Aty Guasu, Marçal e o Papa, por Egon Heck

Em 1980, o Guarani Marçal Tupã’y já denunciava ao Papa João Paulo II, a história de massacre contra seu povo. Foto: Paulo Suess
Em 1980, o Guarani Marçal Tupã’y já denunciava ao Papa João Paulo II, a história de massacre contra seu povo. Foto: Paulo Suess

Cimi

“Santidade… Estão matado nosso povo. Fomos uma grande nação, hoje estamos jogados à beira das estradas, das cidades e da memória dessa região e pais. Mas não somente estamos vivos  e resistentes, como decididos a continuar lutando pelos nossos direitos, pelas nossas terras sagradas, que estão sendo destruídas e nossas águas e fontes envenenadas pelo que chamam de progresso, desenvolvimento. Nós queremos e exigimos muito pouco Santidade. Apenas queremos viver com dignidade e paz em cima de nossas terras e territórios. Muitos dos que nos combatem, negam nosso direito à terra e assassinam nossas lideranças, se dizem católicos, seguidores  vosso e do Deus da vida. Diga a eles e a todas as pessoas do mundo que o admiram e seguem que o nosso Deus, Nhanderu, é o mesmo Deus da paz, da verdade, da justiça e da vida”.

E o Papa, emocionado diante daquela esquálida e determinada criatura, externou o compromisso pelos direitos das nações indígenas no Brasil.

Trinta anos se passaram, daquela noite quente em Manaus, quando João Paulo II teve um encontro com os povos indígenas.

Nesta manhã (25) gelada, de geada em Dourados, bem próximo à casa em que Marçal viveu parte de sua vida, na aldeia Jaguapiru, centenas de lideranças Guarani-Kaiowá estão reunidas em mais uma grande assembleia. Como no início da década de 1980 as maiores violações de direitos e atrocidades contra os povos indígenas aconteciam na Amazônia, com a implantação dos grandes projetos, principalmente as grandes estradas da invasão dos territórios indígenas e extermínio de comunidades e povos, hoje um encontro do Papa Francisco com os povos indígenas certamente aconteceria ali onde os índios estão sofrendo as maiores violências, no Mato Grosso do Sul. Ali seria reverenciada a memória de Marçal, que foi assassinado em novembro de 1983, e os inúmeros mártires da luta pela terra e vida do povo Kaiowá Guarani, Terena e demais povos indígenas no Brasil.

Três jovens Guarani estarão próximos ao Papa numa celebração eucarística nesses dias. Quem sabe consigam fazer chegar o grito pela vida, terra e justiça, ao papa Francisco.

Enquanto isso

Aconteceu em Campo Grande mais uma reunião do grupo especial criado para encontrar solução para a gravíssima realidade das terras indígenas no Mato Grosso do Sul. Pouco, ou quase nada se avançou na perspectiva de um início de solução. Ao contrário, chegou a ser ventilada a insana proposta de se arrendar terra para os indígenas no Estado. Absurdo do absurdo. Seria a União arrendar terras que constitucionalmente são suas, por serem tradicionalmente indígenas, para assentá-los.

Na ogasu (casa de reza grande) Nhanderu Getulio coordenou o dia da voz, palavra e reza, dos Nhanderu e Nhandesi Kaiowá Guarani. Hoje a grande assembleia estará discutindo e definindo estratégias com relação à questão das terras.

“Mesmo matando nosso sonho, jamais desistiremos de lutar pela nossa terra” – Conselho da Aty Guasu.

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