IHU On-Line – A paralisação nacional dos trabalhadores marcada para esta quinta-feira deve funcionar como um “termômetro” para avaliar até que ponto o governo estaria disposto a negociar com os sindicatos.
Com um estilo de gestão diferente do de Lula, seu antecessor, a presidente vem sendo alvo frequente de reclamações de lideranças sindicais por não dar ouvidos às reivindicações da classe.
Os trabalhadores vão cruzar os braços munidos de uma pauta comum. Os temas variam desde a reforma agrária ao fim do fator previdenciário, passando pela redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais.
O ato, convocado pelas centrais sindicais e batizado de “Dia Nacional de Lutas”, ocorre na esteira dos protestos que varreram o país no mês passado e levaram à construção de uma “agenda positiva” por parte do governo, preocupado com a reação vinda das ruas.
Ambiente favorável
Embora tenham negado agir por “oportunismo”, lideranças sindicais ouvidas pela BBC Brasil reconheceram que as manifestações criaram um ambiente favorável para a luta por seus pleitos.
Para Vagner Freitas, presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), a maior entidade sindical do Brasil, o protesto, que promete paralisar mais de 50 cidades brasileiras, foi organizado porque o governo “não atende ao pleito da classe trabalhadora”.
“O trabalhador brasileiro melhorou de vida, mas da porta de sua casa para dentro. Da porta da casa dele para fora, continua pagando um preço proibitivo para o transporte coletivo, que é precário, e trabalhando longas jornadas. Queremos que o governo sente conosco e negocie”, afirma.
“De nada adianta ter ganhos salariais acima da inflação, como obtivemos nos últimos anos, se esse dinheiro é sugado pelo aumento do plano de saúde privado que o trabalhador precisa contratar porque não pode contar com a saúde pública”, acrescenta.
Ele, entretanto, evitou fazer críticas diretas à presidente Dilma Rousseff.
“A manifestação não é partidária. Não queremos derrubar a presidente, apenas queremos que esse governo realize as transformações sociais para as quais foi eleito”.
Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), concorda. Segundo ele, o protesto não é “contra Dilma”, mas contra a “forma como o governo vem administrando as reivindicações da classe”.
“O problema é que fazemos reuniões com o governo e nenhuma solução sai desses encontros. Estamos insatisfeitos”, diz.
Patah reconhece que os protestos do mês passado deram força ao movimento.
“Em uma oportunidade importante, o governo cedeu. Por essa razão, não há melhor momento do que esse para reivindicarmos nossa pauta”, diz.
Divergências internas
Embora tenham definido uma pauta única, as centrais sindicais divergem quanto à defesa de outros pontos, como o plebiscito e a reforma política, que terminaram não incluídos na agenda comum.
Freitas, da CUT, que é a favor da reforma política, encampada pelo PT e pelo governo, diz que levará a proposta isoladamente à manifestação.
“A discussão sobre a reforma política é fundamental para garantir eleições mais limpas”, afirma.
Ele critica o presidente da Força Sindical e deputado federal Paulo Pereira, mais conhecido como “Paulinho da Força”, que “defende o Congresso conservador”.
“O Paulinho não tem interesse na reforma política porque teme não conseguir fundar seu partido”, diz.
O secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, rebate a acusação. Segundo ele, a central foi contra “a apropriação do movimento pelo PT”.
“Somos contra um partido querer se aproveitar de uma manifestação legítima dos trabalhadores”, defende.
Cisão?
Na avaliação de cientistas políticos ouvidos pela BBC Brasil, o protesto, por outro lado, não significará um rompimento dos sindicatos com o governo que, segundo eles, fez concessões amplas aos trabalhadores na última década.
Nesse período, de acordo com dados do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), o poder de barganha de entidades sindicais aumentou consideravelmente. Somente a proporção de acordos salariais acima da inflação quintuplicou de 2003 – ano em que o ex-presidente Lula foi eleito até 2012.
O cientista política Milton Lahuerta, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) considera remota a possibilidade de ruptura dos sindicatos com o governo pelo que chamou de “sindicalismo de resultados”.
“Atualmente, os sindicatos usam ao máximo sua capacidade de barganha e atuam no limite da chantagem para viabilizar seus interesses. Não há nenhuma perspectiva ideológica ou política para a construção de uma agenda propositiva”, diz.
“Além disso, os sindicatos só abandonariam a base aliada em dois casos: ou se fossem acolhidos pela oposição, o que é improvável, ou se a situação econômica do país se degradasse a tal ponto que as lideranças tivessem de se opor ao governo para manter sua legitimidade.”
Já o cientista político Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (UnB), acredita que a manifestação foi motivada pelo “oportunismo” da CUT, uma das principais lideranças sindicais por trás do movimento.
“A CUT é visivelmente controlada pelo PT, que perdeu credibilidade junto à sociedade. O protesto nada mais é do que uma reafirmação de importância do sindicato, que teme pela sua própria sobrevivência.”