido com deboche. A “Nota de Esclarecimento” abaixo, que entendemos ser de responsabilidade de Antônio Alves de Souza, na qualidade de Secretário Especial de Saúde Indígena desde a criação do órgão, em 2010, é mais um exemplo disso.

Conforme pode ser lido em Ninawa Huni Kui no MPF AC: Lutar não é crime! Queremos o Pastor Raimundo Costa fora do DSEI/ARPU, o “grupo de indígenas” ao qual a Nota da Sesai desrespeitosamente se refere é constituído na realidade por lideranças de sete povos – Apurinã, Machineri, Jamamadi, Jaminawa, Huini Kui, Kaxarari e Madhira. Foram seus representantes que na quinta-feira, dia 20, apresentaram suas queixas e denúncias ao Ministério Público Federal no Acre, na frente da responsável pela Funai, sintetizando-as, afinal, de forma bastante objetiva: exigem a saída do Pastor Raimundo Costa da direção do DSEI como passo inicial para que o direito à saúde seja garantido às diversas aldeias e comunidades.

A “Nota de Esclarecimento” foi produzida por Bianca Moura, assessora para o Controle Social da SESAI, e por sua equipe de auditoria, e aparentemente se deslocaram de Brasília ao Acre não só para defender a manutenção do status quo. Não se limitaram a desrespeitar as lideranças indígenas: buscaram igualmente criminalizá-las e desacreditá-las (como já adivinhara Ninawa Huni Kui na postagem mencionada acima) atacando-as do ponto de vista ético, acusando-as de estarem buscando cargos e privilégios, em ações “contrárias aos princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade” (negrito da SESAI). E encerraram, claro, reiterando “seu apoio ao atual coordenador do DSEI Alto Rio Purus” etc etc (também com destaque da SESAI).

A reação de Ninawa Huni Kui à “Nota de Esclarecimento” (abaixo) é direta:

Primeiro, essas pessoas não sabem nem aonde ficam as aldeias, muito menos os problemas que elas passam, prova disso relatado pela própria auditoria da Bianca, que diz que só está em Rio Branco. Segundo, os materiais que foram adquiridos pelo DSEI são projetos realizado pelo Gestor Maurílio na época da FUNASA; digo porque conheço mais que a Bianca o Acre. Terceiro, a equipe auditora da Bianca, demostra o grande respeito com os povos indígenas, chamando-os de Grupos interessados por cargo da SESAI.

 

 Se o Pastor Costa, é bom para o Antonio Alves, para Bianca, que os levem para suas casas, porque para os povos indígenas não serve para nada, pois já colaborou com a morte de muitos índios”.

Nota de esclarecimento da SESAI sobre a ocupação do DSEI Alto Rio Purus (AC)

 Sobre a situação do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Alto Rio Purus (AC), invadido na última quinta-feira (20) por um grupo de indígenas, inclusive causando dano ao patrimônio público como o arrombamento da porta de acesso ao Distrito, e as recentes notícias veiculadas pela imprensa do Acre sobre a gestão da saúde indígena do DSEI, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) e o DSEI Alto Rio Purus, do Ministério da Saúde esclarecem que:

1–  A SESAI sempre esteve aberta ao diálogo com as representações e lideranças indígenas de todo o Brasil [sic], inclusive com aquelas representantes das etnias assistidas pelo DSEI Alto Rio Purus, prezando pelo entendimento [sic], ouvindo as reivindicações apresentadas [sic] e buscando soluções para a melhoria da gestão e do atendimento básico de saúde nas aldeias [sic]. No caso da ocupação da sede do DSEI Alto Rio Purus e de mais três, dos sete Polos Base de Saúde administrados pelo distrito, não foi diferente. Ao receber as queixas apresentadas no relatório de supervisão realizada aos Polos Base pelo Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi), a gestão central da SESAI/DF encaminhou uma equipe multiprofissional a Rio Branco (AC) com o objetivo de apurar possíveis irregularidades e acompanhar in loco o trabalho gerencial desenvolvido pelo DSEI. Esta mesma equipe permaneceu em Rio Branco por sete dias, quando puderam avaliar a gestão de contratos, o orçamento e as  finanças, a organização dos serviços assistenciais, os processos de saneamento básico e de abastecimento de água nas aldeias, além de uma avaliação do trabalho desempenhado pela Casa de Saúde Indígena de Rio Branco. Esta mesma equipe retornou para Brasília com uma avaliação preliminar positiva do trabalho realizado nos últimos três anos pelo DSEI e estará apresentando ao secretário da SESAI, Dr. Antônio Alves de Souza, relatório circunstanciado sobre a situação do DSEI;

2- Vale ressaltar que esta mesma equipe, ao chegar a Rio Branco, fez o convite para que o processo de avaliação da gestão do DSEI fosse acompanhado pelo Condisi (autor das denuncias) [sic] e pelo Ministério Público Federal. A presidência do Condisi, que coordena o movimento, não aceitou acompanhar o trabalho da equipe, muito menos indicar algum representante;

