Thais Leitão, Repórter da Agência Brasil
Brasília – Embora esteja prevista na Lei de Execução Penal em vigor no país, a progressão do regime semiaberto para o de prisão domiciliar concedida a Rayfran das Neves Sales, condenado pela execução da missionária norte-americana Dorothy Stang, contribui para o aumento da sensação de impunidade e fragiliza ainda mais a segurança de trabalhadores ruais, de lideranças e de integrantes de movimentos sociais ligados aos direitos humanos no estado do Pará. A avaliação é do advogado da Pastoral da Terra em Marabá, no Pará, José Batista Afonso.
Assassino confesso, Rayfran deixou o Centro de Progressão Penitenciário Brasileiro terça-feira (2), após cumprir oito anos e oito meses de prisão. Ele recebeu o benefício da progressão de regime por determinação do juiz Cláudio Henrique Rendeiro, da 1ª Vara de Execuções Penais, durante mutirão carcerário nas casas penais do estado. Segundo o Tribunal de Justiça do Pará, a progressão de regime foi aplicada porque Rayfran teve bom comportamento, trabalhou e estudou durante o cumprimento da pena.
O advogado da Pastoral da Terra ressalta, no entanto, que esta é uma situação não contribui para a diminuição da violência no campo na região amazônica. “Saber que um assassino confesso passa tão pouco tempo atrás das grades, diante de um crime tão bárbaro, assusta e aumenta a sensação de impunidade. Com isso, quem vive da prática criminosa não se sente amedrontado e aumenta o risco a que pessoas ligadas à luta pela terra estão submetidas.”
Segundo José Afonso, um levantamento feito pela Pastoral mostra que, nas últimas quatro décadas, houve mais de 800 assassinatos de trabalhadores rurais e líderes sindicais que lutavam pela reforma agrária. “O problema é que, em menos de 10% desses casos, os responsáveis pelos crimes, entre mandantes e executores, foram processados, julgados e condenados. A grande maioria não chega a ser condenada e, entre os poucos que são [sentenciados], muitos não são presos, são beneficiados por prisão domiciliar ou fogem.”
Rayfran das Neves Sales foi condenado a 27 anos de prisão e estava detido desde 2005. O advogado Raimundo Cavalcante, que defende Rayfran, disse que, em 2010, ele passou para o regime semiaberto após ter cumprido um sexto da pena. Cavalcante enfatizou que, a partir de agora, embora tenha recebido o direito de cumprir pena fora da prisão, Rayfran terá de observar algumas restrições, como não frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos similares; estar em casa no período noturno, a partir das 22h; conseguir um emprego em um prazo de 60 dias e apresentar-se às autoridades judiciais mensalmente.
“Ele foi solto terça-feira e ficará morando em Belém, na casa da namorada. Ele está arrependido do crime, correu atrás enquanto estava na cadeia, estudou, concluiu o ensino fundamental e trabalhou. Agora vai encarar uma nova etapa”, acrescentou o advogado.
Norte-americana naturalizada brasileira, a missionária Dorothy Stang tinha 73 anos quando foi morta, com seis tiros, em uma estrada rural de Anapu, no Pará, no dia 12 de fevereiro de 2005. De acordo com a denúncia, Dorothy atraiu a inimizade de fazendeiros da região que se diziam proprietários de terras usadas pelo Projeto de Desenvolvimento Sustentável Esperança, do qual ela era apontada como a principal liderança.
A denúncia indicou Rayfran das Neves Sales como executor do crime, com a ajuda de Clodoaldo Carlos Batista. Segundo as investigações, eles agiram a mando dos fazendeiros Amair Feijoli da Cunha, Vitalmiro Bastos de Moura, conhecido como Bida, e Regivaldo Pereira Galvão, e receberam o pagamento de R$ 50 mil.
Em maio deste ano, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) anulou, por 3 votos a 2, o julgamento de Bida, por ter entendido que o defensor público nomeado para atuar no caso não teve tempo suficiente para estudar o processo. Os ministros decidiram mantê-lo preso cautelarmente até a realização de novo julgamento. Bida já foi condenado duas vezes a 30 anos de prisão pelo crime, mas sucessivos recursos anularam a sentença. Agora, o Tribunal do Júri de Belém do Pará terá de realizar novo julgamento.
Edição: Nádia Franco