Do aquário ao cocó

Uribam Xavier* – O Povo Online

Qual a relação que existe entre as manifestações de protestos contra a construção do aquário e a derrubada de árvores do Parque do Cocó para construção de dois viadutos? Será que se trata de manifestações de um pequeno grupo contra o progresso, contra um conjunto de obras que promoverão o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida da cidade? Caro leitor, pense nisso com seus amigos e familiares.

Ao pensar, cheguei à conclusão de que os protestos contra essas ações do governo municipal e estadual representam uma reação de natureza política, econômica e ética.

É uma reação de natureza política porque está focada contra uma administração autocrática que privatiza todas as formas de tomada de decisões, que não dialoga com as organizações sociais. Trata-se do enfrentamento a um governo que pensa que, pelo fato de ter sido eleito nas urnas, fora delegado a ele poderes para resolver os problemas da cidade ou do Estado como bem entender, e sem o controle de outras instituições que compõem os poderes do Estado, como o Ministério Público e mesmo as Secretarias ligadas ao executivo. É uma reação positiva contra a arrogância de um governo que, quando questionado sobre suas contradições e desmandos, responde que vai continuar fazendo o que faz, doa a quem doer.

É uma oposição de natureza econômica porque se posiciona de forma corajosa contra um modelo de desenvolvimento tecnocrático, predatório, atrasado, que não preserva o patrimônio ambiental, que privatiza os espaços públicos, com a construção de equipamentos geradores de lucros com o dinheiro público, mas que, em seguida, os entrega para serem explorados pela iniciativa privada. Trata-se da reação a um modelo de desenvolvimento focado no racismo ambiental, na remoção e precarização das condições de vida dos pobres, ou seja, na higienização territorial para que o capital possa usar o espaço higienizado como ativo que produz a acumulação de riquezas para grupos econômicos que financiam as campanhas políticas dos que chegam e querem se perpetuar no poder.

É uma ação ética porque são protestos e ações de insubmissão que se colocam em defesa da vida, de um modelo de gestão da coisa pública focada nas pessoas. É uma ação que se coloca contra um modelo de desenvolvimento que destrói o que temos de melhor para desenvolver nossa humanidade em troca da promessa de gerar empregos e impostos, ou seja, destruição dos espaços públicos e da natureza conjugada com a exploração da força de trabalho. É uma ação de ordem ética porque se foca no bem viver, numa cidade segura e saudável, numa democracia que se faz com tempo para ouvir as partes e as alternativas. Nesse momento, silenciar é uma forma de cumplicidade.

*Professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Enviada para GT Combate ao Racismo Ambiental por Rodrigo de Medeiros Silva.

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