3- Mesmo aberta ao diálogo, e sempre participando constantemente das reuniões dos Conselhos Distrital e Locais de Saúde Indígena, em nenhum momento a coordenação do DSEI Alto Rio Purus foi acionada pelo movimento indígena para tomar conhecimento do relatório de Supervisão aos Polos Base realizada pelo Conselho. Em nenhum momento, a coordenação do DSEI teve a oportunidade de debater com os próprios indígenas sobre cada item ali colocado. Não houve, por parte do movimento, a intensão de ouvir a gestão do DSEI, sobretudo as ações que vêm sendo priorizadas para suprir algumas das dificuldades, como também os próprios avanços constatados na Saúde Indígena nos últimos três anos, após a criação da SESAI;

4- No tocante às reivindicações apresentadas sobre a falta de transporte no distrito, a SESAI esclarece que hoje as dificuldades para encaminhamento de pacientes das aldeias aos municípios de referência e vice-versa já foram superadas. Atualmente, o DSEI Alto Rio Purus conta com o funcionamento de uma frota de 25 veículos, dos quais 20 foram adquiridos pela gestão nos últimos três anos. Portanto, trata-se de uma nova frota. Para este ano de 2014, o DSEI prevê a aquisição de mais 10 veículos, que substituirão os mais antigos ampliando mais ainda a frota. Quanto ao transporte fluvial, o DSEI adquiriu, em 2013, três novos barcos “cabinados”, com capacidade para transportar até 15 pessoas. Além disso, o DSEI alugou mais três barcos, com capacidades de seis a oito toneladas, para o transporte e logística das Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena. Vale ainda ressaltar que já existe no DSEI um processo instruído para aquisição de mais sete barcos de médio porte até o ano de 2015 e outro para aquisição de botes de alumínio e motores de popa. O DSEI conta ainda com prestação de serviços de transporte aéreo, com contratação dehoras voo. O transporte aéreo é necessário para remoção de pacientes em áreas de difícil acesso, sobretudo nos Polos Base de Santa Rosa do Purus (AC) e Pauiní (AM);

5- Em relação à falta de medicamentos no DSEI, a SESAI salienta que é de sua competência garantir apenas medicamentos da atenção básica para os indígenas. Atualmente, a Central de Abastecimento Farmacêutico (CAF) do DSEI Alto Rio Purus dispõe de 148 itens de medicamentos, comprovando que não há, até o momento, desabastecimento no distrito. A Sesai esclarece ainda que, embora os remédios para tratamentos de média e alta complexidades sejam de competência de estados e municípios, o Ministério da Saúde, visando suprir a continuidade do tratamento de indígenas que necessitam de medicamentos fora da atenção básica, assinou, no dia 4/12/2013, durante a 5ª Conferência Nacional de Saúde (5ª CNSI), a portaria Nº 2.974, que dispõe sobre a aquisição, pela SESAI ou DSEI’s, de medicamentos e insumos constantes da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME). Com a regulamentação da nova portaria, a SESAI/DSEI poderá adquirir itens de remédios que estão fora da lista da atenção básica;

6- Quanto às reclamações de falta de água em algumas das aldeias da região, o DSEI Alto Rio Purus reconhece as dificuldades para implementar novos sistemas de abastecimento de água, bem como para revitalizar os já existentes. Embora o distrito tenha elaborado projetos para sanar a falta de água potável nestas aldeias, atualmente, alguns estudos necessários de cálculos geológicos e topográficos vêm sendo realizados em área objetivando coletar dados sobre os lençóis freáticos nas aldeias da abrangência do DSEI Alto Rio Purus. Como medida emergencial, a fim de evitar possíveis surtos de Doenças Diarreicas Agudas (DDA) na região, o DSEI distribuiu nas aldeias kits de tratamento de água alternativos (filtros de barro, balde de decantação e cloro) para atender mais de 500 famílias, sendo 365 delas no Polo Base de Santa Rosa do Purus (AC);

7- Ainda na área de saneamento e Edificações, a SESAI/DSEI deve dar início, neste ano de 2014, à construção de 11 novos postos de saúde em aldeias dos sete Polos Base. Os projetos já foram aprovados e contemplam as aldeias: Maronawa e Nova Fronteira (Santa Rosa do Purus); Três Cachoeiras e Jatobá (Assis Brasil); Maiê e Santo Antônio (Boca do Acre); Mipiri e Nova Vista (Pauini); Buaçu (Manoel Urbano) e Buenos Aires (Sena Madureira). Além da construção de novas unidades de saúde, o DSEI também vem realizando a reforma da Casa de Saúde Indígena de Rio Branco (CASAI). A obra contempla a reforma do espaço construído e a construção de mais três alojamentos e uma área de recreação. Com isso, a Casai, que tem capacidade para atender até 80 pessoas, passará a atender 120 a partir de agosto deste ano, quando está prevista a conclusão da obra;

