A obra é resultado da parceria entre a Terra de Direitos e Rede DESC e apresenta quatro casos em que movimentos sociais lutam pelo acesso e controle da terra.
Em diferentes países e contextos, movimentos sociais lutam pelo acesso à terra para viabilizar direitos à moradia, trabalho, cultura, entre outros. É o que mostra a publicação “Terra na luta por justiça social: Direitos Humanos e as Estratégias dos Movimentos Sociais”, resultado da parceria entre a Terra de Direitos e a Rede Internacional para os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Rede DESC).
A obra, disponível em português, espanhol e inglês, conta com uma introdução crítica sobre o tema e apresenta quatro diferentes experiências de luta pelo acesso e controle sobre a terra. Para além de uma abordagem jurídica, a publicação apresenta os direitos os humanos como “ferramenta abrangente capaz, em geral, de organizar e definir uma ampla série de estratégias inovadoras com vistas a efetivar reivindicações populares”. Partindo do pressuposto de que a privatização e a subordinação às “leis do mercado” são grandes obstáculos à garantia de acesso à terra para camponeses, indígenas, trabalhadores urbanos, entre outros, reflete-se sobre o papel que os direitos humanos podem ter na democratização do acesso à terra.
Os casos trabalhados na obra oferecem um panorama sobre as possibilidades concretas de utilização da ferramenta de direitos humanos na luta pela terra. A devastação, poluição e ameaça do território causado pela exploração de petróleo pela gigante Shell são os motivadores da resistência do povo Ogoni, da Nigéria, tema do primeiro caso apresentado. Habitando a região do Delta do Rio Níger há cerca de 500 anos, a população cultiva tradições e crenças fortemente ligadas à terra. Entre outras ações realizadas para defender o território e os costumes, destaca-se a Carta de Direitos do Povo Ogoni, o trabalho com os relatores especiais das Nações Unidas (ONU) e órgãos de monitoramento dos tratados internacionais de direitos humanos.
O segundo caso traz a experiência do movimento queniano Nairobi Peoples Settlement Network – NPSN (Rede Popular de Assentados de Nairóbi). Como resultado do aumento da pobreza nas zonas rurais, muitas famílias migraram para a cidade e passaram a viver em assentamentos informais. Diante da falta de estrutura e de acesso a direitos básicos, o NPSN passou a conscientizar, organizar e mobilizar moradores de assentamentos na cidade para reivindicar propostas específicas de políticas públicas. A luta do movimento contribuiu para a promoção do direito à moradia adequada e à terra urbana no país.
A experiência brasileira relatada parte do trabalho da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais – Plataforma Dhesca, que atua com relatorias nacionais de direitos humanos, por meio da articulação entre 34 movimentos sociais e organizações da sociedade civil. Localizada na região de Santarém, Oeste do Pará, a Terra Indígena Maró já foi palco de inúmeros conflitos motivados pela extração ilegal de madeira, cultivo da soja, prática da pecuária extensiva e mineração. Denúncias apontavam que líderes locais estavam sendo vítimas de represálias e criminalizados por defender o território e o modo de vida tradicional indígena.
Por meio da atuação da Relatoria Nacional do Direito Humano à Terra, ao Território e à Alimentação Adequada da Plataforma Dhesca possível foi mapear os aspectos políticos e econômicos relativos a violações de direitos humanos na Gleba Nova Olinda, que levou à definição do conflito como diretamente relacionado com os modelos de desenvolvimento propostos para a região. As medidas tomadas por grupos locais, pela relatoria, e por autoridades públicas realmente comprometidas com os direitos humanos, representam um amplo esforço para efetivar os direitos das comunidades indígenas.
O último caso apresenta o processo de redação e adoção da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, mostrando o longo caminho traçado pelos movimentos em prol dos direitos dos povos indígenas. Desde a década de 60, organizações de povos indígenas nas Américas começaram a pressionar para que o sistema de direitos humanos das Nações Unidas abordasse especificamente questões referentes aos povos indígenas. A luta resultou na conquista do reconhecimento internacional de seus direitos, inclusive o direito a ter acesso e controle sobre seus territórios tradicionais.
A publicação foi escrita por Thea Gelbspan, da Rede-Dhesc, e Fernando G. V. Prioste, coordenador da Terra de Direitos, com a contribuição de organizações da Nigéria, Quênia, Filipinas, Brasil, Paquistão, África do Sul.