Problemas para o ouro de Belo Monte

Um dos maiores projetos de extração de ouro do Brasil corre risco de ser inviabilizado por problemas atrelados a licenciamento ambiental. O projeto bilionário da canadense Belo Sun, que pretende extrair ouro nas margens do rio Xingu, bem ao lado da área onde é construída a usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, esbarrou em avaliações negativas feitas por membros do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Coema). A aprovação pelo Coema é decisiva para que o empreendimento consiga sua licença prévia ambiental

André Borges – Valor

O Valor teve acesso a um ofício elaborado pelos promotores de justiça Eliane Moreira e Nilton Gurjão das Chagas, na condição de conselheiros do Coema. No documento que foi encaminhado à Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema), eles afirmam que há uma série de irregularidades graves no processo de licenciamento do projeto.

A Belo Sun, que pertence ao grupo Forbes&Manhattan, um banco de capital fechado que desenvolve projetos de mineração, quer investir US$ 1,1 bilhão na extração e beneficiamento de ouro na região. A produção prevista, segundo o relatório de impacto ambiental da empresa, é de 4.684 quilos de ouro por ano, o que significa um faturamento anual superior a R$ 500 milhões. Uma das polêmicas é que o projeto está localizado a apenas 17 km da barragem de Belo Monte.

Segundo o ofício dos promotores, o projeto ignora a necessidade de estudos do componente indígena e a sinergia que terá com a usina de Belo Monte. Os conselheiros apontam ainda a “incompetência do órgão ambiental estadual para o licenciamento ambiental”, processo que, alega, deveria ser realizado pelo órgão ambiental federal, o Ibama. Finalmente, afirmam que o processo desrespeita a norma de direitos humanos previstos na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), quanto ao direito à consulta prévia de povos indígenas. “Não espanta a pouca atenção da equipe técnica [da Sema] com a questão indígena, sobretudo quando se observa que não há dentre seus técnicos um único antropólogo. Só isto já evidencia os limites do órgão ambiental estadual para a análise do presente projeto”, afirmam os promotores.

Em entrevista ao Valor, a promotora Eliane Moreira disse que pediu vistas do processo para apurar outras irregularidades. O ofício enviado à Sema, disse Eliane, também serve de alerta os servidores públicos da secretaria que elaboraram o parecer técnico favorável ao empreendimento. “Não se trata de ser contra ou a favor de determinado projeto. A questão essencial é que não se pode dar uma licença a um processo irregular. São irregularidades graves e óbvias. Quem aprovar isso, será responsabilizado”, diz Eliane.

A posição dos promotores não reflete a opinião do Coema. Outros membros do conselho votarão sobre o assunto. Ontem, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação judicial em Altamira (PA), pedindo a suspensão imediata do licenciamento. A Fundação Nacional do Índio (Funai), alertou o MPF, emitiu termo de referência em dezembro de 2012 para que a Belo Sun fizesse pesquisas necessárias sobre impactos aos indígenas. “Até agora os estudos não foram apresentados. Para o MPF, os estudos não foram realizados por absoluta negligência da Sema”, informam os procuradores.

Apesar da polêmica, a Sema anunciou a inclusão da licença na pauta da próxima reunião do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Coema), que deve acontecer na próxima semana. O Valor procurou o secretário do meio ambiente do Pará, José Alberto da Silva Colares, para comentar o assunto. Não houve retorno ao pedido de entrevista.

A Belo Sun alega que não há nenhuma irregularidade e que todas as etapas foram cumpridas. Afirma ainda que o uso de explosivos nas margens no Xingu ou mesmo a manipulação de milhares de litros de cianeto não terão impactos sobre a estrutura física da hidrelétrica ou sobre a vida das comunidades indígenas que vivem na região. O projeto prevê a manipulação de 37,8 milhões de toneladas de minério tratado nos 11 primeiros anos de exploração da mina. As previsões são de que essa exploração avance por até 20 anos. Para os promotores membros do Coema, os impactos são inegáveis. “Como imaginar-se que um projeto de mineração que utiliza explosivos não irá provocar impactos em povos indígenas que estão situados a apenas 10,7 km de distância das atividades mencionadas”, menciona o ofício encaminhado à Sema.

Em carta encaminhada à Sema, a Belo Sun alega “ausência de fato novo” para o pedido de vistas dos promotores e lembra que os pareceres técnico e jurídico da secretária foram favoráveis ao licenciamento desde que o processo de licenciamento foi protocolado, 21 meses atrás. Apesar de a Belo Sun garantir que sua mineração não terá impacto sobre as operações da usina de Belo Monte, empreendedores da hidrelétrica, apesar de não falarem oficialmente sobre o assunto, não aprovam a ideia.

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