8- No tocante à qualificação profissional, o DSEI Alto Rio Purus vem investindo, em parceria com o Governo do Estado do Acre, na preparação dos trabalhadores que atuam como Agentes Indígenas de Saúde, promovendo um curso de qualificação que abrange três módulos. Atualmente, dos 104 agentes, 90 estão em fase de conclusão do terceiro módulo, cuja formatura já tem data marcada para o dia 7 de março;

 9- A SESAI torna claro ainda que algumas das solicitações não atendidas à presidência do Condisi do Alto Rio Purus, e que certamente culminaram no movimento, foram avaliadas como contrárias aos princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade, a exemplo da criação do cargo ou função de coordenador de Polo Base para os sete polos administrados pelo DSEI como quer o Presidente do Condisi, Sebastião Manchinery. Outra solicitação não atendida pelo DSEI diz respeito à programação com 63 diárias para o presidente do Condisi, Sabastião Manchineli, visando à realização de reuniões e capacitações de conselheiros de saúde nos Polos Base. O DSEI solicitou ao Conselho o conteúdo programático para referida capacitação e o quantitativo do público alvo para que fossem programadas as despesas com alimentação, hospedagem e transporte das aldeias aos polos base, o que não foi respondido pelo Condisi. Ainda em relação às solicitações não atendidas, o Condisi pleiteava também a disponibilidade de um veículo exclusivo para as demandas do conselho. A SESAI enfatiza que todos os veículos disponíveis no DSEI estão à disposição do distrito em geral e que, quando necessário, cada setor deve encaminhar solicitação ao setor de transportes do DSEI para fazer a solicitação para determinada demanda. Outra solicitação que vai de encontro aos princípios legais da administração pública diz respeito à contratação de profissionais (técnicos de saneamento) sem a habilitação requerida legalmente para investidura no cargo e sem processo seletivo (contratação por via direta), como quer o Condisi; [Nota deste blog: afinal, o nome do Presidente do Condisi é Sebastião Manchinery ou Sabastião Manchineli? Ou a Sesai não sabe?]

10– A SESAI reitera seu apoio ao atual coordenador do DSEI Alto Rio Purus, Raimundo Costa, e ratifica que não está em negociação exonerações ou nomeações de cargos para o DSEI Alto Rio Purus, que é uma prerrogativa da Presidenta da República por indicação do Ministro de Estado da Saúde, conforme previsto na Constituição Federal de 1988. Há três anos como coordenador do DSEI, Raimundo Costa tem conseguido avançar no que diz respeito à consolidação da assistência básica prestada nas 126 aldeias da região, bem como na organização administrativa do distrito para que esta assistência ocorra. Neste aspecto, vale ressaltar a ampliação do número de profissionais que prestam atendimento nas aldeias, com o incremento de 209 trabalhadores em 3 anos, além dos investimentos para melhorar as condições de trabalho das equipes (com a reforma da Casai e aquisição de veículos, barcos e motores de popa e contratação de horas voo), e de atendimento dos indígenas. Além disso, vale destacar que somente no ano de 2013, o referido coordenador participou de 21 reuniões de conselhos locais de saúde e mais quatro reuniões do Conselho Distrital, o que comprova o seu compromisso com o permanente diálogo com as lideranças indígenas e o fortalecimento do controle social na saúde;

11– A Sesai reitera seu total compromisso com a melhoria dos indicadores de saúde da população indígena do estado do Acre e das demais Unidades da Federação, bem como evidencia a lisura e a transparência com que vem gerindo os recursos públicos e combatendo a corrupção na gestão da saúde indígena nos distritos. A SESAI reconhece que tem muito ainda a melhorar, mas que todos os esforços estão centrados em oferecer uma assistência mais digna às comunidades indígenas de todo país. Entretanto, repudia qualquer forma de manifestação que, longe de esclarecer e ajudar a construir a política de saúde indígena, usa de formas truculentas para paralisar serviços, comprometer a assistência de centenas de famílias e exigir, por meio da força, pleitos que não são legítimos.

 Brasília, 21 de fevereiro de 2014.

* Com informações enviadas por Ana Patrícia Ferreira, do  COMIN-Assessoria Acre Sul do Amazonas.

Veja também:

AC – Em Rio Branco, povos indígenas ocupam o DSEI e pedem saída de chefe do Distrito Sanitário de Saúde Indígena

AC – Indígenas sofrem por falta de atendimento médico em Feijó

Doze crianças indígenas morrem no Acre com sintomas de diarreia, desidratação e febre

Em nota indígenas repudiam ação discriminatória e abuso de poder por parte do Chefe do DSEI Alto Purus, Sr. Raimundo Alves Costa (Blog de Lindomar Padilha)

 

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